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Dez anos depois de Abril, que contradições na educação portuguesa?

Dez anos depois de Abril, que contradições na educação portuguesa?

A contradição entre o capital de ideias, projectos, experiências e lutas que tentam repor em novos planos a função social e pedagógica da escola e os bloqueios conservadores de estruturas e actores sociais que sucessivos governos e Ministérios da Educação cristalizam, justificam e representam nas suas políticas educativas. Políticas desconexas, mas nem por isso, ou talvez por isso mesmo, menos actuantes. Será esta a contradição essencial?

A gestão democrática foi uma das conquistas mais importantes do 25 de Abril. E diariamente vivemos a contradição entre as tentativas de professores e alunos de se apoiarem na gestão democrática para iniciativas autónomas e criativas e o peso paralisante dos espartilhos legais e dos problemas desgastantes dessas casernas inóspitas onde milhares de jovens e centenas de adultos diariamente se consomem.

E esta máquina absurda que se chama sistema educativo português que provavelmente já não serve os interesses de nenhuma classe social, mas continua a mover-se e a alimentar-se dos seus próprios insucessos? Contradição entre os direitos e aspirações das crianças e jovens portugueses, renascidos em Abril, e a realidade cruel dos fracassos a que a escola os submete.

Contradição entre uma sociedade que tem necessidades urgentes e energias potenciais para se transformar e as forças político-sociais que se apropriam do desejo e do sentido de mudança para fazerem deles assuntos de retórica discursiva e manto para encobrir os objectivos não-ditos.

Contradição entre a quantidade e qualidade do esforço de reorganização dos esquemas mentais, atitudes e processos de trabalho para que surja um educador de novo tipo, que uma educação para o desenvolvimento democrático do País exige, e a forma como o Poder trata a formação, o estatuto e as condições de vida dos professores.

Dez anos depois, nem o discurso ritual sobre o tempo original de um Abril mítico, nem o silêncio quando parece nada mais haver para dizer e fazer. Talvez pensar e agir no intervalo entre o optimismo que dá a esperança e o pessimismo que nos faz lúcidos. Reforçar a intervenção sindical a todos os níveis, denunciando as situações e os seus agentes a dando voz à expressão dos legítimos interesses ofendidos. Defender e alargar todas as experiências que contribuam para renovar a vida democrática das escolas. Abrir e reabrir o debate sobre os problemas e ideias em confronto no domínio da educação, interessando diversos sectores sociais e culturais. Actuar sobre o lado dinâmico das contradições.

José Gomes Bento
[1984]


  
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