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Ataques ao Ensino Superior

Implícitos ou explícitos, diretos ou indiretos, os ataques ao Ensino Superior são um ataque ao património cultural e intelectual comum e precisam de ser desafiados com o rigor e os recursos adequados que a questão merece.

Um novo relatório produzido pela Global Coalition to Protect Education from Attack – «Education Under Attack 2014» – foi divulgado no mês passado [www.protectingeducation.org/education-under-attack2014].
É o terceiro desde 2007, e pretende dar uma visão geral dos ataques violentos contra os sistemas e comunidades de todo o mundo da Educação, e o primeiro a explorar sistematicamente os ataques violentos contra os sistemas de Ensino Superior. O documento é uma leitura sóbria e recorda-nos os desafios de vida e morte que os académicos e estudantes enfrentam em muitas partes do mundo.
O relatório observa que, na última década, milhares de membros da comunidade académica têm sido alvos diretos de ataques violentos. O que emerge da literatura é que os tipos, quantidade e magnitude dos ataques variam entre os diferentes contextos, mas que, geralmente, envolvem uma combinação de táticas.
Na Tailândia, incluíram assassinatos seletivos de professores e ataques à bomba a autocarros de transporte de professores; no Iraque, encontram-se muitas evidências de ataques à bomba em larga escala, através de dispositivos detonados à distância, visando universidades, seguidos de sequestros, tiroteios, ameaças e tentativas de assassinato; na Colômbia – onde parte do conflito teve na base um confronto entre grupos de esquerda e de direita, forças estatais e forças não regulares ligadas ao Estado – têm como alvo professores e sindicalistas, através de ameaças, ataques violentos, detenções arbitrárias, desaparecimentos e torturas.

Violência extrema. Na Colômbia, Etiópia, Irão, Iraque e Zimbabué, os ataques ao Ensino Superior têm como alvos específicos académicos, estudantes e sindicalistas e resultaram em ameaças de morte, raptos, desaparecimentos forçados, prisões ilegais, espancamentos, tortura, assassinatos a tiro ou com bombas em automóveis, ou combinações destas táticas.
No Iraque, os ataques incluíram bombistas suicidas, tendo como alvo grandes grupos de estudantes universitários ou de outros níveis. No entanto, estes ataques dirigidos a grandes grupos de estudantes através de bombistas suicidas ou de explosivos remotamente detonados – recentemente testemunhado também na Síria – têm sido raros noutros lugares.
No Irão, a violência sexual contra estudantes e académicos de ambos os sexos detidos tem sido citada como um tipo de ataque perpetrado ao nível de Ensino Superior. Da mesma forma, no Egito, ativistas estudantis foram submetidas a violência sexual humilhante por parte das forças policiais nacionais, das forças de segurança e de partidários do governo.
Tiroteios em grandes eventos, como protestos e manifestações, tendo como alvo os estudantes fora dos campus, têm sido utilizados na Tunísia, Irão, Bahrein, Filipinas e Colômbia, entre outros.
Noutros países, como o Sudão do Sul, a Costa do Marfim, a Somália e a Colômbia, grupos armados estatais e não estatais usaram as universidades para fins militares, como esconderijo de armas ou campos de treino de milícias ou militares.

Alheamento internacional. Apesar de uma década de defesa e compromisso da UNESCO [Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura] e de redes como Scholars at Risk, Scholar Rescue Fund e outras, a investigação e a luta contra os ataques ao Ensino Superior ainda sofrem de lacunas críticas e deficiências.
A falta de atenção por parte da comunidade internacional – tanto na investigação como na prática – é uma omissão grave. O setor universitário tem, em todo o mundo, uma tarefa complexa e multifacetada no fornecimento de formação para futuras carreiras, atuando como ponto de reflexão crítica sobre o desenvolvimento das sociedades nacionais, como campo de formação para as elites políticas nacionais, como ponto-chave da socialização de uma nova geração de cidadãos e como espaço potencialmente autónomo, entre o Estado e o Capital, a Religião e a Sociedade, onde as questões-chave podem ser debatidas e as soluções desenvolvidas através do debate e do empenhamento democrático.
Implícitos ou explícitos, diretos ou indiretos, os ataques ao Ensino Superior são um ataque ao património cultural e intelectual comum e precisam de ser desafiados com o rigor e os recursos adequados que a questão merece.

Mario Novelli


  
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