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A repressão na escola?

A propósito das recentes imagens de indisciplina em contexto de sala de aula, têm sido muitos os comentários e as propostas de resolução do problema. Algumas são manifestamente preocupantes, pois revelam uma mentalidade aprioristicamente vingativa e equivocamente correctora de comportamentos. A humilhação, como castigo, nunca dará bons resultados porque só inculcará no jovem mais confusão de sentimentos a desembocar, inevitavelmente, em violência, podendo vir a repercutir-se esta, posteriormente, na sociedade, em contexto de marginalidade. Transformar um episódio de indisciplina - inegavelmente violento e merecedor de acção disciplinar determinada e destituída de ambiguidade - num caso de polícia, desvirtua o sistema escolar e menospreza a capacidade de resolução dos problemas por parte da comunidade educativa.
Chamem-lhe o que quiser, eduquês, facilitismo, benevolência, mas responder à indisciplina com medidas punitivas e exemplares parece-me fazer recuar o ensino aos tempos em que os nossos avós, com as mãos gelados, eram sujeitos à tortura das reguadas na ponta das unhas, aplicadas pelo professor que, pelos vistos, grande parte dos disciplinadores de ocasião, consideram modelar e ideal. Se recuarmos mais um pouco, regressamos à discriminação nas salas de aula por género, por capacidades, quando se agarravam com cordas os alunos mais irrequietos e se fechavam no quarto escuro os mais rebeldes.
O exagero de algumas posições é reflexo de uma sociedade indolente no pensar, julgando que o melhor caminho é aquele aparentemente mais fácil e mais barato: a repressão. Porque isto de reabilitação com dignidade é coisa dos anos sessenta e setenta, ideias dos tais roussianos que acreditam ingenuamente que as crianças são seres inatamente bons e não enxergam a crueldade e a canalhice dos miúdos. No fundo, é uma ideologia que se afirma, reaccionária na sua essência, privilegiando o autoritarismo inconsequente e, em última análise, o ostracismo e o estigma.
Não se pensa o social porque este já não parece explicar nada. Como se a sociedade de mercado, capitalista, não deturpasse o pensamento crítico e auto-reflexivo, transversalmente a toda a sociedade, seja nos estratos sócio-económicos mais baixos, seja nos restantes! Como a classe média não estivesse igualmente, a sofrer desse vírus cego de nome capital, em que o lucro aliado ao prazer fácil não fossem o suporte de todo o sistema capitalista! E, finalmente, como se não houvesse em toda esta situação, um complexo de casta, em que os supostos detentores da sabedoria e dos referenciais valorativos do comportamento não estivessem, também eles, a defenderem o seu elevado patamar social e económico, ditando leis e dando lições de moral para os pobres coitados a quem deitam umas migalhas desse prazer luxuoso e caro que desfrutam!

Paulo Frederico F. Gonçalves


  
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Edição:

N.º 178
Ano 17, Maio 2008

Autoria:

Paulo Frederico F. Gonçalves
Professor, Porto
Paulo Frederico F. Gonçalves
Professor, Porto

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