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A mediação escolar ou sociopedagógica na construção de uma Escola para a (con)vivência

Ninguém aprende no vazio. As pessoas aprendem comparando o que já sabem com a novidade. Portanto, a aprendizagem ocorre sempre em resultado de uma mediação relativamente ao seu modo de ver, aos seus conhecimentos, à sua leitura do mundo.

Apesar das reformas escolares e da preocupação com a ligação da escola ao meio, há, ainda hoje, efectivamente, um fosso entre as pessoas que pensam a Escola e as pessoas que pensam as instituições para além da Escola, do ponto de vista da aprendizagem, da socialização, da educação ao longo da vida, etc.
É preciso que a Escola perceba que os alunos têm vida própria, têm histórias de vida, vivem numa sociedade e em culturas específicas e, portanto, isto não se apaga quando os alunos entram na escola. Alguns professores é que podem apagar, entendendo que estão a enriquecer. É como se o aluno usasse uma mochila cultural que deixa à porta da escola e se transformasse num boneco de cartão formatado para, depois, voltar a pôr a sua mochila cultural quando vai para casa, vivendo dois mundos desarticulados. De facto, a criança transporta consigo para dentro da escola as suas vivências, a sua família, a comunidade e todo o seu background. Leva a sua mochila cultural para dentro da escola. Ignorar esta realidade é enfiar a cabeça na areia, é alhear-se do real.
Neste sentido, os professores que queiram fazer mediação sociopedagógica, e são muitos, devem fazê-lo sempre de forma sociocultural, porque deve partir sempre do aluno, da criança, da pessoa. Ninguém aprende no vazio, as pessoas aprendem comparando o que já sabem com a novidade e, portanto, a aprendizagem ocorre sempre, de alguma forma, em resultado de uma mediação relativamente ao seu modo de ver, aos seus conhecimentos, à sua leitura do mundo.
Assim, podemos e devemos sempre falar de mediação sociopedagógica ou mediação socioescolar. A mediação escolar é sempre – ainda que alguns o esqueçam – social e a pedagógica é, também, sempre social. Se o não for, estaremos a construir uma Escola abstraída da sociedade, da comunidade e das culturas, o que não é o pretendido na letra da Lei, nem o que querem os cidadãos. Portanto, como ninguém aprende no vazio, como se aprende a partir de uma base cultural, a mediação é sempre, seja em contexto escolar ou não, uma mediação sociocultural.
A Escola não é só instrução e trabalho de cognição. Hoje, sabemos que os currículos foram mudados, as nossas reformas trouxeram formação pessoal e social, educação para a cidadania, etc. A Escola tem, inevitavelmente, uma função educadora. Mas em que sentido? Uma educação para uma cidadania (escassa) do ponto de vista da domesticação, como aconteceu na ditadura portuguesa do Estado Novo? Não é esta cidadania que queremos!
Como Paulo Freire escreveu, trata-se de “uma educação para a libertação”, de uma educação de sujeitos. De uma educação global. E neste tipo de educação a Escola tem que preparar para a (con)vivência, para o aprender a viver com os outros [Xesus Jares, “Pedagogia da Convivência”].
A educação para a cidadania tem que utilizar a Escola, o seu espaço e o seu tempo, seja de uma forma disciplinar, multidisciplinar ou transdisciplinar, para, em articulação com o projecto educativo, formar para “viver com”. Nós temos que aprender a viver com os diferentes – aquilo que Isabel Baptista defende como hospitalidade, que é nós recebermos o outro, estarmos disponíveis para o(s) outro(s) [Educação, Justiça e Solidariedade na Paz, em “Educação, Justiça e Solidariedade na Construção da Paz”, Américo Peres e Ricardo Vieira, coord.].
A Escola de hoje ainda tem um olhar monolítico que estranha o outro. Mas, num olhar aberto e numa sociedade plural, uma pessoa tem de, não só não estranhar o outro, mas, também, entender o outro como fonte de benefício, como potencial de enriquecimento e de aprender a viver com ele. Neste sentido, a mediação enquadra-se num paradigma intercultural, no qual se reivindica uma escola para todos e não todos para uma escola. Neste paradigma, o potencial da educação para a hospitalidade e para a convivência está sempre presente. O próprio mediador é um construtor de educação para a hospitalidade e de educação para a convivência, hospi talidade que o ser humano tem que desenvolver para saber receber o outro (Isabel Baptista).
E “viver com” é admitir que o outro é diferente, ouvi-lo e respeitá-lo, ainda que não concordando, seja numa relação de género, sexo, idade, religião, cultura, professor, aluno, patrão, empregado...

Ana Vieira


  
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