Os professores ocupam o primeiro lugar na fileira do desemprego qualificado; um em cada seis desempregados com qualificação superior é professor. O clima de recessão, as políticas educativas e os fatores demográficos têm vindo a agravar esta liderança.
As atuais restrições orçamentais têm afetado sobretudo setores onde as poupanças podem ser maiores, como a Educação e a Saúde, reduzindo drasticamente o papel do Estado enquanto garante de direitos sociais de qualidade. Na educação, a redução do pessoal docente, o fecho de escolas e a constituição de mega-agrupamentos têm sido vias expeditas de reduzir custos. Mas vem de há muito tempo a situação de incerteza e de desemprego docente. O excesso de cursos para a docência e respetivos diplomados não é alheio à situação. Apesar de, nos últimos anos, cursos e diplomados conhecerem uma significativa redução, a pressão das recentes políticas vai mais longe e, cada vez mais, a mobilização de recursos educativos vai sendo colocada em níveis abaixo do que seria necessário para uma educação de qualidade. Face aos fatores que têm agravado a condição de empregabilidade de muitos docentes e de candidatos a docentes, parece oportuno desenvolver formas de atenuar essa condição. O facto de lidarmos no seio de novas e muito dinâmicas complexidades sociais torna incontornável a necessidade de recontextualizar a docência num domínio alargado de intervenção social. A preparação para uma carreira profissional específica deve, cada vez mais, incluir flexibilidades dentro do domínio em que ela se situa. Isto implica atitudes adequadas de cada um face à escolha da formação, ao seu desenvolvimento pessoal e profissional e, por parte das instituições formadoras, aos modelos e finalidades da formação. Quando não existem razões económicas ou insuficiência de classificação para aceder à formação desejada, os jovens orientam as suas escolhas formativas, com maior ou menor incidência, pela motivação, pela empregabilidade, pela qualidade das instituições formadoras. No acesso a cursos de formação de educadores de infância e de professores do 1º Ciclo, a motivação na escolha do curso parece sobrepor-se claramente ao critério da empregabilidade. Isso mesmo foi revelado, ao longo de três anos, à entrada naqueles cursos, por mais de 90 por cento de alunos caloiros de uma escola superior pública. A motivação é fator mobilizador de ação, mas é produto de um processo, de um percurso, de vivências. No fim da adolescência, o jovem transporta o produto de experiências feitas em quadros sociais, culturais e temporais limitados. Nessa fase, a motivação irá sendo, em muitos casos, reajustada e modificada por outros anseios e necessidades que se definem através das novas experiências. É importante ajudar os jovens a perceberem as mutabilidades, a escolherem domínios de formação e de intervenção que permitam, em cada momento, o ajustamento dos desempenhos profissionais dentro desses domínios; a substituírem uma representação de desempenho docente reprodutivo e fechado por representações que coloquem a docência numa constelação de interações sociais alargadas que permitam a adaptação e a intervenção em áreas próximas, sem que se percam as referências estruturantes de uma identidade nesse domínio profissional. Esta flexibilidade exige que a formação inicial de professores seja equacionada em novos moldes, ajustando finalidades e processos, evitando que seja demasiado redutora das escolhas dentro do domínio alargado da educação e intervenção social. Aqui, são evidentes sinais que apontam para a necessidade de cursos que, além de garantirem formações aprofundadas em áreas profissionais específicas, assegurem o desenvolvimento de competências aplicáveis a diversas áreas daquele domínio. A intervenção num setor específico exige cada vez mais o conhecimento da realidade alargada em que ocorre. O conhecimento e a reflexão acerca dessa realidade desafia e promove a flexibilidade e a disposição dos futuros diplomados para a formação ao longo da vida e para eventuais intervenções noutros setores. A profissionalização seria realizada em espaços sociais cada vez mais amplos e mutáveis, incluindo a compreensão das relações complexas entre variáveis que definem esses espaços. Esta compreensão constitui, cada vez mais, um elemento essencial de intervenções profissionais específicas e condição para a flexibilidade face às mutabilidades do mundo em que vivemos. Além disso, ajudaria a alargar perspetivas de saídas profissionais, atenuando o problema do emprego docente. A revisão da (no meu ponto de vista) inadequada estrutura de formação inicial de educadores de infância e de professores adotada pós-Bolonha bem pode proporcionar, em tempo (cinco anos) e conteúdos, uma formação dentro do espírito que aqui é defendido.
Carlos Cardoso
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