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Educação e “atitudelogia”

Nos tempos que correm, vários são os temas que importam para a Educação e que a Educação desperta ou pode despertar, desde logo como atitude essencial, que caracteriza – e deve caracterizar – o ser humano que é e que busca ser, em verdade, em bondade e em generosidade. Precisamos de atitudes geradoras de humanidade, e amor e de compaixão. Essas dimensões não se privatizam, privilegiam-se.
Aqui falo em Educação em sentido amplo, escolar e não escolar, em termos formais ou informais, mais institucionais ou menos institucionais. Toda a Educação é, de alguma forma, um nexo racional com muitas margens de não racionalidade sem que isto signifique irracionalidade. Nem toda a racionalidade dá conta da razão educacional e pedagógica, até porque intervêm outros elementos. A Educação é feita de inesperados, de imprevistos, de desalinhamentos, por maior estruturação que se queira impor.
A pessoa não se esgota nos seus comportamentos. Aliás, há que distinguir a pessoa dos seus comportamentos e também não confundir estes com as atitudes. As atitudes têm morada no ser interior da pessoa que é a ser. É certo que a pessoa se revela no que faz, mas ela é sempre mais do que isto.
Sempre me fez imensa impressão quando a corrente humanista é apresentada como uma entre outras, como por exemplo a comportamentalista, a cognitivista, etc. Ora, é precisamente a pessoa que faz a síntese entre tudo e com tudo. Há muito tempo que correlaciono as vivências, como um todo, e as cognições. Há muito tempo cheguei a escrever a palavra cognivivência, que agora coloco a circular.

Crise de valores? Para mim, a cognição é vivência interior e não se reduz a estruturas formais sem vitalidade. Longe de qualquer racionalidade tecnicizante, as estruturas cognitivas têm suportes vitais ao mesmo tempo que constituem uma base fundamental para ordenar e configurar a vida mental e psíquica. Mas acima de tudo isto está o plano espiritual onde, para mim, está o cerne e a culminância da pessoa, em processos de autoeducação, de heteroeducação e ecoeducação, para aqui aplicar a tríade tão bem explicitada pelo professor António Nóvoa, quando nos fala no método autobiográfico na formação de adultos.
A pessoa é o centro edificante de si mesma e dos outros. Impõe-se hoje, cada vez mais, o respeito. Muito me preocupa quando ouço, com insistência, pessoas de várias idades afirmarem já não haver “valores humanos”. Fico seriamente preocupado, triste até. E sempre fui, e sou, um otimista. Mas há que dar a volta e acreditar, de novo, ainda e sempre. Na realidade acreditar é um risco, mas é um risco inevitável. Nesta fase em que já tanto se fala no pós-humano há que fazer o diagnóstico e ir ao fundo e indagar as razões da desumanidade que assola o humano. Humano, demasiado humano, sintamos com Nietzsche.
O que se está a passar? Os valores são o centro fundamental da Educação, Ensino e Cultura. Não pode haver educação sem valores. Em verdade, a educação ou é axiológica ou não é. Caso contrário, o ensino é um simulacro, um engano e um logro. Todos os saberes escolares e académicos devem trazer mais ser ao ser, mais consciência à consciência, mais liberdade à liberdade, mais autonomia à autonomia. A autonomia é a capacidade de a pessoa dar a lei a si própria. Kant tem ainda muito para dar. Antes, o humanismo cristão tem, também, muito para dar.
Nos processos de educação e de formação sempre considerei da maior importância dar atenção a várias dimensões como atitudes, valores, capacidades, conhecimentos e competências, entre outras, numa conjugação dinâmica de todos esses elementos. Destaco as atitudes.

Conjugar agir e ser. No dia 15 de novembro deste ano escrevi num dos meus diários que o que hoje me incomoda seriamente – de modo quase agonizante, mas exasperante – é a mentira e a maldade como veneno que provocam a cegueira e a inveja e lesam o Outro. Sinto-o. Hoje é flagrante a atualidade do Evangelho de Cristo, o seu desconhecimento, o seu conhecimento de cor, sem a correspondente prática de vivência e de aceitação ativa. Não se pode deixar que a mediocridade e a maldade ganhem terreno. Há que as secar. Não alimentar. Fazer o jogo limpo, fintar e passar adiante.
O conhecimento deve abrir-se ao discernimento e, assim, a epistemologia e a gnoseologia dão lugar – ou abrem espaço – a um novo tipo de saber, o saber do porquê das atitudes. Dar lugar à atitudelogia, criar uma AtitudeLogia. Caso o termo ainda não exista declaro-o, para registo de patente: criei um novo conceito, agora, dia 15 de novembro de 2014, pelas 22h15. Data e hora de nascimento do conceito.
Não se trata de nenhuma pretensão, o que seria ridículo. Trata-se de procurar evidenciar as atitudes como sinais que remetem para uma exegese, para uma hermenêutica de compromisso. A pessoa diz-se no que faz, no que se faz. Talvez pudéssemos criar, até, o verbo atitudear. Por que atitudeamos deste e não de outro modo? Atitudear, eis o verbo. Conjuga agir e ser. Configura. Dá fisionomia. Hoje é preciso amar. É preciso não desejar mal. Venha o Bem. Só o aroma do bem afasta o mal. É também uma questão de Física, de teoria corpuscular do bem. Vivemos e estivemos muito tempo a esquecer algo de muito sério: o mal e a maldade existem. Ignorá-los é muito grave. É muito perigoso.
A problemática da maldade deve ser repensada, com urgência, para que sejamos mais e melhores pessoas e em instituições que sejam dignas desse nome. Se é verdade que a problemática do mal é tão antiga como a história, da humanidade e da pessoa individual, seria muito importante que houvesse mais história com menos maldade, para que o mal não se torne uma banalidade, como nos adverte Hannah Arendt.

Saudade de pessoas boas. Ao investigar e refletir sobre a problemática do mal, afirma o professor João Boavida: “Há muito trabalho para todos: políticos, investigadores, filósofos, psiquiatras, religiosos, polícias, altruístas de todos os matizes, e sobretudo educadores, teóricos e práticos, pois a vitalidade do mal é eterna e tem hoje armas mais letais e dissimuladas que nunca”. E nessas armas letais incluo o cinismo, desprezível, e a mentira como expressões perversas da maldade.
Precisamos de pessoas sérias e idóneas. Mas, atenção, ser pessoa séria e idónea significa saber-se imperfeito e pecador, significa impor-se a si mesmo/a a tarefa de se tornar melhor e de não fazer mal ao outro.
Quem se regozija com o mal é um/a triste servil que apenas se autodestrói. Quem ama pelo simples gosto de amar dá mais vida à vida e arreda de si a vil tentação de ser mesquinho. Diz o provérbio: “Mais vale só que mal acompanhado”. De facto, a solidão que é geradora de ser tem solicitude. Basta declinar a palavra e logo ela se nos abre em beleza e esplendor.
Tenho saudades de pessoas boas. Conforta-me o sentimento de que elas me habitam, de alguma forma. No milagre da vida há um momento fulcral onde vislumbrarmos o mistério de ser.

Emanuel Oliveira Medeiros


  
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