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Falta Paz

Não há top nem guerra de audiências em que o vencedor não seja a desgraça de quem sente que a morte é prematura, mas faz sofrer menos do que a vida. O palco não está longe, como possa parecer; a distância aos Balcãs é zero porque estamos lá efectivamente e porque é proibido ser espectador passivo de tragédia de autor(es) tão despojados de valores fundamentais. E os realizadores (encenadores), os do terreno e os de fora? Vão aos Estados Unidos ganhar "óscares" no ano 2000?
Sejam quem forem os nomeados, que haja júri capaz de atribuir estatuetas de brasa que queimem (só um bocadinho) as mãos de quem as queira ostentar! Assim, talvez os discursos de circunstância sejam mais sentidos.
A quem servem estas formas de guerra? Sabemos, mas não dizemos alto.
Faz-se a guerra para chegar à Paz? A luta é imperativa, mas os meios e as finalidades têm que ser honestos, no mínimo ...
Defendem-se valores ou acautelam-se interesses?
Para longe as hipocrisias! Para o lixo os presentes atados com nós de veneno!
As políticas, a política, têm que merecer o nome, com dignidade!
Tantos movimentos que o não são verdadeiramente por navegarem em águas com correntes de sentido contrário. Quantos remos se quebram, contra a vontade dos braços que os abraçam solidariamente?
As Leis, as Declarações, as Convenções, as Recomendações, os Tratados, as Plataformas, as Uniões. Quando chega o momento em que os ponteiros do relógio do mundo se posicionam para que sejam observados e cumpridos?
Uma voz cantou em Portugal que "mudam-se os tempos, mudam-se as vontades", não há dúvida de que o mundo é composto de mudança. E a esperança não é só propriedade da criança!
Não deixemos que as crianças chorem mais do que é saudável para o funcionamento das glândulas lacrimais!
Não permitamos que as mães sofram mais dores do que aquelas que resultam, naturalmente de parir!
Dignifiquemos o trabalho (o 1º de Maio acaba de passar) e façamos tudo para que as grandes empregadoras não sejam fábricas de armamento!
No dia em que escrevo este desabafo, em jeito de grito, antes de me sentar à frente do computador ouvi na rádio, como título de notícia, a seguinte frase: " Hoje o sol* descobriu, melhoraram as condições para os bombardeamentos". É horrível, demolidor! E eu que me habituara ao saber do povo que afirma que "o Sol quando nasce é para todos".
Também ouvi, e não me doeu menos, " Mais uma chacina em Timor. Duzentas pessoas foram assassinadas em Liquiçá". Andei por lá. Conheço a terra e conheci as gentes. Fui professora de adolescentes, alguns dos quais, agora adultos sofridos, se calhar, estavam naquela igreja.
Perdoe-se-me a emoção, mas começo a encontrar má definição no monitor do computador. O computador não se comove, mas os olhos embaciam-se de vez em quando.

* O termo foi "céu", mas eu ouvi "sol". As bombas também conspurcam o luar!

Iracema Santos Clara
Escola Dr. Augusto Pires de Lima - Porto


  
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Edição:

N.º 80
Ano 8, Maio 1999

Autoria:

Iracema Santos Clara
Escola E.B. 2/3 Dr. Pires de Lima, Porto
Iracema Santos Clara
Escola E.B. 2/3 Dr. Pires de Lima, Porto

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