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Por onde anda a palavra responsabilidade?

É espantoso o que uma personalidade poderosa, aliada à força da comunicação social, pode fazer a toda uma sociedade! Vem isto a propósito do fenómeno Herman José.
Quando ele surge na ribalta da nossa televisão, com o seu talento inegável, a sua cultura também por demais evidente, a sua graça, o seu desrespeito por convenções, o seu atrevimento, o seu chiste  e a sua imaginação delirante, depressa avassalou a atenção dos espectadores, atingiu os topes de audiência, pulverizou adversários. Depois começou a ganhar prémios em série, até hoje.
Mas a sua irreverência saudável rapidamente evolui no pior sentido. O seu atrevimento tornou-se cada vez mais atrevido, as suas intenções implícitas tornaram-se bem explícitas, as suas graças são muitas vezes grosseiras.
Argumentarão os que o admiram e apreciam que só o vê e ouve quem quer. Assim seria. Só que ?  Herman José fez escola. O seu exemplo frutificou no pior sentido. As pessoas deste país pouco crítico e seguidista acharam-se no direito de agir e falar como ele. Só como não têm talento, nem bom senso, copiaram-no naquilo que ele tem de pior: a grosseria. E temos assim um país que banalizou o palavrão, a anedota porca, para quem o sexo perdeu dignidade, que comenta em alta voz no autocarro aquilo que a delicadeza da geração anterior guardava para a intimidade, que encara a obscenidade como um copo de água do Luso em tarde quente de Verão.
E se o copia na palavra também o imita nos gestos e nas atitudes: a vulgaridade, o despudor, o mau gosto são, hoje, marcas do nosso comportamento nacional.
Convertido em líder, é profundamente triste que o impacto de Herman José seja de afundamento cultural quando poderia ser alavanca para promover um pouco a nossa gente.
Culpa do apresentador? Sinal da menoridade cultural dos portugueses que não têm discernimento, nem sentido crítico? Culpa da política cultural do país? Culpa de uma televisão e de uma rádio que promovem a mediocridade em nome de interesses mais ou menos inconfessáveis? Culpa de tudo ao mesmo tempo?
Por onde anda a palavra responsabilidade?


  
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Edição:

N.º 127
Ano 12, Outubro 2003

Autoria:

Maria Manuela Salvado Cunha

Maria Manuela Salvado Cunha

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