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Hidrocarbonetos e economia

Obter energia implica trabalho, ou seja dispêndio de energia. A relação entre energia obtida e energia dispendida tem um significado primordial na base material de todas as sociedades e dita a sua sustentabilidade e a habilidade para o seu crescimento.

Toda a actividade económica implica transformação material e decorre no seio da natureza, sujeita a suas leis naturais.
Todos os instrumentos ao serviço do homem foram fabricados ou exclusivamente por si (trabalho somático) ou com o auxílio de uma fonte de energia externa (como o fogo ou um curso de água); e a sua utilização requer ou apenas manipulação (trabalho somático) ou uma fonte de energia externa. Uma sociedade organiza-se e caracteriza-se pelo tipo de instrumentos que utiliza. Na sociedade primitiva o homem fabricava e manipulava ele próprio todos os seus instrumentos. Na sociedade industrial avançada a máquina está omnipresente, tendo consumido energia no seu fabrico e consumindo de novo energia na sua utilização.
A civilização pré-industrial e o arranque da revolução industrial suportaram-se inteiramente em fluxos (directos e indirectos) de energia solar.
Obter energia implica trabalho, ou seja dispêndio de energia. A relação entre energia obtida e energia dispendida tem um significado primordial na base material de todas as sociedades e dita a sua sustentabilidade e a habilidade para o seu crescimento. Nas sociedades pré-industriais o trabalho somático do homem (e dos animais de trabalho domesticados) aplicado ao solo (e dadas as disponibilidades dos factores sol e água), deveria produzir alimentos suficientes para sustentar esse ciclo de realimentação, sem o que a fome poria em risco a sobrevivência da população e a estabilidade da sua estrutura. Nas sociedades industriais avançadas a intensidade de utilização de energia externa é dezenas de vezes a capacidade de realização de trabalho somático, até mesmo na agricultura, mas sobretudo nos transportes. As fontes de energia externa que suportaram o passado desenvolvimento industrial são os combustíveis fósseis, particularmente o petróleo, que ganhou predominância quantitativa e qualitativa ao longo de quase todo o século XX.
Os hidrocarbonetos convencionais ? petróleo e gás natural ? resultaram da lenta transformação de matéria orgânica incorporada em rochas sedimentares em afundamento e submetidas a temperaturas e pressões progressivamente elevadas (rocha mãe), que ficam retidos e armazenados em rochas porosas e permeáveis e naturalmente pressurizadas (rocha reservatório), pelo que, uma vez perfurada a rocha cobertura, a sua ejecção é espontânea. Com o prosseguimento da extracção, a pressão baixa, após o que o prosseguimento da extracção requer pressurização, mediante injecção ou de água sob o lençol de hidrocarboneto ou de um gás sobre o lençol de petróleo. Etapas mais avançadas exigem a extracção através de furos horizontais, a injecção de substâncias tensioactivas, a fragmentação da rocha com explosivos, a instalação de bombeamento subterrâneo, etc.
Qualquer modalidade de extracção assistida é não só exigente em recursos adicionais, particularmente energia, como também está limitada no seu alcance porque o escoamento se dá em mistura de fases, de que resulta a fragmentação do hidrocarboneto em bolsas isoladas cuja acessibilidade se torna progressivamente mais difícil; a taxa de recuperação não excede 45 por cento para o petróleo e 70 por cento para o gás. O esforço de prosseguimento da recuperação do hidrocarboneto exige, em particular, a intensificação do consumo de energia na sua extracção; isto é, a eficiência energética de extracção degrada-se progressivamente ao longo do ciclo de vida de um campo petrolífero, e o hidrocarboneto in situ nunca é totalmente extraído.
Os recursos de hidrocarbonetos não convencionais caracterizam-se por exibirem ab initio baixa eficiência energética de extracção. Mesmo que os recursos sejam muito vastos, os fluxos de massa e energia exigidos para obter uma unidade de energia líquida são substancialmente superiores aos exigidos para obter uma unidade de energia líquida partindo de recursos convencionais. O declínio de reservas de hidrocarbonetos convencionais força a que se recorra, cada vez mais, a reservas não convencionais, nomeadamente petróleo pesado e ultra-pesado, areias betuminosas, jazidas no offshore profundo, jazidas na zona polar, etc., a custos energéticos (e ambientais) agravados. 
O pico de produção de hidrocarbonetos convencionais e a transição para hidrocarbonetos ?não convencionais? significa, essencialmente, uma degradação progressiva da eficiência energética de extracção, do nível muito elevado atingido em meados do século XX para valores que poderão atingir o nível do princípio da revolução industrial. Uma economia industrial baseada em eficiência energética de extracção de energia primária mais baixa terá uma capacidade de acumulação de bens materiais (e capital) diminuída. O século XXI será tecnicamente muito mais avançado mas poderá ter uma capacidade de crescimento comparável ao século XIX.


  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 152
Ano 15, Janeiro 2006

Autoria:

Rui Namorado Rosa
Univ. de Évora
Rui Namorado Rosa
Univ. de Évora

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