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Misteriosa ciência...

A União Europeia, com cerca de 450 milhões de habitantes, produzindo de tudo, não pode viver do que tem? A que propósito vamos pedir dinheiro à China, onde os operários trabalham por 0,8 euros/dia e 800 milhões de pessoas vegetam na total miséria?

No dia 28 de Outubro, foi noticiado que a SAAB – empresa de automóveis sueca – tinha sido adquirida pelas chinesas Pang Da e Youngman pelo valor de 100 milhões de euros. Seria interessante esclarecer estes números. O Estado português já terá “enterrado” 5 mil milhões de euros no Banco Português de Negócios (BPN) e parece querer “investir” mais 12 mil milhões em 2012. Mas só os 5 mil milhões davam para comprar – ao incrível preço a que a empresa sueca foi vendida – qualquer coisa como 50 SAABs… Mas apenas com uma SAAB, Portugal daria um inacreditável salto qualitativo repentino na tecnologia de fabrico automóvel, exportando muito mais do que agora, rapidamente. Na vigência do anterior governo, em seis anos, Portugal comprou duas fragatas semi-novas à Holanda, um patrulhão e dois submarinos, estes últimos à Alemanha. Isto é, cinco navios de guerra, ao inacreditável ritmo de quase um por ano! Como se diz em Trás-os-Montes, a propósito de ladrões, “ninguém vem cá”. É certo: nenhum país nos vai atacar. Depois do desvario que foi a desferroviarização, o abandono da agricultura, das pescas e da pecuária, compramos armamento. Temos uma enorme zona económica exclusiva e Marinha de Guerra, mas não temos barcos de pesca nem pescadores. Depois da loucura que foi o encerramento das escolas técnicas comerciais e industriais após o 25 de Abril de 1974, algo nunca corrigido, temos uma enorme falta de profissionais do chamado “saber fazer”. Passámos à fase de cimentar o território (quanto mais melhor) e vemos autarcas zangados com a altura dos prédios. Se tiverem poucos andares, mesmo que sejam horrendos esteticamente ou em termos de qualidade de construção, são “bons” porque ocupam espaço. E os terrenos valorizavam-se imenso na passagem de agrícolas a urbanizáveis. Agora estamos no fim da linha.
Portugal é uma pequena economia aberta sem moeda própria. Pior seria difícil. Não podemos controlar o preço do que importamos, porque não aplicamos taxas alfandegárias e, ainda por cima, não temos nada a dizer sobre o valor da moeda que usamos, o Euro. Sempre que a moeda sobe de valor, o que produzimos fica mais caro (mais difícil de exportar) e o que importamos fica mais barato. No meio deste absurdo, Madame Merkel quer um Euro forte. A Economia será uma ciência, mas anda parecida com o Direito, outra ciência que existe com pareceres e difere de lugar para lugar. Face a uma desesperante falta de meios de pagamento (moeda), Madame Merkel acha que o Banco Central Europeu não deve fazer mais Euros – a “solução” merkeliana é a Europa, ajoelhada, pedir Euros à China! Isto é ridículo, absurdo e parece confirmar que Madame Merkel não sabe bem o que faz, embora pareça que quer punir os países do sul da Europa (vulgo PIGS) pelas suas faltas morais! Madame Merkel, a senhora, que veio da Alemanha Oriental, nunca terá ido até às imediações de Cracóvia, ver o campo de extermínio de Auschwitz-Birkenau? Quem pode dar lições de moral? A Alemanha?...
A União Europeia, a maior economia do Mundo, com cerca de 450 milhões de habitantes, produzindo de tudo, não pode viver do que tem? A que propósito vamos pedir dinheiro à China, onde os operários trabalham por 0,8 euros/dia e 800 milhões de pessoas vegetam na total miséria – pior do que a das cidades – nos campos? Não há quem explique por que razão teremos de alimentar esta rapina. Quando todos os europeus não tiverem acesso à saúde, nem aposentações, trabalharem até rebentar e consumirem produtos sem qualidade, teremos todos AAA das agências de rating. Mas o europeu médio de hoje não é propriamente “alienado”. Os docentes e os sistemas educativos fizeram algo profundo a esse nível. As pessoas entendem o que lhes fazem, mas têm medo, estão endividadas (mesmo que, como eu, nunca tenham vivido acima das suas possibilidades), temem o poder e o futuro incerto. Vão-se calando. Misteriosa ciência nos guia a caminho de lado nenhum… 

Carlos Mota


  
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Edição:

Edição N.º 195, série II
Inverno 2011

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