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Medidas polémicas... mas necessárias

Alude-se com frequência ao ?país de doutores? em que se terá tornado Portugal nos últimos anos, mas a verdade objectiva dos números lembra que no seio da UE, Portugal é simultaneamente o país com maior percentagem de abandono escolar e um dos países com menor percentagem da sua população com estudos superiores.
Aparentemente este dualismo seria fonte de desigualdades sociais mas o desemprego crescente entre licenciados e a profissionalização e requalificação técnica dos restantes, revela uma face mais dramática do problema: o trauma de significativas frustrações sociais e pessoais que derivam da máxima: ?o que é importante é tirar um curso superior, qualquer que ele seja?, acompanhada por uma outra ?mais vale um desempregado licenciado do que um sem qualificações?.
Esta aparente lógica esbarra nos profundos dramas pessoais que são vividos por muitos jovens cujas expectativas, alimentadas por um sistema de ensino sem aderência à realidade sócio-económica, acabam por não se concretizar, tornando sem sentido quatro ou mais anos da sua vida ? veja-se o caso de milhares de professores sem colocação, entre outros.
A nossa sensibilidade social para o problema levou já o Estado a tomar as primeiras medidas como o recente programa de requalificação no qual se inscreveram milhares (!?) de jovens licenciados. Medidas avulsas como sempre. O problema é estrutural e exige medidas estruturais. Nesse sentido, o acesso ao ensino superior deve ser alterado, de modo a assegurar que:
Todos os alunos que obtenham nota de acesso igual ou superior a 16 valores têm o direito inalienável de frequentar o Ensino Superior com propinas e demais custos suportados pelo Estado, e independentemente da existência ou não de numerus clausus no curso em questão, sendo responsabilidade do Estado garantir a existência de vagas suficientes para esses alunos.
Todos os alunos que obtenham nota de acesso inferior a 10 valores não poderão frequentar o Ensino Superior, mesmo que o curso em questão não tenha qualquer aluno a frequentá-lo. Em 2004, dez por cento dos cursos receberam alunos com notas negativas, com classificações entre os 8,32 e os 9,99.
Todos os alunos com notas de acesso entre 10 e 16 valores ficam sujeitos a uma seriação com base nos resultados escolares obtidos, no seu perfil psicológico, na sua experiência profissional ou "currículo de vida".
A colocação dos alunos far-se-ia da seguinte forma: seriação por ordem decrescente de alunos, com base na sua nota de acesso. Posteriormente, todas as universidades teriam acesso a essa seriação e poderiam convidar os alunos a ingressar em cada uma delas (imperando a saudável concorrência entre universidades da qual beneficiariam todos os elementos do sistema educativo). Recebidos os convites de cada universidade, os alunos escolheriam as que mais desejassem, tendo preferência, os alunos com melhores notas. Todos os alunos com nota de acesso superior a 10 poderiam ter a oportunidade de frequentar o Ensino Superior, mediante as circunstâncias sociais do momento.
Em todo este sistema, o Estado assumiria um papel de independência e justiça social. Ao Estado competiria avaliar as universidades, velar pelo bom funcionamento do sistema, impor regras, e apoiar simultaneamente os melhores alunos e os alunos mais carenciados.
Seriam medidas polémicas? Sem dúvida... Mas são necessárias. Face à realidade que temos presenciado, as consequências dramáticas das más opções tomadas ao longo dos últimos anos apenas agora começaram. O adiamento destas mudanças necessárias apenas tornará o drama mais intenso e mais próximo de cada um de nós.


  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 139
Ano 13, Novembro 2004

Autoria:

Nuno Nogueira
Economista; Editor Executivos.Online.pt
Nuno Nogueira
Economista; Editor Executivos.Online.pt

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