Página  >  Edições  >  Edição N.º 185, série II  >  Eastwood, Obama & Cª

Eastwood, Obama & Cª

Clint Eastwood está de volta, atrás e em frente à câmara, com um filme de extrema violência simbólica e ao mesmo tempo de um humor inesperado. Gran Torino marca um início de ano cinematográfico assinalado por um desfile impressionante de stars americanas nos ecrãs portugueses: Brad Pitt, Mickey Rourke, Tom Cruise, … coincidente com o momento em que outra star americana invade os pequenos ecrãs de todo o mundo, Barack Obama.
E fá-lo no fim de uma série de actos simbólicos como o de (re)percorrer uma a uma as grandes etapas da carreira de Abraham Lincoln, (re)dando uma função política maior e um peso de  compromisso moral esquecido ao uso das palavras, escritas  e ditas em  público. Não se trata da mesma coisa, mas a aproximação não é assim tão artificial, porque aqui como lá, joga-se a velha questão da encarnação. Num cinema hiper espectacular, saturado de efeitos especiais numéricos como num sistema político, ele também espectacular e enfeudado ao marketing comunicacional hightech, revela-se indispensável que haja um momento em que “se é alguém”. Uma presença carnal do real e do imaginário humano. Um corpo, um rosto, uma voz, inscritos num passado e num presente: poderíamos chamar a isso cinema (e não o cinema).
Trata-se aqui essencialmente da presença masculina, que poderia trazer outras reflexões, mais ou menos significativas, como a idade, às alterações do corpo que se manifestam na sucessão de cabeças de cartaz. A esse respeito, o filme de Eastwood e o de Fincher (A incrível história de Benjamin Button) estão mais próximos do que se opõem. O primeiro faz da sua presença, umas vezes divertida outras trágica, toda uma história que é simultaneamente a dos Estados Unidos, a do cinema americano e a da sua própria filmografia. O segundo faz do corpo de Brad Pitt, com o recurso a inumeráveis efeitos virtuais e materiais, o palimpsesto onde se inscreve a passagem do tempo que se desenrola ao contrário - e é de novo uma história do seu país, e do cinema de Hollywood. Do mesmo modo que o corpo martirizado de Mickey Rourke, exibido em Wrestler, e as certezas de Tom Cruise em Walkyrie, são ainda e sempre parte duma presença abstracta e sobre-humana (a star) que tenta de novo voltar à ribalta.
Clint, Brad, Mickey, Tom … Barack: impressionante, esta omnipresença dos USA, na actualidade real e na realidade das estreias.
Em resumo, não basta dizer que o cinema vai bem. É preciso também dizer que está a trabalhar bem.

P.S. Atenção especial ao Curtas de Vila do Conde deste ano: entre outras, a pérola de  Murnau Tabu (1931) com música ao vivo de Paulo Furtado (Legendary Tiger Man).

Paulo Teixeira de Sousa


  
Ficha do Artigo
Imprimir Abrir como PDF

Edição:

Edição N.º 185, série II
Verão 2009

Autoria:

Paulo Teixeira de Sousa
Escola Secundária Especializada de Ensino Artístico de Soares dos Reis, Porto
Paulo Teixeira de Sousa
Escola Secundária Especializada de Ensino Artístico de Soares dos Reis, Porto

Partilhar nas redes sociais:

|


Publicidade


Voltar ao Topo