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Fritjof Capra e a extinção da cultura lições da alfabetização ecológica

Capra é mundialmente conhecido por suas preocupações com a complexidade do meio ambiente e da mente humana, mas sua abordagem anti-reducionista da alfabetização ecológica é profundamente reducionista, já que, ao ignorar a cultura, apregoa sua extinção.

O físico Fritjof Capra esteve recentemente no II Fórum Social Mundial em Porto Alegre. Nesta ocasião, defendeu a idéia de uma alfabetização ecológica. Segundo o autor, cujas idéias são amplamente difundidas no Brasil e no mundo, a situação da crise ambiental é tão grave que fez com que ele deixasse de lado suas preocupações com a física quântica para trabalhar no que denomina de ?alfabetização ecológica?. Em seu livro A Teia da Vida, Capra descreve a alfabetização ecológica através de seis princípios: Interdependência, Ciclagem, Parceria, Cooperação, Flexibilidade e Diversidade. Para Capra (1996), a sabedoria da natureza é a essência da eco-alfabetização. ?Reconectar-se com a teia da vida significa construir, nutrir e educar comunidades sustentáveis, nas quais podemos satisfazer nossas aspirações e nossas necessidades sem diminuir as chances das gerações futuras.?(p.231)
Até aqui, a proposta de Capra parece não ter muitos problemas, pelo contrário, é bastante instigante e até bonita. Mas vejamos o que ocorre quando entramos no campo da ética. Em primeiro lugar, Capra esquece que, como nos diz Foucault, o mundo adquire sentido pela linguagem, pela nomeação, e a alfabetização ecológica é apenas uma dentre inúmeras formas de classificação e nomeação possíveis. Mas este ainda não é o maior problema, afinal, toda ciência implica em uma certa redução. O que é ampla e indiscutivelmente criticável é que Capra reduz toda diversidade, incluindo a diversidade cultural, aos seis princípios da alfabetização ecológica e alega ser esse o modo ?correto? através do qual poderíamos conceber a natureza e a nós mesmos.
O maior problema está na ética da alfabetização ecológica. Para Capra (2002), somos moradores da casa terra e devemos nos comportar como se comportam os outros moradores dessa casa ? as plantas, os animais, e os microorganismos que constituem a vasta rede de relações que chamamos ?teia da vida?. Dito de outro modo, nós devemos, observar como se comporta o mundo natural, para daí extrair princípios morais para os comportamentos humanos. Esse naturalismo ético nos leva à extinção da cultura. Por essa razão, decidi começar este comentário com uma provocação, dizendo que uma das lições da alfabetização ecológica é a da extinção da cultura. Capra quer reduzir a política, a ética, a estética, enfim, a cultura, aos princípios de sua alfabetização ecológica. Capra é mundialmente conhecido por suas preocupações com a complexidade do meio ambiente e da mente humana, mas sua abordagem anti-reducionista da alfabetização ecológica é profundamente reducionista, já que, ao ignorar a cultura, apregoa sua extinção. Uma das lições que podemos tirar disto é que precisamos estar permanentemente vigilantes em relação a discursos que tratam de soluções abrangentes e universais. Todos eles estão contaminados por uma superioridade que impede a consideração da contingência, da pluralidade, daquilo que, como nos ensinou Nietszche, é ?demasiadamente humano?.

BIBLIOGRAFIA
CAPRA, Fritjof. A Teia da Vida. São Paulo: Cultrix, 2000.
_____. As Conexões Ocultas. São Paulo: Cultrix, 2002.
GRÜN, Mauro. As Teias da Aprendizagem: as relações entre natureza e cultura na Educação Ambiental. In: Resumos da Reunião Regional da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência) realizada em Canoas, 23 a 26 de maio de 2004.

  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 138
Ano 13, Outubro 2004

Autoria:

Mauro Grün
Professor do Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Luterana do Brasil e da Universidade de Caxias do Sul.Pesquisador da área de Educação Ambiental.
Mauro Grün
Professor do Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Luterana do Brasil e da Universidade de Caxias do Sul.Pesquisador da área de Educação Ambiental.

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