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A escola e a diversidade cultural

Respeito pelas Culturas ou Cultura de Respeito?

O debate em torno do paradigma do multiculturalismo que se baseia nos dois termos: cultura e igualdade, tem conhecido muitas inflexões. E se nalgumas sociedades existe um compromisso com a igualdade cultural mas não com a igualdade individual, noutras, lidar com a diversidade cultural é menos confortável.

Apesar do grande apelo que o paradigma do multicutluralismo tem tido, poucas terão sido as promessas cumpridas da educação multicultural, nomeadamente a promessa de que a educação multicultural, com a representação da diversidade cultural no currículo e na prática diária, poderia ser o melhor recurso educacional para lidar com o tema do sucesso escolar das minorias e que poderia também promover uma maior harmonia e interacção cultural, tanto nas escolas como na sociedade em geral.
De facto, desde o início, a educação multicultural e o multiculturalismo prometeram bastante para responder às questão «podemos viver juntos?» ou «como é que nós podemos viver juntos?» «Could we live together»? é, de resto, uma questão típica por detrás de muito que tem sido dito e escrito sobre multiculturalismo. Mas a questão colocada nestes termos pode dar a entender que os outros não cabem numa definição do nós sendo, portanto, um problema. Usar uma definição essencialista e estática do grupo, coloca a ênfase na diferença e a criação da otherness. Para ultrapassar a rigidez por detrás dessa definição, tem sido sugerido o conceito alternativo de interculturalismo que, segundo os seus defensores, colocaria a ênfase na dinâmica que existe entre grupos  ao contrário do multiculturalismo que, ao tratar todos os grupos como iguais, isolaria cada um desses grupos numa definição estática da sua própria identidade, deixando de lado o diálogo e a reciprocidade.
De qualquer maneira, quer se use um ou outro termo, o que tem sido central no debate dos últimos anos tem sido, por um lado, a centralidade da cultura e, por outro, o reconhecimento de igualdade como a estabeleceu Brian Barry, num livro intitulado «Culture and Equality» que tem suscitado grandes reacções. Um dos aspectos que se tem discutido é o papel do grupo como bases dos direitos individuais. Por exemplo, ao nível da educação no Reino Unido, algumas normas isentam os pais de alguns grupos de mandar os seus filhos à escola pelo mesmo período das outras crianças e pode argumentar-se que conceder reconhecimento ao grupo pode negar o igual tratamento dos indivíduos.
O debate em torno do paradigma do multiculturalismo que se baseia nos dois termos: cultura e igualdade, tem conhecido muitas inflexões. E se nalgumas sociedades existe um compromisso com a igualdade cultural mas não com a igualdade individual, noutras, lidar com a diversidade cultural é menos confortável.
Em Portugal, a constante promoção da ideologia luso-tropicalista tem reconstruído a nação em bases universalistas e não-racista, pelo que os portugueses têm, de si próprios, uma imagem de excepção, e a escola tem sido um recurso fortemente usado para transmitir as ideias dominantes em torno da portugalidade, nomeadamente esta de uma cultura humanista, universalista e não-racista.
Apesar disso, como diz Américo Peres, a educação multi-intercultural é uma necessidade e uma exigência da sociedade actual. Mas, se a educação multicultural quiser ser eficaz, não pode ser apenas uma série de proposições politicamente correctas em torno da noção de escola inclusiva. Tem que ir além de fornecer a maioria étnica com informação acerca dos estilos de vida e das realizações das minorias étnicas. No entanto, também não pode cair na armadilha de promover o contrário da harmonia social, salientando o quão diferentes e estranhos «eles», os «outros» são, como acontece quando se criam guetos escolares, ou sublinhando algumas práticas que muitas pessoas podem não aceitar, como a matança de animais ou outras práticas defendidas em nome da cultura como a circuncisão feminina.
Tudo isto ilustra de facto as dificuldades em conciliar cultura e igualdade na sociedade e na escola. Talvez que, como Steve Fenton propõe, o que precisamos é, não de desenvolver novas filosofias, mas a aplicação de velhos princípios: é necessário o respeito pela cultura mas também, e sobretudo, a promoção de uma cultura de respeito.


  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 142
Ano 14, Fevereiro 2005

Autoria:

José Carlos Almeida
Instituto Piaget, ISEIT - Mirandela
José Carlos Almeida
Instituto Piaget, ISEIT - Mirandela

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