Pelo Despacho no 868-B/2014, de 20 de janeiro, do Ministério da Educação e Ciência, foi homologado o novo Programa e Metas Curriculares de Matemática A, para entrar em vigor no ano letivo de 2015/2016, ou seja, já em setembro próximo.
A Associação de Professores de Matemática (APM) promoveu uma petição que está a ser discutida na Assembleia da República para tentar adiar a entrada em vigor de tal programa, de modo que haja tempo para o repensar, ao mesmo tempo que se analisa com calma a prática do programa atualmente em vigor – em cuja elaboração participei pessoalmente entre 1995 e 2003. Infelizmente, muitas questões se levantam com a entrada em vigor do novo programa, que corta totalmente com a orientação do programa atual sem fundamentação bastante; com efeito, não foi feita avaliação da aplicação do atual programa; não há relatórios, só impressões; não foi feita qualquer experimentação do novo programa; o modelo escolhido afasta-se do que é praticado em todos os países (do Ocidente ou do Oriente) bem classificados nos estudos internacionais, não sendo próximo de nenhum país conhecido, com sucesso ou sem sucesso! Além disso, a data escolhida para a entrada em vigor do novo programa é totalmente infeliz. Com efeito, o novo programa de Matemática A é uma continuação do novo programa de Matemática para o Ensino Básico, que tem vindo a entrar em vigor ano a ano desde o ano letivo passado; este programa só terá chegado ao final do 9º ano em 2016 – para quê começar a aplicar a “continuação” desse programa com alunos que nunca tiveram a “parte inicial”? Para agravar a situação, o modelo escolhido para o novo programa é de uma muito maior abstração matemática, com uma ênfase muito grande nas demonstrações rigorosas, usando elementos abundantes de lógica e teoria de conjuntos... Nenhum país do mundo tomou esta opção em tempos recentes; no passado, a “lógica e a teoria de conjuntos” já foi a base do ensino da Matemática e foi um total fracasso – numa análise do que aconteceu em meados do século XX, o matemático Ralph Raimi (Universidade de Rochester, EUA) escreveu simplesmente: “The result, after twelve years, was total failure”. Previsíveis perturbações. Sendo opcional no Ensino Secundário, a Matemática A pode ser perfeitamente rejeitada pelos estudantes, com consequências gravíssimas sobre o recrutamento de alunos para o Ensino Superior nas áreas de Ciências, Engenharia e Economia, de que o país continua a necessitar enormemente. Se no Ensino Básico as disciplinas principais não são optativas, e todos os alunos têm de frequentar Matemática, no Secundário é possível escolher vias sem Matemática A, ou mesmo sem qualquer Matemática. O grande perigo de um novo programa de Matemática A aplicado apressadamente – sem uma experimentação que permita aferir da sua razoabilidade e sem introduzir emendas ditadas pela prática desse período experimental, sem sequer se procurar um modelo internacional que dê um pouco de segurança ao que vai ser aplicado a todos os alunos portugueses, sem procurar aprender as lições dos países com melhor desempenho e evitar soluções que já provaram não resultar – é que produza convulsões tais que afaste os alunos das áreas com Matemática por muitos anos, como tem acontecido em Inglaterra e vários outros países num passado muito recente. Não tendo havido estudos que minimamente suportem as opções feitas – apenas é referido pelo ministério o estudo TIMSS Advanced, em que Portugal ainda não participou e que na última aplicação internacional envolveu apenas 10 países, sendo razoavelmente inconclusivo –, prevejo que haja grandes perturbações na sua aplicação, afastando os alunos para outras vias, diminuindo drasticamente o número de alunos das áreas de Ciências, Engenharia e Economia. O adiamento da entrada em vigor do programa de Matemática A, por um ano, poderia consolidar o conhecimento e, talvez, permitir algum período experimental e alguma alteração que o aproxime dos países com práticas de qualidade internacionalmente reconhecida. Reformas feitas à pressa nunca resultaram, ainda por cima quando parecem contrariar tudo o que é feito no resto do mundo!
Jaime Carvalho e Silva
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