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O cotidiano da escola, um espaço in/completo para a cidadania?

A experiência do grêmio escolar, um espaço de participação e representação dos alunos, do Colégio Estadual Fernando Magalhães, situado em Jurujuba, um bairro de pescadores de Niterói, no Rio de Janeiro, pode ajudar-nos a pensar em cidadania.
Buscando aproximar-me das formas de cidadania e experiências de participação política em que esses alunos estão imersos, em 2005, assisti a uma assembléia do bairro. A questão que unia os presentes era a apropriação indevida, por um novo morador, de uma parte da praia. Por ter uma condição econômica superior à grande maioria, este cidadão sentiu-se no direito de "alargar seu território", comprometendo a pesca local, um dos únicos meios de sobrevivência dos pescadores. Estive presente, desde a chegada dos moradores, até a votação do que deveria ser feito a propósito do fato. Participavam homens, mulheres e alunos do colégio Fernando Magalhães. Depois de acalorada discussão, decidiram resolver o caso pela intimidação do indivíduo. Em 2006 presenciei a eleição do grêmio escolar desse colégio. O processo de reflexão desse grupo de alunos remeteu-me à participação da comunidade dos pescadores, ao defenderem seus direitos. Percebi, na ocasião, a atitude dos alunos como potencial para uma ruptura com o tradicionalismo na escola, com a criação de novas regras, sem que se deixe de agir com "responsabilidade", a principal preocupação da diretora. Percebi, também, que a constituição das chapas e a discussão das propostas favorecem o diálogo nos diferentes espaçostempos e situações da escola, e para além desta. Oportuniza, ainda, a construção de subjetividades democráticas, num enredamento com base no diálogo, a partir de relações mais horizontais, para não incentivar a formação de subjetividades "esquizofrênicas", que se encaminham na direção contrária ao da autoridade partilhada (Santos 2003), preconizada no "pátio da escola" e na vida cotidiana dos alunos.
Ao encontrar espaço, não só na, mas também através da escola, para o exercício de novas formas de cidadania ? incluída aí a ampliação das possibilidades de diálogo ?, encaminhamo-nos para o que Santos (1991) denomina repolitização global da prática social.
Esse movimento em busca dos diálogos possíveis com os alunos do grêmio vem permitindo ampliar a compreensão de como se dá, de fato, no processo democrático, o entrelaçamento da vida escolar com a formação cidadã, que envolve a participação em outros espaços sociais de interação.

Fazem parte desse diálogo:
SANTOS, Boaventura de Sousa. Pela mão de Alice: o social e o político na pós-modernidade. São Paulo: Cortez, 2003.
________. Subjectividade, Cidadania e Emancipação. Revista Crítica de Ciências Sociais, n.32. Coimbra: CES, p.170-187, jun. 1991.


  
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Edição:

N.º 172
Ano 16, Novembro 2007

Autoria:

Clarissa Bastos Craveiro
Programa de Pós-graduaçao em Educaçao (UERJ)
Clarissa Bastos Craveiro
Programa de Pós-graduaçao em Educaçao (UERJ)

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