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Voluntariado, ensino ou aprendizagem?

Vivemos numa sociedade capitalista que apela ao consumo e valoriza o material.
Emergem, paralelamente associações que dizem expressamente querer dar resposta a problemas que o Estado, só por si, não tem capacidade de resolução.
O voluntariado afirma-se assim também como que contra a corrente numa sociedade assente em valores materiais e económicos.
Mas não deixamos de estar a viver num mundo de contradições e esta é mais uma:
Diz-se que o Associativismo está em crise, mas o apelo ao voluntariado e a emergência do mesmo é cada vez maior, mais discutido e considerado vital, em projectos de desenvolvimento local, em experiências de luta contra a pobreza e exclusão social, seja em Portugal, em África e muitas vezes em países ditos sub desenvolvidos.
Este movimento, quer de convite quer de adesão espontânea, aglutina cada vez mais jovens e não apenas adultos desencantados com os problemas decorrentes da modernidade.
Como se explica isto?
O que faz com que um jovem se tire do calor do lar e decida a ter uma experiência de voluntariado, muitas vezes num estrangeiro distante e inóspito? Estará a educação escolar e não escolar na base deste altruísmo? De que modo?
O senso comum encontra explicação muitas vezes no carácter missionário e religioso de algumas pessoas. Claro que uma religião, como a católica, que tem forte peso na sociedade portuguesa, apela aos valores da caridade, solidariedade, bem comum? e esses valores fazem parte do quadro de referências de muitas pessoas não praticantes dessa religião, o que mostra que, para além do valor teológico da mensagem e da prática do ritual religioso, esses valores são transmitidos e assimilados de uma forma cultural.
Estamos, assim, perto da incorporação de um habitus, no dizer de Pierre Bourdieu (1980), que actua aqui como uma gramática de atitudes na ajuda ao próximo.
Mas não vamos cair num determinismo e dizer que os voluntários o são porque incorporaram valores duma sociedade eminentemente católica. Há até voluntários que se dizem agnósticos e mesmo ateus.
Como explicar isto?
Que processos levam à construção de um habitus de voluntariado? Espero explorar esta dimensão num texto próximo.
Provavelmente, estaremos mais perante um processo de aprendizagem do que de ensino, como refere Ricardo Vieira (2006), de forma estruturalmente semelhante, para o modo de ser professor.
Aprende-se a ser voluntário!
Mas como se ensina? Poderemos ensinar a ser voluntário?
Como? Como explicar isto? E agora Professor?

Referências Bibliográficas

  • BOURDIEU, Pierre (1980). Le Sens Pratique, Paris: Minuit.
  • VIEIRA, Ricardo (2006). "Da Construção da Identidade Profissional do Professor", in MUNHOZ, A. FELDENS, D.
  • SCHCK, R. (2006). Aproximações sobre o Sujeito Moderno: Traçando Algumas Linhas, Lajeado, RS: UNIVATES.

  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 168
Ano 16, Junho 2007

Autoria:

Cristóvão Margarido
Assistente Social. Docente da Escola Superior de Educação de Leiria, ESE-IPLeiria
Cristóvão Margarido
Assistente Social. Docente da Escola Superior de Educação de Leiria, ESE-IPLeiria

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