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Mais um alerta (2ª parte)

Com a entrada do ano 2008, já vamos no sétimo mês, o avanço tecnológico, o desenvolvimento e o progresso não poderão ser encarados como "entidades míticas", como o "bezerro de ouro" ou como um-fim-em-si-mesmo, pois degenerarão em retrocesso e destruição à escala planetária. Desenvolvimento e progresso não deverão ser exponenciais, nem podem ser, visto que por todo o lado, a natureza e o meio ambiente revela, assustadoramente, a marca exaurível e poluidora do bicho Homem. Que já se estende aos pólos e aos animais que nele habitam. A capacidade regenerativa e a resiliência do planeta têm limites. Ao contrário do que pensa J.L Lovelock, cientista colaborador da NASA, especialista em cromatografia gasosa, o planeta Terra, segundo outros cientistas, não funciona assim tanto como um organismo único que define e mantém as condições necessárias à sua própria sobrevivência. Essas condições pressupõem uma tendência para optimizar as condições de toda a vida terrestre desde que não tenhamos interferido, séria e negativamente, com a sua capacidade de optimização, de regeneração.
Na verdade, o que tem acontecido é que o ser humano vem interferindo de uma forma perfeitamente irresponsável e ameaçadora com essa capacidade de optimização do planeta Terra. As agressões têm sido várias e crescentes ao nível dos desastres ecológicos, ao nível da acumulação de lixo mortífero (caso dos resíduos nucleares), do esgotamento dos recursos naturais, da poluição dos solos e das águas...
Esta crise evolucionária em que está mergulhado o planeta Terra e, por consequência, todos nós, seus habitantes, já fora detectada por Buckminster Fuller, considerado o "Leonard da Vinci do nosso tempo", que tem alertado para a necessidade de ser imperioso para a humanidade abandonar os seus pressupostos políticos, económicos e sociais e despertar para uma consciência planetária da totalidade da Terra, dos seus recursos e dos seus habitantes.
Que futuro, então, para o desenvolvimento tecnológico, para o progresso e para o desenvolvimento? Segundo Hubert Reeves será necessário coexistir, e coexistir pressupõe que, aquilo a que chamamos um desenvolvimento durável, deverá corresponder a um crescimento zero, isto, para no futuro dispormos de condições de habitabilidade no nosso planeta. Crescimento zero que nenhum governante de qualquer país deseja (sob pena de se pôr em causa o "bezerro de ouro" que é o progresso desenfreado e o crescimento a vários níveis que permitem a sustentabilidade das indústrias e dos empregos nos diversos sectores).
E isto porquê? Porque - ainda segundo Reeves - todos se vangloriam de ter crescimento de dois e três por cento.
A inventividade tecnológica que anda "pari passu" com o progresso e desenvolvimento, sustentados estes pela extracção incondicionada e rapace dos recursos naturais, a que se junta a crescente poluição do ar, dos terrenos, dos mares e dos rios,
Acabarão - se não houver alguma moderação e se, entretanto, não forem "inventadas" ( e usadas) energias alternativas não poluidoras -, por conduzir à inevitável catástrofe.
Isso no-lo diz Reeves, sinteticamente, no início deste artigo, que achei por bem mencionar.
Com a perspectiva nada radiosa de chegarmos a esta preocupante situação, poderemos interrogar-nos: de que serve o desenvolvimento e o progresso se, a curto prazo, a Humanidade e o planeta correm perigo? Os políticos, ao ouvirem Hubert Reeves, provavelmente dirão que os cientistas são demasiado catastrofistas e assobiarão para o lado. Não é nada com eles. O que querem é a possibilidade de serem eleitos pelo povo e, no fim de contas, a maioria dos cientistas não passam de uns "loucos" e "maníacos" que gostam de "pintar" cenários.
Todavia, entre as afirmações judiciosas e sagazes de Reeves e a tagarelice irresponsável e perorante da maioria dos políticos, a que se adiciona o seu desenfreado oportunismo e Demagogia - quer os da nossa praça, quer de outros a nível mundial -, eu prefiro, expectantemente, escutar Reeves.
Porque, na realidade, o planeta não é imarcescível.
E há gerações futuras que ainda esperam (e desejam) viver nele.
Mesmo que a vida seja um sonho breve relativamente à imensidão do tempo geológico e cósmico.

António Cândido Miguéis


  
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Edição:

N.º 181
Ano 17, Agosto/Setembro 2008

Autoria:

António Cândido Miguéis
Professor
António Cândido Miguéis
Professor

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