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Por uma pedagogia descolonizadora

Quando a Escola for espaço de controle, vigilância e domesticação, lutaremos com desobediência, resistência e reelaboração. Ao se apropriarem deste paradigma, todos que trabalham na Escola poderão nortear o seu fazer para uma ação descolonizadora, potencializando os educandos e se potencializando em conjunto.

Ao pensar a partir de Paulo Freire, que nos fala que “a educação deve ter como objetivo maior desvelar as relações opressivas vividas pelos homens, transformando-os para que eles transformem o mundo”, defenderemos que a opção política-epistemológica por trabalhar com o paradigma pós-colonial em sala de aula é dar continuidade à luta por uma educação que liberte, humanize e que os homens e mulheres sejam vistos e tratados como sujeitos.
Ao pensarmos a partir deste lugar, nossa ação pedagógica também muda. Por exemplo, o projeto político pedagógico da Escola pode ser pensado e construído coletivamente a partir deste referencial. Poderíamos nos valer de Eduardo Galeano ao pensar a educação que pretendemos quando ele denuncia que “até o mapa mente”: “Aprendemos a geografia do mundo em um mapa que não mostra o mundo tal como ele é, se não tal como seus donos mandam que seja. No planisfério tradicional, o que se usa nas escolas e em todas as partes, o Equador não está no centro, o norte ocupa dois terços e o sul, um. A América Latina abarca no mapa mundi menos espaço que a Europa e muito menos que a soma dos Estados Unidos e Canadá, quando na realidade a América Latina é duas vezes mais que a Europa e bastante maior que Estados Unidos e Canadá.
O mapa, que nos apequena, simboliza todos os demais. Geografia roubada, economia saqueada, história falsificada, usurpação cotidiana da realidade, o chamado Terceiro Mundo, habitado por gente de terceira, abarca menos, como menos, recorda menos, vive menos, diz menos.”
A partir de Galeano podemos refletir sobre o que temos ensinado aos nossos alunos e contribuído para esta usurpação. Ele nos provoca a subverter a ordem, descolonizar-se, desvelar a ideologia subjacente nesta forma de reproduzir e propagar conhecimento. Temos a obrigação de instigar o nosso aluno a pensar, desnaturalizar o que está posto, criar condições para se tornar crítico. Tais objetivos poderiam fazer parte do projeto político pedagógico da Escola, juntamente com ações que valorizem a diversidade, os conhecimentos trazidos pelos alunos. Devemos abdicar de uma metodologia que transmite conhecimentos aos alunos de forma passiva, amparada na secular idéia de John Locke de que o aluno é uma tábula rasa, portanto, cabe ao professor preencher o vazio.
Contrária a esta ideia podemos investir em uma prática que valorize o aluno, respeite os diferentes ritmos de aprendizagem, seja dialógica, crítica e conscientizadora, criando espaços para que os alunos se vão formando desde cedo cidadãos, que possam se apropriar dos conhecimentos acumulados pela humanidade, reelaborando-os, ressignificando-os, de forma que sejam usados a favor da comunidade, beneficiando a todos, opondo-se ao comportamento individualista e mercantil que as relações humanas têm reproduzido.
“Se educar é impregnar de sentido o que fazemos a cada instante” (Freire), que aprendizagens podem ser mais significativas do que aquelas que nos dão respostas aos desafios ou curiosidades cotidianas diárias que nos rodeiam? Por que estes conteúdos também não podem fazer parte do projeto político pedagógico da Escola?
Quando entendemos que a seleção de conteúdos também faz parte da luta ideológica e de poder, não abdicaremos do nosso direito de também lutar por incluir ou retirar os conteúdos do currículo que julgarmos necessários a favor dos alunos. Por isso, não devemos aceitar pacotes pedagógicos prontos com soluções pedagógicas milagrosas.
Desconfiemos das grandes promessas, das certezas e verdades absolutas. Quando a Escola for um espaço de controle, vigilância e domesticação, lutaremos com desobediência, resistência e reelaboração. Ao se apropriarem deste paradigma, pedagogos, diretores, professores, zeladores, secretárias, auxiliares de serviços gerais, inspetores, enfim, todos e todas que trabalham na Escola assumindo o papel de educadores poderão nortear o seu fazer para uma ação descolonizadora, potencializando os educandos e se potencializando em conjunto, mediados pela ação dialógica.

Alana Franco


  
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