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O alargamento da escolaridade obrigatória exige outra agenda política

É necessária uma agenda que mobilize os esforços de todos os profissionais para a melhoria das aprendizagens dos alunos; uma agenda que integre, e não que segregue, e que respeite os valores constantes na LBSE.

O alargamento da frequência obrigatória da escolaridade até à conclusão do 12º ano ou até aos 18 anos de idade, decretado pelo ministério de Maria de Lurdes Rodrigues (Lei no 85/2009, de 27 de agosto), pode ser considerado uma medida estruturante de uma política de compromisso que, num certo sentido, se foi estabelecendo tacitamente em torno de um importante conjunto de princípios consignados na Lei de Bases do Sistema Educativo (LBSE).
A efetiva concretização desta medida de política, que é de largo alcance, tem uma diversidade de implicações quer ao nível dos primeiros anos de escolaridade, quer ao nível da estruturação do Ensino Secundário, quer ainda ao nível do Ensino Superior politécnico e universitário.
Resolvida a questão do acesso, é preciso cuidar da permanência dos estudantes no sistema escolar, assim como da sua saída para o prosseguimento de estudos ou para o ingresso no chamado mercado de trabalho.
Consequentemente, é necessário que todos os esforços possam ser concentrados no desenvolvimento das aprendizagens de todos e de cada um dos estudantes. E isto exige respostas diversificadas, complexas e inovadoras, que devem ser traduzidas nos projetos educativos das escolas/agrupamentos. Exige ainda um forte e contínuo investimento na orientação escolar dos alunos, ajudando-os a ir definindo os seus projetos de vida.
Estas são apenas algumas orientações indispensáveis para que o cumprimento da escolaridade obrigatória seja alcançado com qualidade e isto significa que se ponham em prática medidas que contribuam para que todos os alunos aprendam sem discriminações ou segregações de qualquer natureza.

Agenda de rutura vs. ... Nos últimos quatro anos, os responsáveis pela política educativa introduziram uma agenda de rutura com a LBSE (Lei no 46/1986, de 14 de outubro) e, nesse sentido, romperam com compromissos tão relevantes como a consolidação e diversificação do ensino de nível secundário, o progressivo alargamento da oferta do Pré-Escolar e a promoção da igualdade de oportunidades e da equidade. Na verdade, a agenda política atual optou pela seleção precoce das crianças e dos jovens, criando fileiras vocacionais para todos aqueles cujos desempenhos são mais fracos.
Os efeitos dos exames introduzidos nos primeiros anos do Ensino Básico, como toda a investigação vem demonstrando, não se fizeram esperar: acentuado estreitamento do currículo, ignorando-se tudo o que não é objeto de exame, nomeadamente as áreas de expressão corporal e artística; paralisação muito significativa das atividades escolares a partir de abril, pois as escolas e os professores estão exclusivamente concentrados na preparação dos alunos para os exames... E dispenso-me aqui de discutir outros efeitos indesejáveis junto de alunos, pais, professores, escolas e sociedade em geral.
Interessa deixar claro que esta política de rutura com a LBSE se tem traduzido numa acentuada burocratização das escolas, no profundo desalento e desânimo dos professores e dos diretores das escolas e agrupamentos e no significativo aumento da retenção e do abandono escolar nos três ciclos da escolaridade básica.

... Agenda integradora. Por outro lado, os cursos vocacionais criados para crianças a partir dos 13 anos de idade vieram desvalorizar os cursos de natureza profissionalizante, que, na ótica das atuais políticas, passam a ser destinados para os alunos menos capazes; funcionam como espécie de castigo destinado a todos aqueles que, de algum modo, não atingiram certos objetivos.
Este é um dos piores contributos que se pode dar ao efetivo cumprimento da escolaridade obrigatória, porque estigmatiza o Ensino Profissional e todas as dimensões técnicas e tecnológicas do Ensino Secundário, em vez de as valorizar e dignificar. Além do mais, o forte desinvestimento na educação das crianças e dos jovens com necessidades educativas especiais veio acentuar a discriminação que, tipicamente, afeta estes estudantes.
Noutro plano, não pode deixar de referir-se que há mega-agrupamentos que contrariam os critérios normalmente aceites para que uma instituição escolar se organize do ponto de vista pedagógico.
É necessária uma agenda para as políticas públicas de educação que mobilize os esforços de todos os profissionais para a melhoria das aprendizagens dos alunos. Uma agenda que integre e não que segregue crianças e jovens, respeitando os valores éticos e democráticos constantes na LBSE.

Domingues Fernandes


  
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