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Da diversidade à igualdade de oportunidades

Construir pontes em educação 

Em «o canto do pássaro», Anthony de Mello conta-nos a história da pequena águia que havia nascido no meio dos pintainhos e, como eles, aprendeu a depenicar na terra, a bater as asas... Embora por vezes lhe parecesse que também poderia voar alto como as majestosas águias que cruzavam os céus, morreu convencida de que não tinha nascido para as alturas.
Esta é uma belíssima história carregada de emotividade, mas sobretudo, um desafio a todos os professores que lutam pelo direito à igualdade de acesso ao conhecimento, independentemente da raça, cultura, condição social ou religião. Um desafio que irrompe e ao qual urge responder para melhorar a qualidade da educação, apesar dos obstáculos que se firmam no terreno ou provenientes do «destrambelhado edifício do sistema educativo» (Urbano, 2006). Dêmos asas de águia às nossas crianças e ensinemos-lhes a voar para lugares longínquos!
Como disse Fernando Pessoa "Quem quer passar além do Bojador tem que passar além da dor". Digamos que há sempre um Cabo das Tormentas a enfrentar para que o caminho se cumpra. Aqui está presente uma ideia que achamos premente recuperar no contexto educativo: a ideia de esforço. Quantas vezes a nossa preocupação desmedida, pelo medo de ser julgado, o peso da avaliação, a crítica?também nos fez ver monstros imponentes e intransponíveis no lugar de altos rochedos? Pouco importa?é inalterável o passado, mas não a história dos nossos alunos, esta escreve-se com o presente. Importa, por isso, valorizar o esforço para alcançar a meta. Façamo-lo do modo que entendermos mais adequado para cada tempo e situação, mas ensinando os nossos alunos a saborear o encanto do caminho, o presente, ajudando-os a aliviar o esforço da subida. Como na aventura educativa relatada no livro «O elogio da transmissão» de Steiner e Ladjali (2005). Ladjali é professora numa escola suburbana e multiétnica de Paris. Apesar de respeitar o direito às diferenças culturais, étnicas, sociais?ela faz submergir um valor maior, o direito à igualdade de oportunidades na procura do saber, mesmo quando se trata de alunos socialmente desfavorecidos. Parece razoável, mas não é um assunto pacífico. Tratando-se de populações da periferia, pobres, seria mais comum evocar o relativismo cultural e a contextualização das aprendizagens no grupo social. Era bem menos exigente e comum, mas decidiu trabalhar contra a corrente. Segundo ela, o trabalho do professor é mesmo esse e tem um preço: «Tudo o que é excelente é muito difícil?» (Steiner e Ladjali, 2005, 43). E fê-lo por convicção de que «Os alunos merecem tudo, salvo a indiferença» (49). É magnífico o trabalho realizado por esta professora com alunos dos quais pouco se esperava. Não podemos aqui descrevê-lo, mas remetemos para esta fascinante leitura.
Temos de perceber que o saber é fundamental e o saber erudito não é substituível por testonovelas, pelo saber popular (este já os alunos trazem de casa; para quê aprendê-lo?). Há que respeitar a condição do aluno mas não ensinar-lhes de acordo com ela. Isso iria acentuar ainda mais as desigualdades de oportunidades se, por exemplo, fossem desenhados curricula para meninos de bairros de elite e curricula para meninos de bairros desfavorecidos. Aplicar à letra esta medida, como preconiza Damião e Festas (2006), poderá criar situações de grande injustiça acentuando as desigualdades sociais, pois, virtualmente, poder-se-á estar a impedir que algumas crianças cheguem a determinadas aprendizagens de carácter mais erudito que, apesar de não estarem de acordo com a sua condição de nascença, podem ser a sua "vocação".
Cabe-nos esse papel anónimo e insubstituível: (1) proporcionar aos nossos alunos que a escola deixe marcas de prazer em aprender, despertando neles o impulso da curiosidade, de se transcender; (2) cultivar o elogio do conhecimento pelo esforço. Não que seja mau ou desprezível ser galinha e nem todos conseguirão aprender a voar como águias, mas porque temos o dever de ensinar a voar com perfeição a todos, mesmo àqueles a quem a vida não lhes sorriu à nascença? porque eles também têm esse direito ? o direito à igualdade! Quero acreditar como Paulo Freire nesta expressão de amor universal ? justiça. Ele sabia bem a importância que o ler e escrever têm para a modificação do ser humano, para a libertação da sua condição social e económica.
Termino com uma frase de Plutarco que tudo diz acerca desta questão: "Se aprender é fazer nascer, impedir de aprender é matar".

Bibliografia

  • Damião, H. & Festas, I. (2006). Contextualização e relativização das opções curriculares: impacto nas (des)igualdades de oportunidades, Braga: UM.
  • Mello, A. (1995). O canto do pássaro, Lisboa: Paulinas.
    Steinar, G. & Ladjali, C. (2005). O elogio da transmissão, Lisboa: D. Quixote.

  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 168
Ano 16, Junho 2007

Autoria:

Fátima Linguiça
Mestre em Ciências da Educação. Prof. EBI do Carregado
Fátima Linguiça
Mestre em Ciências da Educação. Prof. EBI do Carregado

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