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Fantasias Caleidoscópicas

Hayao Miyazaki é um japonês de 64 anos, um génio da animação. É um verdadeiro artista do cinema que trabalha com imagens pintadas à mão, como nos ?velhos tempos?, enquanto toda a gente está imersa  nas técnicas do computador. Confesso que cheguei tarde às suas ricas fantasias caleidoscópicas, tendo ficado espantado, mas intrigado, com a sua ?Princesa Mananoke? e ter ficado completamente rendido com ?A Viagem de Chihiro?. ? Howl?s Moving Castle? é o seu último filme e está prestes a estrear por cá.
Como nos seus  filmes anteriores, está muito influenciado por autores ocidentais, Lewis Carrol especialmente, mas é explicitamente baseado no trabalho da escritora inglesa Diana Wayne Jones de 1986 com o mesmo nome, e tem bruxarias e encantamentos que JK Rowling pôs na moda novamente.
O filme é uma parábola comovedora sobre o poder transformador do amor e o assustador peso da juventude. É passado na Europa central numa costa sem nome- um local com características de Bruges e Leça da Palmeira de outros tempos. Há eléctricos e carros estranhos. Mas é uma cidade em guerra; uma populaça desorientada  testemunha incursões de barcos e aviões  retro-futuristas , mísseis e bombas.
Nascido em 1941, Miyazaki é filho do criador das balas do Zero, o caça japonês da II Guerra Mundial. Marxista - um dos seus alvos preferidos são os fabricantes de armas - o seu estúdio, Studio Ghibli, é conhecido no meio como o Kremlin. O seu amigo e colega de profissão, Mamoru Oshii, disse uma vez: ?Penso que para ele fazer um filme é ainda uma espécie de extensão do movimento sindical?. Em 1964, um ano após o seu primeiro trabalho de animação nos Tokyo?s Toei Studios, Miyasaki organizou uma greve e posteriormente tornou-se secretário-geral do seu sindicato. Em 1984, durante a greve dos mineiros no Reino Unido, foi encontrado em Rhonda Valley, experiência que transportou para ?Castle in the Sky?. ?Admirei muito a maneira como o sindicato dos mineiros lutou até ao fim pelos seus empregos e pelas suas comunidades?, disse.
Parece é que com a idade se tornou mais comedido, e a conferência de imprensa em Tóquio para a apresentação de ?Castelo Andante? foi uma sucessão de observações políticas feitas para não descarrilar. Quando lhe perguntaram onde o filme era passado, descreveu um cenário estilo belle époque num qualquer país da Europa. ?Penso que o romance original o coloca provavelmente no País de Gales,? acrescentou, ? mas não quis colocá-lo lá, embora seja um óptimo local para descrever minas de carvão?. Entre ao risos da imprensa nem parecia que tinha sido um local de acontecimentos que o tinham preocupado.
Quando lhe perguntaram se as suas preocupações com a política tinham aumentado ou diminuído desde 1997, ano de ?Princesa Mananoke?, Miyazaki foi suficientemente evasivo para não mencionar, por exemplo, que tinha evitado os Óscares  porque tinha reprovado veementemente a política americana  para o Iraque. ? Mudou numa coisa: passei a levar a política para o ambiente mais seriamente ...Mas isso não significa que pelo facto de eu fazer filmes sobre isso  esteja a contribuir alguma coisa para o mundo. Aliás, penso que devemos fazer qualquer coisa na nossa vida quotidiana para tentar resolver os problemas?.
Parece que Miyazaki evita actividades promocionais dos seus filmes precisamente porque não pode ?falar da guerra?, ou mencionar o seu interesse pelo socialismo e ?políticas verdes?. Até hoje foi assumido que esta espécie de reclusão em que tem vivido é devida ao facto de ser envergonhado e fora de moda, pensando que a sua arte fala por si. Ele lamenta a cada vez maior mecanização da animação -? penso que uma parte importante do meu trabalho se perdeu?. Quando a distribuidora americana resolveu passar ?Princesa Mananoke? nos Estados Unidos, enviou a Harvey Weinstein uma espada de samurai com um bilhete dizendo ?no cuts?.
Mas para mim a parte mais interessante da referida conferência de imprensa foi quando lhe perguntaram qual seria o animal em que gostaria de se transformar, como acontece em tantos dos seus filmes. ?Talvez um dragão,  um espírito de árvore ou um porco demónio?? Resposta: ?Nem pensar. Um bicho da madeira.?. ?Porquê o bicho da madeira??. ?Porque é não agressivo, totalmente não egoísta e puro. Está apenas ocupado em viver.?


  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 150
Ano 14, Novembro 2005

Autoria:

Paulo Teixeira de Sousa
Escola Secundária Especializada de Ensino Artístico de Soares dos Reis, Porto
Paulo Teixeira de Sousa
Escola Secundária Especializada de Ensino Artístico de Soares dos Reis, Porto

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