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Eastwood, Obama & Cª

Clint Eastwood está de volta, atrás e em frente à câmara, com um filme de extrema violência simbólica e ao mesmo tempo de um humor inesperado. Gran Torino marca um início de ano cinematográfico assinalado por um desfile impressionante de stars americanas nos ecrãs portugueses: Brad Pitt, Mickey Rourke, Tom Cruise, … coincidente com o momento em que outra star americana invade os pequenos ecrãs de todo o mundo, Barack Obama.

E fá-lo no fim de uma série de actos simbólicos como o de (re)percorrer uma a uma as grandes etapas da carreira de Abraham Lincoln, (re)dando uma função política maior e um peso de  compromisso moral esquecido ao uso das palavras, escritas  e ditas em  público. Não se trata da mesma coisa, mas a aproximação não é assim tão artificial, porque aqui como lá, joga-se a velha questão da encarnação. Num cinema hiper espectacular, saturado de efeitos especiais numéricos como num sistema político, ele também espectacular e enfeudado ao marketing comunicacional hightech, revela-se indispensável que haja um momento em que “se é alguém”. Uma presença carnal do real e do imaginário humano. Um corpo, um rosto, uma voz, inscritos num passado e num presente: poderíamos chamar a isso cinema (e não o cinema).

Trata-se aqui essencialmente da presença masculina, que poderia trazer outras reflexões, mais ou menos significativas, como a idade, às alterações do corpo que se manifestam na sucessão de cabeças de cartaz. A esse respeito, o filme de Eastwood e o de Fincher (A incrível história de Benjamin Button) estão mais próximos do que se opõem. O primeiro faz da sua presença, umas vezes divertida outras trágica, toda uma história que é simultaneamente a dos Estados Unidos, a do cinema americano e a da sua própria filmografia. O segundo faz do corpo de Brad Pitt, com o recurso a inumeráveis efeitos virtuais e materiais, o palimpsesto onde se inscreve a passagem do tempo que se desenrola ao contrário - e é de novo uma história do seu país, e do cinema de Hollywood. Do mesmo modo que o corpo martirizado de Mickey Rourke, exibido em Wrestler, e as certezas de Tom Cruise em Walkyrie, são ainda e sempre parte duma presença abstracta e sobre-humana (a star) que tenta de novo voltar à ribalta. Clint, Brad, Mickey, Tom … Barack: impressionante, esta omnipresença dos USA, na actualidade real e na realidade das estreias. Em resumo, não basta dizer que o cinema vai bem. É preciso também dizer que está a trabalhar bem.

P.S. Atenção especial ao Curtas de Vila do Conde deste ano: entre outras, a pérola de  Murnau Tabu (1931) com música ao vivo de Paulo Furtado (Legendary Tiger Man).

Paulo Teixeira de Sousa


  
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