Página  >  Edições  >  N.º 159  >  Socialização no cinema

Socialização no cinema

Cinema

Muitos debates são realizados tendo em vista a utilidade do cinema no processo educacional, principalmente como recurso didático-pedagógico. No entanto, não se discute com a mesma intensidade a questão da educação no cinema, isto é, a reprodução fílmica da educação. Esta questão pode ser vista sob duas formas diferentes, uma sob o prisma de como o cinema retrata o processo de educação formal, a educação escolar; outra sob o prisma mais amplo de como o cinema retrata o processo de socialização, a educação não formal.
É a este segundo caso que dedicaremos o presente texto. Desde os filmes sobre ?meninos lobos? e Tarzan, passando por O Enigma de Kaspar Hauser, Nell, entre outros, temos esta temática como recorrente. Pode o ser humano ser socializado sem relações sociais com outros seres humanos? A resposta é óbvia: não. É isto que se pode ver no cinema? Nem sempre. Tarzan, por exemplo, possui o domínio da linguagem e carrega outros atributos, que só são possíveis através da socialização, sem ter passado por ela.
O desenvolvimento da fala só é possível através de um longo processo de prática que tem sua formação e sentido através das relações sociais. O treino na fala desde a infância promove uma habilidade que dificilmente alguém conseguiria adquirir a partir de certa idade. Claro que Tarzan é uma ficção. O Garoto Selvagem, de François Truffaut é baseado em fatos reais, bem como O Enigma de Kaspar Hauser, de Werner Herzog. Embora seja possível questionar a veracidade dos fatos que deram base aos dois filmes, é possível dizer que o filme de Truffaut apresenta uma visão realista da criança que não passa pelo processo de socialização e sua concretização em um período posterior à infância e tendo por base um passado marcado pela falta de socialização e relações sociais, criando uma quase impossibilidade de reverter a formação inicial.
O filme de Werner Herzog já aponta para as dificuldades de um indivíduo criado isoladamente se adequar à vida social depois de adulto. O filme Nell, dirigido por Michael Apted, apresenta uma mulher que viveu parte de sua vida isolada e o passado sendo a única ponte entre ela e as pessoas que a contactaram, buscando resgatar os elementos de socialização anteriores para reintegrá-la na sociedade. Já em Um Homem Chamado Cavalo, de Elliot Silverstein, o que se mostra não é um processo de socialização e sim a dificuldade de quem possuiu um determinado tipo de socialização se adequar a outro, o que é bem mais fácil do que os casos anteriores, já que existe uma base social e lingüística em ambos os casos. O que todos estes filmes mostram é que a socialização é um processo de humanização e tal processo é fundamental para o ser humano.
A grande questão é qual socialização, ligada a que tipo de relações sociais, é realizada. Em Um Homem Chamado Cavalo temos esta discussão iniciada, mostrando os tipos diferenciados de socialização. Na sociedade moderna, a socialização serve para formar indivíduos adequados a ela e isto ocorre via família, comunidade, etc. Tal indivíduo irá viver em relações sociais marcadas pela alienação. A socialização, neste caso, é realizada principalmente via repressão e coerção. Assim, a socialização passa a ser simultaneamente um processo de humanização e desumanização. A escola é uma outra instância de socialização e reproduz esta socialização extra-escolar, do qual trataremos em outra oportunidade.


  
Ficha do Artigo
Imprimir Abrir como PDF

Edição:

N.º 159
Ano 15, Agosto/Setembro 2006

Autoria:

Nildo Viana
Professor da UEG - Universidade Estadual de Goiás e Doutor em Sociologia pela UnB ? Universidade de Brasília
Nildo Viana
Professor da UEG - Universidade Estadual de Goiás e Doutor em Sociologia pela UnB ? Universidade de Brasília

Partilhar nas redes sociais:

|


Publicidade


Voltar ao Topo