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Os partidos e o sistema partidário português
Assiste-se hoje a uma intensa campanha contra o sistema partidário saído da Revolução de Abril.
Intencionalmente ou não confunde-se o sistema partidário com a actuação dos partidos políticos. Devido à actuação dos partidos políticos que têm governado o país há restrições às liberdades democráticas. Como exemplo podemos ver a lei dos partidos políticos, aprovada pelo PS e pelo PSD, onde são impostas por estes partidos normas de funcionamento interno a todos os outros. Imagine-se o que seria se, por hipótese, fosse o PCP a sugerir uma lei para o funcionamento de todos os outros partidos. Neste aspecto, há que reconhecer que o PCP sempre defendeu que cada organização partidária, pelas suas características e pela sua história, é que deve procurar a melhor maneira de se estruturar, de eleger os seus dirigentes, sejam eles locais, regionais ou nacionais.
A chamada crise do sistema partidário é artificial. Ela foi criada e é alimentada de modo a ajudar a perpetuar no poder o mesmo bloco de interesses. Durante muitos anos estes foram representados pelo regime existente antes do 25 de Abril, uma ditadura fascista, e hoje representados e defendidos pelo conjunto PS/PSD/PP. Houve apenas as mudanças necessárias que a própria evolução impôs.
A grande diferença nas opções sociais e na seriedade política vem do PCP, o que não significa que esteja isento de erros. Assim, por exemplo, para Portugal, o PCP sempre defendeu a liberdade de formação de partidos políticos, sempre defendeu a liberdade religiosa respeitando igualmente todas as opções de crença, mas não soube demarcar-se das opções e dos erros existentes nos antigos países socialistas.
Perante o ruir da URSS e seus aliados e a desagregação de numerosos partidos comunistas, o PCP, mantendo as suas características de classe, é uma referência para os povos do mundo na sua luta pela liberdade e independência nacional contra o imperialismo.
Confundir a falha de uma experiência com a falsidade de uma teoria é uma atitude cientificamente incorrecta, como também foi incorrecta a atitude de tomar o êxito de uma experiência como confirmação de uma teoria.
Muito conseguiu a humanidade com a experiência socialista na Rússia. Muitas das regalias sociais e dos direitos dos cidadãos, enquanto trabalhadores, foram possíveis graças ao triunfo da Revolução Bolchevique. Aliás, quando o imperialismo derrotou a URSS, os direitos sociais e laborais começaram a ser contestados e limitados em todo o mundo capitalista.
A necessidade de propagandear uma crise do sistema partidário anda a par com a necessidade de apresentar algumas diferenças de forma como sendo profundas diferenças de conteúdo, marginalizando aqueles que realmente podem ser alternativa, por apresentarem verdadeiramente diferenças de conteúdo. Tal só é possível impondo o pensamento único, onde o capitalismo é a única solução global para a humanidade e os diferentes países devem procurar as melhores soluções deste enquadramento. Nesta perspectiva surgem as campanhas à modernização e salvação dos partidos comunistas. Ainda antes do desmembramento da URSS foi o euro-comunismo, principalmente, com os partidos comunistas de Itália, França e Espanha. O resultado está à vista. Tinham, nos respectivos países, uma implantação eleitoral superior à do Partido Comunista Português. Em Itália e Espanha dissolveram-se e em França é quase insignificante. Neste período, como hoje, o combate ideológico é intenso e a chamada crise do sistema partidário insere-se nesse combate.
A campanha anti-partidos tanto aparece com o "eles são todos iguais", perpetuando quem está no poder, ou sugerindo que todos os partidos são "ramos do mesmo tronco". O mesmo tronco implica as mesmas raízes. Ora, aí está a diferença. As raízes do bloco PS/PSD/PP são as mesmas. As do PCP são diferentes. Se não fossem, o PCP não resistia como resiste, nem tinha conseguido combater a ditadura fascista como o fez. O PCP formou-se em Portugal em 1921. Nessa altura havia muitos partidos políticos e com mais meios humanos e financeiros que o PCP, mas foi o PCP que resistiu a todo o período da ditadura, e foram 48 anos. O PS formou-se em 1973 e na Alemanha, o PSD e o CDS (depois PP) apenas depois do 25 de Abril, até porque muitos dos seus fundadores faziam parte de órgãos dirigentes do fascismo.
Apesar de controlar a generalidade dos órgãos de comunicação social, o capitalismo português, historicamente submisso ao capital estrangeiro, ainda se sente incomodado pela diferença e peso eleitoral do PCP. Assim os seus partidos preparam-se para alterar as leis eleitorais para a Assembleia da República e para os órgãos de poder local. Por exemplo, nas recentes eleições para a Câmara de Lisboa, o PS que obteve 30% dos votos, teria 100% da Câmara!
O sistema partidário saído da Revolução de Abril tem muitas potencialidades. Houve governos de maioria relativa (do PS e do PSD), houve governos de coligação (PS/CDS, PS/PSD, PSD/CDS/PPM, PSD/PP), houve governos de iniciativa presidencial (Nobre da Costa, Maria de Lurdes Pintassilgo), houve governos de maioria absoluta ( do PSD, do PS). O sistema partidário permite a formação de coligações pré ou pós eleitorais (AD, FRS, FEPU/APU/CDU), permite a formação de novos grupos parlamentares (PRD, BE).
Defender o sistema partidário saído da Revolução de Abril, respeitar o regime democrático e as amplas liberdades do cidadão é condição necessária para o desenvolvimento económico, social e cultural do país.

  
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Edição:

N.º 171
Ano 16, Outubro 2007

Autoria:

Paulo Morgado
Professor na Escola Secundária de São Pedro da Cova
Paulo Morgado
Professor na Escola Secundária de São Pedro da Cova

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