As questões da Educação são cada vez mais complexas e apresentam cada vez mais dilemas na sua resolução. Às vezes, são necessárias ideias simples que funcionem, que se tornem operacionais. Mas por detrás dessa simplicidade há sempre complexidade e profundidade, porque é sempre do humano e das pessoas que estamos a falar.
Trabalhar hoje em Educação não é nada fácil e investigar também não é. Hoje, a própria realidade educativa, para ser compreendida, exige múltiplos modos, estruturas e metodologias de pesquisa. Diria métodos de pesquisa. Em termos etimológicos métodos remete-nos para os caminhos. O Método é o Caminho. Muitas vezes, sem nos darmos conta, há certos métodos que ficam prisoneiros de um apriorismo que enreda e capta algo na pretensão de ser a realidade ou, até, a sua representação. Ora, desde Descartes que o conhecimento se identifica com a representação. O conceito de representação que for o reflexo de um racionalismo fechado e redutor não capta a realidade, tende a capturá-la, não havendo dela conhecimento real, ao mesmo tempo que a mesma pode ser desrealizada, desapossada, despossuída, no seu ser em si. A realidade não se diz nem se deixa dizer em categorias e conceitos esquemáticos e vazios. A realidade educativa, se o é, e tem de ser, está plena de ser e plena de verdade. Ora, há, aqui, três palavras, três categorias e três conceitos que importa salientar na sua dinâmica: ser, verdade e sentido.
À porta do ser. O conceito, intuitivo, de verdade deve ter novos influxos na realidade educativa e no conhecimento educacional, ou melhor, mais do que o conceito de verdade, é a verdade, ela mesma, o sentido de verdade, que deve estar no meio da Educação, enraizada na Educação. Temos de questionar se a sua ausência não tem criado vazios perigosos. Julgo que sim. Aqui, em nada é relevante se é um conceito da narrativa da modernidade ou da pós-modernidade. A minha preocupação, e temos por tanto lado razões fundadas, é que a ausência de relação à verdade criou relativismos que muitas vezes são formas encapotadas de despotismo, até ideológico. Não estou a falar em relatividade nem em pluralidade, como condições de diversidade e, até, como traços axiológicos que importa saber potenciar. A diversidade é sempre um valor fundante, mas não exclui, nem pode excluir, a unidade. Na Natureza o que há é diversidade, é a maravilha dos seres a ser, como princípio ôntico. A Ontologia é um saber filosófico de enorme grandeza. Entre vários autores, aprendemos isso de modo superior e luminoso, de modo muito profundo, com o Professor Doutor José Enes, no livro, também ele pleno de luz, «À Porta do Ser». É uma obra que vai às alturas e às funduras, é das obras mais originais e originantes escritas em Língua Portuguesa, marcada por metáforas profundas. Desde logo a própria metáfora, que é a metáfora das metáforas na senda da verdade. Afirma o filósofo: “(...) O homem, no universo, ocupa, por conseguinte, o lugar onde o intuito torna possível a verdade com abertura e como guarda do ser. O caminhar temporal do intuito no sentir outro alvo não tem que não seja aquela verdade. Neste contexto experiencial, ganha autêntico significado a afirmação, deduzível de pressupostos sistemáticos, que o homem é um ser para a verdade.” [«À Porta do Ser». Difusora Dilsar, 1969]. Ora, a verdade é o signo, o sinal, a sina, o fado do homem, é o destino na destinação de ser em verdade, mesmo que em processos de argumentação, diria mesmo em ontoética. O ser humano não pode evitar a verdade a não ser que se anule a si mesmo. Não é o que se tem visto, também, nos espaços públicos? O eclipse da verdade na Educação tem consequências fatais e letais. Há que o ponderar, a tempo.
Democracia e educação. A verdade tem sempre uma relação com a experiência, com o saber e o conhecimento que, no fundo, têm autoridade, uma autoridade de ser. Afirma John Dewey, com muita propriedade e autenticidade: “Cem gramas de experiência valem mais do que uma tonelada de teorias, porque só com a experiência uma teoria tem um significado vital e verificável. Uma experiência, mesmo uma experiência muito humilde, é capaz de gerar e de conduzir qualquer quantidade de teoria (ou conteúdo intelectual), mas uma teoria, separada de uma experiência, não pode ser definitivamente compreendida nem como teoria. Tende a tornar-se uma mera fórmula verbal, um conjunto de palavras-chave utilizadas para tornar o pensamento, ou a teoria genuína, desnecessário e impossível. Devido à nossa educação, empregamos as palavras, pensando que são ideias para colocar questões, e ao fazê-lo estamos, na realidade, simplesmente a obscurecer a perceção que nos impede de ver a dificuldade mais aprofundadamente.” [«Democracia e Educação». Plátano Editora, 2007]. A experiência implica esse labor acional do sujeito nas coisas e sobre as coisas. Há, também, em John Dewey, um fazer funcional cuidadoso. É um fazer que é peculiar para ser, desde logo no saber agir sobre e com as coisas, no ser das coisas. As coisas têm o seu ser, pelo qual também se faz e também se dá um certo modo de Educação. Mas onde se decide a Educação é na verdade que cada um é – ou não é – e, como tal, se manifesta em ação, relação e comunicação de ser, também na busca de sentido(s) e do sentido.
Emanuel Oliveira Medeiros
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