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Estamos Nós Condenados à Inovação

«Quer queiramos quer não, não podemos evitar de a ouvir, de a ler, de a pronunciar. A palavra inovação está por todo o lado, em todos os lábios, em todos os planos de desenvolvimento, estratégias, objectivos ou práticas de intervenção.

Este conceito encontra-se no coração de diversos planos de acção, nomeadamente os relativos à ciência e à tecnologia, à politica, às universidades ou às auto-estradas da informação. Trata-se duma moda ? Duma necessidade ?»

BOUCHARD, Camile (1997). L'innovation sociale existe-t-elle ?, Interface, vol. 18, nº 6. p. 41.

Ao ler estas ideias de Camile Bouchard senti a necessidade de consultar o dicionário para verificar a definição exacta da palavra inovação, na medida em que me parece que o termo é utilizado por tudo e por nada. Inovar, significa portanto, mudar ou alterar as coisas, inventar, encontrar. Quanto aos antónimos da mesma palavra inovação, eles têm também um forte significado: arcaismo, rotina, tradição. Assim, inovar, é romper com a tradição, a rotina, a maneira usual de fazer as coisas, de pensar, de se comportar. Para inovar, é necessário libertar-se de esquemas habituais, de crenças adquiridas, de ideias feitas e imaginar novas soluções que possam corresponder com vantagem ao contexto, e ao envolvimento actual e futuro. Neste sentido, podemos falar tanto de inovações tecnológicas como de inovações sociais; de facto umas articulam-se frequentemente nas outras.

Apesar da nossa maravilhosa capacidade para inovar e para nos adaptarmos aos envolvimentos, torna-se necessário constatar que nós, indivíduos, e nós sociedades temos uma forte propensão para resistir a toda a mudança. Adaptar-se a uma mudança representa, para a maior parte das pessoas, um processo penoso, veja-se doloroso. Visto que mudar, é aprender novos reflexos, adquirir novas maneiras de ver, de pensar, é habituar-se a sentir-se confortável e bem num novo envolvimento. E este comportamento individual transpõe-se para a escala das nossas organizações: por exemplo para o governo, para os sindicatos ou para as nossas universidades.

O Politécnico face à mudança

Ao reflectir sobre inovação como sinónimo de mudar ou alteração das coisas não posso deixar de falar, mesmo que sumariamente, do papel e dos deveres do Politécnico português neste contexto, tais como os percebo. O Politécnico em Portugal, especialmente quanto à sua estrutura de gestão, não aparece, à primeira vista, pronto para "embarcar" numa dinâmica de profundas mudanças. Independentemente de se apresentar com estruturas novas e alternativas às da Universidade, não deixam as mesmas de ser já também, extremamente pesadas e centralizadoras. As suas organizações, baseadas em fortes estruturas de gestão, raramente preenchidas pelos recursos existentes, parecem mais aptas a preservar os recentes direitos adquiridos de alguns do que a suscitar as necessárias e importantes mudanças de funcionamento.

Ora, numa pequena comunidade como esta, parece-me evidente que os recursos humanos devem representar um papel de primeiro plano para que se empreendam os processos de inovação. Trata-se, por exemplo, de dar mais autonomia e responsabilidade aos departamentos, favorecer e recompensar os que investigam e que com o seu trabalho estabelecem laços frutuosos entre a instituição e os meios social, empresarial ou industrial, mas também no que diz respeito à formação dos estudantes, a implementação de currículos cujas fórmulas facilitem as referidas ligações.

O Politécnico deve encaminhar-se para estruturas que favoreçam a flexibilidade, i.e. não deve sair perdedor desta época de transição na qual nos encontramos. Torna-se para isso decididamente necessário o seu empenho numa dinâmica de mudança, de experimentação e de inovação tanto nos planos da gestão, do social e do tecnológico, de forma a encontrar o seu lugar no mercado interno, e como é sua pretensão, se reinvindicar paulatinamente como um verdadeiro sistema alternativo ao universitário.

Esta acção pede urgentemente uma forte clarificação junto dos políticos, nomeadamente, sobre os graus académicos (mestrado, doutoramento) a atribuir neste sistema de ensino, bem como o colocar em causa da continuidade das crenças colectivas existentes e mesmo o questionamento acerca do funcionamento de algumas das suas instituições. Se houver esta coragem, creio, que o Politécnico terá os trunfos necessários para ganhar o desafio.

António Mendes Lopes
Instituto Politécnico de Setúbal


  
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Edição:

N.º 91
Ano 9, Maio 2000

Autoria:

António Mendes Lopes
Instituto Politécnico de Setúbal
António Mendes Lopes
Instituto Politécnico de Setúbal

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