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Licitamente, eu consumo

No mês passado, abordámos neste espaço projectos de saúde escolar relacionados com a prevenção de consumo de drogas lícitas, mais precisamente o tabaco. Foi defendida a estratégia integrada de projectos que abrangessem mais do que uma droga lícita, nomeadamente o álcool e os medicamentos.
Quanto ao álcool, em Portugal, a prevalência de consumo regular no sexo feminino é de 4,2% aos 13 anos e 11% aos 15 anos, sendo nos rapazes, respectivamente, de 13,1% e 20,5%. O padrão de consumo do álcool tem-se alterado nos últimos anos, com um aumento do binge drinking e do consumo das bebidas destiladas em detrimento da cerveja.
No que se refere aos medicamentos consumidos sem prescrição médica, a sua prevalência é de 3,3% no grupo etário entre os 15 e os 24 anos. Esta utilização não vigiada, generalizada na população, requer uma especial atenção nas faixas etárias mais novas devido à tendência para um aumento deste tipo de consumo ao longo da vida e à sua persistência.
A estratégia integrada de projectos de saúde escolar não é sinónima dos mesmos serem desenvolvidos simultaneamente. Algumas correntes académicas defendem dispersá-los ao longo do ciclo de desenvolvimento, tendo em atenção os dados estatísticos, nomeadamente os de prevalência de consumos. Nesse sentido, faria sentido abordar o tabaco entre o 6º e 7º ano e o álcool entre o 7º e 9º ano, utilizando as etapas de transição como períodos críticos de optimização de intervenções.
Por outro lado, se toda a comunidade escolar for integrada no programa, além dos alunos, é alcançada uma franja significativa da população, desde os professores aos auxiliares de acção educativa, famílias e outros membros da comunidade, de uma forma consistente ao longo de diversos anos e em estágios de desenvolvimento fulcrais, onde estes comportamentos muitas vezes têm início, como é o caso da adolescência. Por outro lado, as escolas, ao estabelecer e aplicar políticas de modo a criar um ambiente protector, promovem uma perspectiva macro de vida saudável, fazendo a ponte com a comunidade e introduzindo informação e estratégias de prevenção do uso de substâncias. A prevenção de substâncias realizada nas escolas é, deste modo, uma peça fulcral nos esforços de redução das consequências negativas do abuso de substâncias para a sociedade. Mais uma vez, a escola revela ter um papel fundamental enquanto garante que os jovens desenvolvem conhecimentos, atitudes e competências para realizarem escolhas promotoras da saúde.
Curiosamente, os próprios programas de prevenção de consumo de drogas lícitas têm obtido alguns resultados paralelos não desprezíveis, ligados à promoção de normas sociais que contrariam o uso de substâncias, permitindo aumentar a efectividade de outras medidas preventivas, como a proibição de fumar em locais fechados devido à exposição ao fumo ambiental ou as campanhas nos media, potenciando o seu efeito.
Por fim, saliente-se que os programas de promoção da saúde mental devem anteceder os programas preventivos relacionados com o uso de qualquer substância, ocorrendo desde o jardim-de-infância e ao longo do 1º ciclo, de forma a garantir o desenvolvimento normal e saudável de cada criança. Atente-se que não se devem confundir com a prevenção em si, apesar de colaborarem para tal e se poderem e deverem estender a faixas etárias mais avançadas, onde se desenvolvem já programas de prevenção.

Nuno Pereira de Sousa


  
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Edição:

N.º 176
Ano 17, Março 2008

Autoria:

Nuno Pereira de Sousa
Médico de Saúde Pública
Nuno Pereira de Sousa
Médico de Saúde Pública

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