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A distância “dificulta a relação privilegiada” entre educadores e crianças

A pandemia afetou a Educação, levando-a a reinventar-se para fazer frente a estes tempos complicados. O Ensino à Distância foi a solução encontrada para que os alunos continuassem a ter aulas e as novidades foram muitas. A Página da Educação quis saber junto dos professores como foi a experiência de lecionar em casa, recorrendo aos meios digitais, os benefícios que se podem retirar deste método de ensino e as suas expetativas para o próximo ano letivo.

Esta semana, falamos com Ana Melo, educadora do Pré-escolar.

 

Como está a decorrer o ensino à distância neste terceiro período? Que balanço faz da experiência até ao momento?

Este ensino à distância representou para todos uma adaptação que, no nosso caso (Educação Pré-Escolar), não foi fácil, porque não se aplica. Retirar o Pré-Escolar da escola é anular toda a sua especificidade. O contexto educativo que engloba a exploração de materiais, as interações entre crianças e a participação em grupo, são o motor do desenvolvimento e aprendizagem das crianças. Não concordo em transferir estas situações de aprendizagem para momentos online diários com as crianças, atendendo a uma vontade de pais e direções de agrupamentos em se manterem atividades letivas (aulas) à semelhança dos outros níveis de ensino. Estes momentos foram importantes e necessários para ajudar a criança a perceber que a escola, que é uma parte importante do seu mundo, não desapareceu. Ou seja, para dar segurança e estabilidade, para manter uma rotina, para conversar sobre preocupações ou novidades, para mostrar as tarefas que fez e receber aquele incentivo a que estão habituados. Por isso, acho que este momento devia ter servido para os educadores, adaptarem as suas estratégias e gerirem o seu tempo em busca da melhor resposta e acompanhamento, de acordo com o conhecimento que possuem das crianças e das famílias. No meu caso, fiz videochamadas diariamente e, apesar de não as considerar tempo perdido, acho que foi desadequado e sinto que acompanhei mais algumas crianças do grupo e menos as que mais precisavam. A utilização duma plataforma para partilhar propostas de atividades com as famílias, troca de informações e contactos informais resultou muito bem e permitiu concentrar todo o trabalho realizado pela equipa pedagógica.

Quais as principais dificuldades e potencialidades desta modalidade de ensino?

Temos que pensar naquilo que é importante e adequado para as crianças, mas também pensar nas famílias e na possível capacidade de resposta ao que nós estamos a propor. Pedir diariamente aos pais que se organizem para acompanharem as videochamadas dos mais novos em simultâneo com o acompanhamento de aulas de irmãos mais velhos e o seu trabalho, parece-me excessivo para a maior parte. Provavelmente a família, como não consegue acompanhar, desiste e a criança deixa de participar nestes momentos. Sabemos que esta dificuldade tem uma relação direta com outras dificuldades das famílias e provavelmente os seus filhos são os que mais precisam deste apoio do educador. Temos que manter a preocupação de chegar a todas as crianças e, por isso, ajustar o serviço que prestamos, neste contexto à distância, às famílias que servimos.

Considera que o ensino à distância foi a melhor solução face à emergência sanitária? Pode ou deve ser continuada ou retomada noutras circunstâncias?

Parece-me que foi uma decisão acertada nesse momento e que, em alguns níveis de ensino, poderá ser uma boa solução para diminuir a ocupação das escolas.

A distância permite manter uma relação privilegiada com os alunos ou levanta muitas dificuldades?

Nestas idades, a distância só dificulta a relação privilegiada que os educadores têm com as crianças. É uma relação de proximidade, de toque, de gestos e expressões que fazem parte da comunicação que se perdeu neste contexto à distância. Pedimos a crianças dos 3 aos 6 anos que se relacionem com o educador através dum ecrã do computador ou tablet e que participem num diálogo de grupo em que não veem os colegas todos. A relação fica empobrecida, torna-se muito difícil ou quase impossível atender às necessidades individuais das crianças e o sentido de grupo que dá sentido às aprendizagens perde-se.

Que benefícios retira desta experiência que, futuramente, possa aplicar nas aulas presenciais?

Descobri uma imensidão de recursos online para esta faixa etária muito adequados e educativos que vou continuar a usar. Simultaneamente, deparei-me com muitos desadequados, especialmente ao nível da linguagem, o que me levou a refletir sobre a importância da escola em informar e ajudar os pais, na seleção dos recursos que disponibilizam aos filhos.

Se foi o seu caso, como correu a retoma das aulas presenciais?

O regresso à escola decorreu de forma organizada, com todas as medidas de segurança implementadas. As crianças aderiram positivamente às novas regras e, apesar de vivenciarem uma escola diferente, têm-se mostrado felizes. Senti que, apesar de encontrarem uma escola diferente, com interações limitadas, foi importante para elas este regresso à normalidade e o reencontro com os amigos.

Que expectativas tem para o início do próximo ano letivo?

Acho que se vai manter o ensino presencial, mas espero que sejam acauteladas as medidas necessárias à proteção de todos, nomeadamente em relação ao número de crianças por grupo e aos espaços.

Maria João Leite


  
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