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Ética Profissional Docente ? em busca de um novo paradigma de referência (2)

O MOMENTO DEONTOLÓGICO DEVE SER VIVIDO COMO UM ESPAÇO PROFISSIONAL, MAIS UM, DE REFLEXÃO, DE NEGOCIAÇÃO E DE DELIBERAÇÃO COLEGIAL.

Pensada no quadro de um paradigma contemporâneo, superador da lógica dicotomizante que tradicionalmente divide as perspectivas teleológicas das perspectivas deontológicas, a ética profissional surge-nos como uma ética hermenêutica, profundamente enraizada no tumulto da vida e reflexivamente atenta aos problemas, dilemas, perplexidades, aflições e alegrias das pessoas concretas, seres de carne e osso, em busca quotidiana do seu bem-estar e da sua razão de ser. Filiando as nossas posições neste horizonte conceptual, fazemos depender as competências éticas dos educadores de uma sabedoria prática afirmada, também, na decisão sobre os princípios, regras e modelos de actuação. Afirmada, portanto, como deontologia.
Todavia, inevitavelmente subordinado à ética, conforme insistimos em lembrar, o momento deontológico deve ser vivido como um espaço profissional, mais um, de reflexão, de negociação e de deliberação colegial. Ou seja, para que possa ser autêntico, para que faça sentido, este processo não pode ser desligado de um quotidiano protagonizado por pessoas singulares, em lugares e tempos historicamente determinados. Trata-se, afinal, de procurar desenvolver um campo axiológico específico que, como tal, possa funcionar como factor de coesão, de identidade e de dignificação pública. Autonomia, solidariedade, respeito pelo outro, recusa da violência e outros valores usualmente reclamados, não são exclusivos da actividade docente. Se queremos, de facto, afirmar um universo normativo próprio, alargando assim as margens que configuram o território de uma autoridade profissional, é necessário tentar ir mais longe e mais fundo. Alicerçados numa consciência pessoal eticamente investida, os princípios de carácter deontológico condicionam os modos de viver a relação com os educandos, com os pares, com a instituição e com a comunidade em geral. Grande parte das situações geradoras de angústia e de ambivalência moral surgem, justamente, da tentativa de compatibilização entre as diferentes dimensões da esfera relacional docente, obrigando-nos muitas vezes a tomar decisões na linha de fronteira entre o ético, o pedagógico, o legal e o técnico. É aqui que os referenciais éticos podem desempenhar um papel importante enquanto eixos de orientação, nunca de certeza ou segurança absoluta. Na verdade, desenhada à medida do humano, que o mesmo é dizer do imprevisível e do incomensurável, essa linha de demarcação não chega a ser totalmente definida e estabilizada, remetendo, sempre, para a perseverança de um esforço reflexivo, partilhado e paciente.
Por esse motivo, confundir deontologia com a cristalização de regras abstractas, burocraticamente decididas no exterior da profissão, sem qualquer ligação com os tempos e os lugares onde se vivem, se sentem e se pensam os problemas, significa enveredar pela via da facilidade e da irresponsabilização. Porque tem que ser levado muito a sério, o momento deontológico não pode dissociar-se da realidade contextual que o justifica. Esta é uma das razões que nos leva a recusar confundir a discussão sobre a deontologia profissional com o problema da representatividade da classe. Quando embandeirada como simples instrumento de controlo, a questão deontológica surge-nos mistificada e empobrecida, demagogicamente colocada ao serviço de estratégias de poder privadas de uma legitimação real e sem qualquer respeito pela memória da profissão. Ora, sem memória não existe identidade, individual ou colectiva. Valerá então a pena reflectir sobre a memória social dos professores, procurando, também aí, indagar sobre os porquês de uma identidade profissional.


  
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Edição:

N.º 129
Ano 12, Dezembro 2003

Autoria:

Isabel Baptista
Universidade Católica, Porto
Isabel Baptista
Universidade Católica, Porto

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