O cotidiano escolar permite encontros entre diferentes sujeitos e conhecimentos, porém, fomentar o diálogo como articulador do processo pedagógico não tem sido fácil, apesar dos discursos correntes, elogiosos à reflexão e à construção do conhecimento. As práticas estão marcadas pela cultura do silêncio, ignorando que aprendizagem demanda encontro com outro. A Escola Pública torna-se um lugar significativo na experiência dos sujeitos subalternos que se hibridizam em seu movimento de adaptação e resistência às expectativas do outro, em seu esforço para identificar-se com o discurso hegemônico e nele adquirir sentido. Porém, a hibridação e a ambivalência, presentes no discurso subalterno, atuam no sentido de que a conformação ao discurso do outro seja matizada pelo desacordo quieto, estranho, velado, produzindo alguma deformação, nem sempre compreensível, mas freqüentemente sentida: uma rasura, uma inconformidade. O discurso hegemônico de inclusão e tolerância mantém a perspectiva de negação da diferença, buscando enquadrá-la num dos diversos espaços instituídos no projeto de sociedade unívoco. Assim, a tensão, o silêncio e a invisibilidade tecem o cotidiano escolar, fazendo do diálogo um desafio constante. O compromisso com uma Escola capaz de trabalhar com a diferença, e não somente de trabalhar para segregá-la nos lugares predefinidos para a diversidade, requer que o processo pedagógico se articule pela possibilidade de reconstrução, com os estudantes, dos significados e condutas compartilhados, estimulando o intercâmbio entre os muitos significados socialmente produzidos, suas formas de organização do pensamento e da ação e a reflexão sobre as experiências, individual e coletiva. Esse encontro entre diferentes e com as diferenças traz a destruição como movimento necessário à produção de relações que viabilizem a criação e a aprendizagem, evidenciando processos em curso em muitas salas de aula. O estímulo a experiências democráticas de aprendizagem demanda destruição para favorecer o diálogo. Ressalto a necessidade de problematizar a harmonia que parece percorrer a idéia de construção e expor a Escola como um espaço de destruição, sublinhando suas dimensões caótica, conflituosa, divergente, que abrem para o novo, o insuspeitado, talvez o inédito viável. Destruição é aqui apreendida em sua ambivalência: a destruição dos percursos dos estudantes, pela manutenção de práticas incompatíveis com suas necessidades, e a destruição de práticas consolidadas, viabilizando a produção de trajetos mais favoráveis a aprendizagem dos que vêm fracassando na Escola. Destruição que, ao negar, exige e viabiliza novas produções, não o abandono e o vazio. É preciso destruir as concepções correntes que fazem da diferença na aprendizagem uma dificuldade de aprendizagem. A (não) aprendizagem é parte de um processo complexo e pode ser transformada pelas relações estabelecidas; a mudança da perspectiva que encaminha o processo pedagógico pode articular novas possibilidades. Para aprofundar os processos de transformação dos sentidos excludentes que a escolarização assume, precisamos direcionar nossos olhares para as margens escolares e sociais, pois nelas encontramos processos coletivos de luta e conquista de direitos e de produção de modos singulares de vida, muitas vezes a partir da própria destruição. As margens enunciam outras histórias, outros abismos e delas se estendem outras pontes, que não buscam reduzir a intensidade e visibilidade dos confrontos que se estabelecem como conseqüência dos encontros nem sempre harmoniosos dos diferentes projetos, culturas, sujeitos, processos, limites, demandas e possibilidades. Das margens do processo pedagógico, em sua opacidade, surge a necessidade de transformá-lo e em suas fronteiras vão sendo tecidas novas possibilidades. A posição marginal se mostra fundamental para a articulação de novas relações escolares como parte de novas relações humanas.
Maria Teresa Esteban
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