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Sistema unitário não será armadilha para a uniformização

A 2 de julho de 2016, Maria de Lurdes Rodrigues, professora do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE), publicou um artigo no semanário Expresso a criticar a tendência para a uniformização do Ensino Superior. Valeria a pena que a professora doutora Maria de Lurdes, ex-ministra da Educação, pensasse na razão que levou a instituição onde trabalha, apesar de ter estatuto universitário desde a sua origem, a bater-se, ano após ano, pelo nome de universidade.
Na presidência do professor João Ferreira de Almeida, a proposta chegou a estar na secretária de Jorge Sampaio, na altura Presidente da República. Havia nome e tudo para mais uma universidade em Lisboa. Por pouco, o processo não foi homologado. Foi só após a entrada em vigor do Regime Jurídico das Instituições do Ensino Superior e a sua passagem ao regime fundacional que o ISCTE pode acrescentar ao seu nome a extensão Instituto Universitário de Lisboa. Assim, o ISCTE-IUL passou a ter assento no Conselho de Reitores (CRUP) coisa que anteriormente não acontecia.
Uniformização? Não! De forma nenhuma. De resto, o ISCTE é o único instituto universitário português no regime público, uma vez que no privado há uns quantos.
Há alguma instituição igual ao ISCTE? Não! É a sua missão e a sua cultura institucional que vai desenhando a sua identidade e a sua especificidade e diferença relativamente às outras universidades. Nenhuma universidade é igual a outra, como nenhuma escola secundária é igual a outra, seja pública ou privada. A diferença é construída, desde logo, pela história da instituição, missão e projeto científico e pedagógico. São os conteúdos que deverão fazer a diferença e não os nomes.
Portanto, a doutora Lurdes Rodrigues está equivocada quanto à sua “armadilha da uniformização”. Do que não devemos ter mesmo medo é da semelhança pois todas as instituições se adequam à sua envolvente e trabalham diferenciadamente nas redes em que estão implicadas. As instituições, tal como as pessoas, não se permitem ser iguais a ninguém.

Igual dignidade. A ex-ministra da Educação está equivocada, também, ao dizer que o Estado Novo apostou na uniformização. Não! Apostou na diferenciação, mas segregadora, tanto no Ensino Secundário, com a distinção perversa de quem ia para as escolas comerciais e de quem ia para as escolas industriais, como no Ensino Superior. Com a criação do Ensino Politécnico, que pela mão do professor doutor Veiga Simão foi chegando a todos os distritos do país, emergiu uma primeira mais valia para as regiões mais afastadas das grandes cidades. Mas esta criação estava alimentada, também, por uma diferenciação segregadora e nada comunicante: avenidas paralelas de escassa liberdade para quem ia para os cursos do ensino politécnico e para quem ia para as universidades...
Depois há a dinâmica e a cultura viva das instituições: os politécnicos de hoje nada têm a ver com os que foram idealizados e criados por Veiga Simão. E não podemos rejeitar a história nem andar para trás. A Inglaterra criou um sistema unitário no Ensino Superior, acabou com os politécnicos, que até podiam conceder doutoramentos, e não terá um sistema de ensino pior do que Portugal... Ou tem?
Maria de Lurdes defende que é negativo apostar na homogeneização do Ensino Superior. Eu cá, também! Mas quem defende a homogeneização? Ninguém, creio.
É uma questão identitária universal, essa de buscar a afirmação e distinção face às instituições congéneres. Parece-me que o texto de Maria de Lurdes defende uma ideia estrutural e diferenciadora assente na segregação das instituições à partida e não na dinâmica das mesmas e suas transformações.
Quando escreve criticamente a propósito de politécnicos a imitar universidades e universidades a imitar politécnicos cai num dualismo cartesiano e déjà vu. É que um pau não tem só os dois bicos; há mais realidade entre os extremos de um pau e entre essas duas categorias exageradamente extremadas: universidade e politécnico.
O Ensino Superior deve ter igual dignidade em todo o país. O certificado de todos os cursos deverá ser sempre passado por uma universidade. Obviamente, como defendemos há década e meia, isto não obsta a que dentro da universidade haja cursos mais curtos (cursos técnicos superiores profissionais, CTeSP) e cursos mais longos, mais teóricos ou mais práticos ou teórico-práticos, como os doutoramentos.

Ricardo Vieira


  
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