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Algumas (novas) práticas e vocações territoriais

Os espaços abertos de lazer e recreação na cidade

O lazer e a recreação são na cidade, uma fonte de forte representação pessoal, cultural e social, com um peso significativo nas variáveis que caracterizam a denominada melhoria da qualidade de vida.
No que respeita à qualidade de vida, a cidade é criticada de não a oferecer a quantos nela habitam. Ela é também responsabilizada pelo stresse dos cidadãos, ou por todo um conjunto de males e deteriorações que assolam a vida das pessoas e dos grupos e que se tem acentuado nas últimas décadas.
Hoje, teoricamente, todos defendem e almejam uma melhor qualidade urbana, independentemente da sua condição social ou da sua maior ou menor inserção e participação na vida da cidade  Contudo, por detrás desta inocência e neutralidade, deste valor supostamente humano e universal, encontram-se posições, e, sobretudo, interesses bastante divergentes, em que o espaço público é um mero exemplo.
Desde o início dos anos 80 do século passado que o valor do espaço público se evidencia cada vez mais na cidade como um dos principais vectores em matéria de ordenamento urbano e de primeiríssima importância para as actividades de tempo livre dos cidadãos.
Comparando as políticas urbanas discutidas na última década, com as caracterizadas pelos modelos desenvolvidos em anteriores decénios, é de registar, por parte de algumas profissões, com inter[LS1] venção na cidade, uma maior preocupação com os valores culturais e os hábitos de vida das pessoas.
As palavras de ordem são agora para, reconhecendo as necessidades, os gostos e as aspirações dos utilizadores, renovar e revitalizar[LS2]  os espaços públicos e o edificado.
É neste sentido que, no quadro de encontros de académicos e de profissionais, bem como no âmbito de estudos das mais diversas disciplinas, têm aparecido conclusões que apontam para a necessidade de políticas de renovação, revitalização e reordenamento dos espaços urbanos. Trata-se de equacionar outras formas de conceber e produzir a cidade, nas quais os espaços públicos abertos de lazer e recreação são uma das vertentes de maior incidência a ter em conta nestas tomadas de decisão.
O regresso ao interesse pelo espaço público, em especial o destinado ao lazer, aparece, essencialmente, com o objectivo da qualificação do quadro de vida das populações urbanas e enquadra-se nas preocupações mais globais dos estilos e da qualidade de vida, com reflexos no bem estar mais geral das sociedades. Concepções e práticas, viradas para a produção e o desenvolvimento destes espaços, aparecem hoje, um pouco por todo o lado, valorizados e reconhecidos.
Os espaços públicos abertos para além de continuarem a ser as encruzilhadas da circulação, ou as meras vitrines da cidade, são também, e, cada vez mais, os lugares de recreação permanente, e de comunicação. Neles, os habitantes reconhecem-se produzindo territorialidade, tornando-os seus, enquanto lugares representativos das suas práticas culturais e sociais.
Qual o papel que cabem a[LS3] os espaços de lazer e de recreação na melhoria deste quadro de vida?
Quais são as orientações e os métodos que os intervenientes na produção e organização dos espaços públicos de lazer e recreação estão a empreender para se adaptarem à conjuntura actual e às perspectivas futuras?
Como estão as cidades a organizar-se, territorialmente, para dar resposta às ambições e expectativas dos cidadãos?
Que representações e práticas caracterizam os comportamentos das pessoas em termos do usufruto dos espaços de lazer?
As questões aqui levantadas, fazem parte de algumas das premissas que se colocam no campo da concepção, do ordenamento, ou da participação relativas ao espaço público da cidade. 
Mas voltemos ao assunto central. O das (novas) vocações territoriais.
É com o surgimento de novas vocações espaciais para a cidade, que, em parte se altera a maneira de a habitar. A acompanhar estas vocações emergem, no campo dos espaços abertos de lazer e recreação, [LS4]  novas práticas activas nos territórios urbanos.
Vejamos assim qual o significado que, nos dias de hoje, têm por exemplo as Actividades Físicas e Desportivas nos espaços abertos da cidade.
Todos os indicadores sublinham que as actividades físicas e desportivas de carácter recreativo, se tornaram um elemento maior, ao conquistarem o seu lugar nos espaços urbanos.
Neles, milhares de equipamentos foram edificados marcando hoje a paisagem urbana; neles, dezenas de milhares de pessoas se tornaram praticantes. Uns, os equipamentos, tecem uma verdadeira malha urbana e outras, as pessoas, exercem nela uma função cultural, uma certa maneira de expressão e uma não menos e evidente forma de representação; aí semearam uma dimensão mais humana, mais lúdica, mais colorida e mais festiva.
A cidade e os seus espaços abertos são os palcos da diversidade para os praticantes procurarem os lugares que melhor se adaptam à evolução das suas necessidades e dos seus estilos de vida. Eles identificam-se com o grau acentuado das mobilidades quotidianas ou de fim-de-semana. Esta identificação assenta, por seu lado, na procura de práticas mais livres e autónomas, ligadas ao que se tem vindo a chamar de «práticas de deslize» e que  se transformaram numa verdadeira contra-cultura desportiva, isto é, «numa cultura desportiva alternativa».
Mas onde se passa tudo isto?  
Onde se encontram estes lugares de prática na cidade?
Acima de tudo nos espaços públicos abertos - nos chamados espaços outdoor, com ou sem natureza.
Neles, as actividades físicas e desportivas vão, de uma forma não convencional, tomando conta dos lugares. Estes englobam os espaços clássicos "urbanos" (parques, praças, ruas,...), os espaços para peões e cicláveis (alas, pistas, frinchas,...), espaços de descanso (frentes de água, jardins,...), espaços naturais de lazer (trilhos, bosques, parques,...) e os espaços ditos desportivos (áreas de jogo, ou polidesportivos exteriores).
Não sendo, todavia, este um fenómeno totalmente novo, o que o faz tornar mais evidente é a forma como se desenvolve o processo e o tipo de investimento que nele é feito pelas pessoas.
Ao fim e ao cabo, do que também se trata é de um conjunto de espaços na cidade que se inscrevem num projecto individual, deixando a cada um as possibilidades de prática, caracterizadas por serem pouco constrangedoras e facilmente adaptadas aos desejos de cada interveniente.
É neste quadro de princípios e de ideias que muitas práticas têm ganho uma territorialidade concreta na cidade. Trata-se de territórios com especificidades que encerram em si dimensões de tipo social, geográfico e simbólico e que, de acordo com a leitura política e jurídica, colocam questões de organização e de enquadramento.
Podemos aqui evocar e multiplicar os exemplos. No entanto, situemo-nos em dois que nos parecem terem tido uma progressão extremamente rápida nas grandes cidades europeias e norte-americanas. Eles, só por si, representam uma boa explicitação do que queremos evidenciar.
Um deles é o patim em linha. O outro, a bicicleta.

(Continua)

[LS1]ou intervenção, ou acção
[LS2]o quê?
[LS3]cabem aos espaços?
[LS4]parágrafo um pouco confuso; não percebi de quem são os símbolos; divide a frase em duas.


  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 131
Ano 13, Fevereiro 2004

Autoria:

António Mendes Lopes
Instituto Politécnico de Setúbal
António Mendes Lopes
Instituto Politécnico de Setúbal

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