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Gaia Blues Antecede Intercéltico do Porto

Os meses de Março e Abril anunciam-se de grande qualidade musical na Área Metropolitana do Porto, designadamente nas duas cidades-margem da foz do Douro.
Para lá do anunciado regresso de Patxi Andión aos concertos, após 10 anos de afastamento voluntário, o primeiro Festival de Blues de Gaia e a 11ª edição do Intercéltico do Porto prometem muita música e muita emoção, ou não fossem os blues (resistência, superação) e a música celta (festa, celebração) duas das melhores traduções da emotividade humana.
De saudar, particularmente, a iniciativa que decorrerá no Auditório Municipal de V.N. Gaia (10 a 12 de Março, sempre às 22 horas). Como refere o vereador da Cultura, Barbosa da Costa, "Gaia assume a complementaridade que lhe é específica na programação cultural da Área Metropolitana, apresentando um festival de qualidade que não se esgota nas actuações dos artistas, mas que pretende fincar-se como referência", designadamente pela repercussão das actividades paralelas que se anunciam: workshops, projecções de video-blues, feira do disco e a atribuição do Prémio Rui Veloso, sobre o qual «A Página» não conseguiu obter pormenores, mas que, de alguma forma, homenageará o mais autêntico bluesman português ? que, já agora, bem poderia integrar o cartaz do festival.
Mas, apesar de Veloso não actuar, a programação de Gaia não tem de que se envergonhar. Desde logo, porque no primeiro dia (10 de Março) estarão em palco dois dos mais genuínos contadores de histórias, afinal a grande essência do blues. De acordo com a organização, o guitarrista John Dee Holeman, de 71 anos, "é um dos velhos músicos americanos que prolonga no tempo um estilo profundamente rural e simples do sul (dos EUA)".
Sucede-lhe Pinetop Perkins, acompanhado pela Bob Margolin Blues Band. Actualmente com 87 anos, Perkins tornou-se conhecido do grande público desde que, em 1969, passou a integrar a banda do lendário Muddy Waters. Tendo começado por tocar guitarra ? instrumento que abandonou, na sequência de um acidente ?, Perkins adquiriu uma lendária reputação de pianista, sendo apresentado como "um dos últimos pianistas a veicular a tradição musical do sul (...) O seu estilo é peculiar e seguro, revelando as referências da tradição rural do Mississipi". Com Perkins, estará em palco um trio liderado pelo guitarrista Bob Margolin, que também ascendeu ao reconhecimento público aquando da sua passagem pelo grupo de Muddy Waters ? B.B. King, John Lee Hooker, Albert King e Etta James são apenas alguns dos nomes que requisitaram a sua colaboração.
No dia 11, o palco é partilhado pelos portugueses Charly & The Blue Scats e pelo guitarrista Eddy Clearwater. No primeiro caso, trata-se de uma formação radicada em Setúbal e liderada por Carlos Bombaça ? nascida em 1996, já actuou na primeira parte dos concertos da Carey Bell Harp Blues Band (Lisboa) e B.B. King (Lisboa e Porto), onde apresentou um repertório de clássicos (referenciados em Chicago, Texas e Memphis) à mistura com algumas composições originais.
Clearwater, por seu turno, é um guitarrista originário do Mississipi. Começou por acompanhar grupos de gospel e a sua estreia em Chicago remonta a 1950, mas a sua grande referência é Chuck Berry: "Durante cerca de duas décadas, foi afirmando um estilo peculiar caracterizado por uma espécie de mistura entre rock?n?roll e estilo Chicago West Side, enquadrados por uma técnica de mão esquerda pouco habitual, uma presença em palco muito dramatizada e um repertório diversificado".
A encerrar o certame, no dia 12, estará o Jean-Jacques Milteau Quintet. Considerado uma das mais importantes referências no domínio da harmónica, o músico francês despertou para o blues através das gravações de Sonny Boy Williamson e Sonny Terry. Ex-vendedor, tornou-se músico profissional graças ao cantor francês Eddy Mitchell. De acordo com os promotores do 1º Gaia Blues Festival, "o estilo de Milteau é versátil e a sua fluidez admirável", proporcionando "um sentido correcto e apropriado do acompanhamento".

DE JUNKERA A FAUSTO

Em 11ª edição, o Festival Intercéltico do Porto decorre de 31 de Março a 2 de Abril, com iniciativas repartidas entre o Coliseu e o Rivoli, a exemplo do ano anterior.
Afirmando o desejo de contrapor à globalização cultural a preservação da tradições e "mais do que isso, caminhar para o futuro sem perder a identidade própria", os programadores do Intercéltico 2000 apostaram claramente na música portuguesa. Não apenas em termos de concertos, como adiante se verá, mas também no âmbito de duas iniciativas complementares que terão lugar no Rivoli, designadamente um workshop de guitarra portuguesa, com Paulo Soares (31 de Março e 1 de Abril) e a apresentação do livro «Carlos Paredes: A Guitarra de um Povo», de Octávio Fonseca Silva (1 de Abril, 17h).
No programa de concertos do festival, destaque, ainda, para o concerto de encerramento. Fausto dispensa apresentações ? quem poderá esquecer, entre tantas grandes canções, o genial «Por Este Rio Acima»? ? e garantirá, certamente, um grande final de festa a todos os celticodependentes que deverão esgotar o Coliseu (2 de Abril, às 22 horas).
Antes disso, no entanto, o Intercéltico propõe uma viagem pelos universos musicais da Escócia ("os Ceolbeg deixam que as formas actuais e antigas convivam pacificamente") e do País Basco ("a música de Kepa Junkera é absolutamente desconcertante") ? ambos no Coliseu, a partir das 22 horas de 31 de Março ? e da Galiza ("os Muxicas rejeitam qualquer instrumento que não faça parte da tradição") e da Irlanda ("a música dos Lúnasa é uma alegre festa, montada sobre andamentos vertiginosos") ? na mesma sala, à mesma hora do dia 1 de Abril.
Para além destes concertos, ditos maiores, o 11º Intercéltico proporciona, ainda, outros espaços-momentos de festa. Assim, no Rivoli exibir-se-ão duas formações portuguesas: O Ó que som tem/Tocá Rufar ("sem fazer concessões às modas do momento, afirmou-se pela qualidade técnica dos seus executantes") ? 31 de Março e 1 de Abril, às 18 horas ? e os Comvinha Tradicional ("um dos numerosos grupos que, apesar do talento e da criatividade, permanecem no anonimato. Mas não merecem") ? mesmos dias, às 23 horas.
No Salão Ático do Coliseu funcionará o que os promotores do Intercéltico apelidam de Folk Club, que abrirá as portas da madrugada aos mais indefectíveis da festa céltica. Nos dias 31 e 1, a partir da meia-noite, ali será apresentada "uma perspectiva da música tradicional portuguesa traçada apenas pela voz" (Segue-me à Capela) e desvendado o segredo da música celta tradicional (Shantalla).

António Baldaia


  
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Edição:

N.º 89
Ano 9, Março 2000

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