Com estabelecimentos de educação e ensino a abarrotar de dívidas, com dezenas de docentes mandados borda fora e centenas no trapézio, com seis milhões de euros em dívida aos professores, o orçamento da Madeira para 2013 contemplará quase 11 milhões para o sistema desportivo, fundamentalmente dirigidos à competição e à representação nacional e internacional.
O ministro da Educação, doutor Nuno Crato, anda, como sói dizer-se, à procura da rolha. Não consegue sair do “plano inclinado”, programa de televisão que o catapultou para o ministério. Só que, entre dizer umas coisas ao lado do pregador dr. Medina Carreira e governar, a diferença é substancial. Dos meses de governação que leva, denuncia uma ausência de visão de conjunto do setor, ao mesmo tempo que demonstra não ter força política suficiente para determinar que o atual quadro de crise necessita de um substancial reforço na política educativa. Governa nas margens e subjugado às regras economicistas (não as do rigor) ditadas externamente e que explicam, entre outras, a insensata revisão da estrutura curricular, geradora de inúmeros conflitos, onde os professores são, intencionalmente, enxotados como peças descartáveis. O ministro quer lá saber dos estudos que revelam que não há professores a mais, que apresentam elevados valores de exaustão emocional, que falta reconhecimento profissional, que ter “horário zero” tira o sono a qualquer profissional e provoca altos níveis de ansiedade e depressão! Quer lá saber que haja gente imolada no altar dos interesses ditados pela sacrossanta troika, que pouco ralada demonstra estar com as pessoas e com o país! Interessa-lhe a submissão à lógica do “bom aluno” perante esses funcionários de tez carregada e distante, que sacam o máximo de juros em função de um empréstimo que deveria ser considerado de acordo com as possibilidades do país e no quadro dos equilíbrios financeiros mundiais. Há uma cegueira e uma preocupação em saber onde poder esmifrar, mesmo que isso signifique empobrecimento de todos e o pão da boca de milhares de docentes necessários ao sistema educativo. O quadro que hoje está desenhado, estou certo, conduzirá a uma profundíssima revolta, muito mais expressiva do que aquela contra a ex-ministra Maria de Lurdes Rodrigues. Não me sobejam dúvidas relativamente a isso. Este “PREC de direita”, na expressão de Miguel Sousa Tavares, estes “tempos bárbaros”, na escrita de Henrique Monteiro, visam os que veem limitados os acessos à Educação e à Saúde, direitos constitucionais cortados sem dó nem piedade e sem a visão de que o futuro só pode ser construído com muito trabalho, rigor e disciplina, é certo, mas com respeito pelas pessoas e pelos direitos conquistados. Ora, Nuno Crato é mais um que, no seu setor, dá rumo ao desmantelamento do Estado. Um Governo que não assume a Educação como a prioridade das prioridades, que demonstra apenas saber conjugar o verbo cortar, manifesta desprezo pelo futuro. Revoltam-me os traços desta ideologia dominante, que varre a esperança que deveria constituir o alimento e a motivação de toda a população. Mas não é só o ministro que constitui motivo de insatisfação. Na Região Autónoma da Madeira, sujeita a uma dupla austeridade, pela dívida do Estado e pela assustadora dívida regional de oito mil milhões (o orçamento regional é cerca de 1,5 mil milhões), o quadro é de uma enorme angústia. Apenas um exemplo: com estabelecimentos de educação e ensino a abarrotar de dívidas de vários anos, sem dinheiro para projetos educativos, consumíveis, água, energia e comunicações, com muitas dezenas de docentes mandados borda fora e centenas no trapézio, sem rede, com seis milhões de euros em dívida aos professores, o orçamento de 2013 contemplará quase 11 milhões para o sistema desportivo, fundamentalmente dirigidos para a competição e representação externa nacional e internacional. Trata-se de uma afronta, não só pelos constrangimentos globais, mas também pelos enclausuradores níveis de instrução, de habilitação académica e profissional e de insucesso, limitadores da construção do futuro. Curiosamente, no âmbito do desporto educativo escolar, aquele que pode ser portador de futuro e de desenvolvimento, nem uma palavra. Importante é, embora no decurso de uma gravíssima crise, alimentar o circo, mesmo que a lona esteja esburacada e as bancadas cada vez mais vazias. Face a um povo que sucumbe nas mãos de várias troikas, Crato e Jardim, cada um à sua maneira, multiplicam o labirinto, ao invés de procurarem encontrar a saída para um caminho que se sabe estreito, penoso, mas com o sentido de alguma esperança.
André Escórcio
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