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Uma puta escola!

?As professoras são umas puta elas dá pra todo mundo?.
Na maioria das escolas do Brasil, seria apenas mais uma frase rabiscada no banheiro. Mas não naquela. A educação, como diz a lei brasileira, tem a finalidade de preparar o estudante para a cidadania. Pensando nisso, Cláudia, a diretora, sabia que algo deveria ser feito.
Então, resolveu usar a regra número 1 das escolas: transformar um problema em oportunidade educativa. Assim, levou o assunto ao conselho de escola: um grupo de professores, funcionários, pais e estudantes que decidem o andamento das coisas. E o que poderiam fazer?
A pista também estava na lei: a gestão democrática! O conselho resolveu levar o assunto para uma assembléia escolar. As assembléias são um mecanismo importante para os estudantes resolverem questões de seu dia-a-dia. Nelas, eles aprendem a resolver conflitos de forma pacífica, a negociar, enfim, soluções que deixem todos satisfeitos. Além disso, também ajudam a aprender outro aspecto exigido pela lei da educação: o respeito à liberdade e o apreço à tolerância.
No dia da assembléia, alvoroçados, os estudantes davam idéias, ouviam os colegas, pensavam soluções! Era trabalhoso. Estavam interessadíssimos, mas as idéias iam e vinham, sem avançar muito. Uma assembléia tem que ser objetiva, para não esgotar as pessoas e, assim, atingir seu propósito. Ali, essa tarefa cabia aos adultos: evitavam opinar sobre a solução, mas cuidavam do tempo de cada um, verificavam se o aluno responsável estava anotando as sugestões, enfim, cuidavam para que o processo desse certo. Também era preciso conferir se a decisão não seria desumana. Não foi.
Estudantes experientes em assembléias, em geral, são mais resolutivos, têm maior facilidade para trabalhar em equipe e propõem soluções mais realistas. Também aprendem a educar melhor suas emoções e a suportar melhor as pressões. E foi assim que resolveram que a autora da frase deveria entregar-se a um adulto. Não era preciso que eles, estudantes, soubessem quem era. Também decidiram que, como punição, ela deveria apagar a frase durante seu horário de recreio. A diretora, solidária, se dispôs a ajudar.
A aluna confessou. No dia da faxina, entre uma esfregada e outra, Cláudia perguntou a ela o motivo. A menina parou, num demorado instante. Com olhos baixos, disse: não sei. O silêncio voltou a acompanhá-las. Cláudia tinha hipóteses: talvez tivesse raiva por não conseguir acompanhar as aulas, talvez quisesse ver como era ser uma adolescente rebelde, eram muitas as possibilidades. Mas isso não era o fundamental. Como educadora, Cláudia sabia que não podia julgar o que os alunos são, mas o que fazem. Era nisso que pensava, quando a menina, começando a chorar, disse: sabe, eu tô doente. Cláudia sabia. Para também não chorar, respirou fundo. De fato, a menina estivera doente: 2 dias antes de se delatar, até saíra mais cedo da escola, levada, com dores, pela mãe. Minha barriga dói, disse em lágrimas. Cláudia, então, trouxe o rosto da menina junto ao seu e disse: sabe, eu acho que, a partir de hoje, sua dor vai passar! E passou.


  
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Edição:

N.º 142
Ano 14, Fevereiro 2005

Autoria:

Adriano Gosuen

Adriano Gosuen

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