Página  >  Notícias  >  “O Filho de Mil Homens” até 30 de março

“O Filho de Mil Homens” até 30 de março

TEATRO BRUTO

Esperança. Amor. Encontros. Família. Sonhos. Tudo isto é “O Filho de Mil Homens”, que o Teatro Bruto apresenta no Teatro Carlos Alberto (Porto), com atores profissionais e não profissionais: formandos de um laboratório promovido pela companhia e alunos de uma escola de teatro. A PÁGINA falou com a encenadora e diretora artística, Ana Luena.


Resultando de uma aposta da companhia em novas dramaturgias, “O Filho de Mil Homens” é a quarta colaboração entre o Teatro Bruto e Valter Hugo Mãe, depois de “Cratera, as crianças com segredos” (2010), “Canil” (2012) e “Comida” (2013).

“O Filho de Mil Homens” conta a história de Crisóstomo, que aos 40 anos lida com a tristeza de não ter tido um filho. Conta também a história de Camilo, Isaura, Antonino e Matilde e de como é preciso acreditar que é possível sermos melhores e que podemos ser nós a traçar o caminho a seguir. São histórias que se cruzam e que chamaram a atenção de Ana Luena, encenadora e diretora artística do Teatro Bruto.

“Eu identifico-me muito com este texto, porque marca uma geração ou uma fase da nossa vida, que é a dos 30 a chegar aos 40 anos. E depois, no momento que estamos a viver, tem esta ideia de esperança. Eu queria muito que o espetáculo fosse não uma mensagem de esperança, mas ele próprio uma esperança. É assim um bocadinho ambicioso nesse sentido”, contou Ana Luena à PÁGINA.

“Também tem um bocadinho a ver com a forma como trabalho em teatro, as relações que crio, de uma espécie de família, a ideia de que nós podemos construir a nossa família. Se calhar podemos tentar a felicidade, não conseguir, mas pelo menos tentar. E depois há questões que são do ‘destino’ e outras que nós podemos de facto mudar. Acho que o Crisóstomo representa isso. É um homem livre, também a nível de preconceitos e para o amor. E a necessidade de ter um filho... E a questão da morte, que está muito presente e com a qual nunca nos conseguimos relacionar assim tão bem. E o amor.”

Mais do que contar a história, houve a preocupação de passar a mensagem. Luena deixou-se envolver pela forma como o livro se organiza, pelas personagens trágicas, que depois são de certa forma “pescadas” por Crisóstomo, e por todos os temas que a obra aborda. “Penso que a teatralidade do romance poderá estar na questão das narrativas, que depois acabam por se cruzar, mas que no início se dividem em capítulos, quase como contos independentes, que se cruzam mais tarde”.

A adaptação da obra foi um processo complexo (também pela “responsabilidade de pensar que há público que leu o livro e público que não leu”), mas não é novidade no Teatro Bruto, que por diversas vezes abre as portas à comunidade para laboratórios de criação e adaptação.

Primeiro, Ana Luena escolheu três capítulos, fez “uma espécie de limpeza desses três capítulos” e, em dezembro, num dos laboratórios, os participantes foram lendo os textos e encontrando o caminho para a melhor adaptação. Foram levantadas questões, “as grandes questões, ou seja, quais os personagens que ficariam e quais os que não ficariam, que histórias é que seriam contadas e que histórias é que não seriam”. Depois pegou no trabalho em bruto e fez a adaptação do romance.

Há uns anos, nos Açores, Ana Luena teve uma experiência bastante positiva, num projeto com uma companhia amadora, no qual a primeira parte era aberta à comunidade, a não profissionais de teatro. “Gostei imenso.” Algumas dessas pessoas chegaram a participar no espetáculo, em palco, na cenografia e nos figurinos. “Gostei tanto da experiência que comecei a pensar que podia fazer isto cá no Porto e começar a dar formação a pessoas de qualquer área, de qualquer idade, a partir dos 18 anos, que culminasse num espetáculo encenado.”

Assim foi e assim nasceram laboratórios ligados à dramaturgia e adaptação de texto, ao projeto encenado, que engloba improvisação, contracena, composição de cenas, luz, cenografia e figurinos, e que envolvem a participação da comunidade. “O trabalho que costumo ter com os atores nos primeiros 15 dias é aberto a outras pessoas”.

“O que quis fazer aqui foi juntar isto tudo. Ou seja, trabalhar com pessoas que nunca se cruzaram connosco. Não queria um trabalho de figuração, queria um trabalho mesmo cruzado, sendo que os atores têm uma disponibilidade que eles não têm. Comecei por isso a trabalhar com eles mais cedo. Dei uma primeira parte de formação, a partir de um dos capítulos do romance, e depois comecei a encenar o espetáculo e a cruzar primeiro umas partes com eles e depois a cruzar com os atores. Acho que este romance merecia isso, não ser feito por três ou quatro atores, por esta ideia de humanidade. O facto de não serem atores é um trabalho muito diferente. E também dá alguma verdade. Emociona-me ver pessoas que não são profissionais a dizerem o texto e a viverem o espetáculo. Têm a coragem de estar a trabalhar com profissionais lado a lado. E é muito interessante a relação que também criam entre eles”.

O espetáculo também tem música, composta e interpretada ao vivo por Peixe, diretor musical, que realiza a terceira colaboração com a companhia. “Para além do talento, que acho que tem muito, tem também essa característica de trabalhar em vários projetos com a comunidade. Acho que é preciso um certo perfil para trabalhar neste tipo de projeto, em que não há protagonistas. Somos todos protagonistas e ao mesmo tempo”, frisa Ana Luena.

Maria João Leite/PÁGINA
[fotos gentilmente cedidas por João Tuna/TNSJ]


  
Ficha do Artigo

 
Imprimir Abrir como PDF

Partilhar nas redes sociais:

|


Publicidade


Voltar ao Topo