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Ser Professor no Novo Milénio

PRETENDO DEIXAR AQUI ALGUMAS REFLEXÕES, QUE NÃO ESPERO QUE SEJAM APENAS MINHAS MAS DE TODOS OS PROFISSIONAIS DO ENSINO E DA FORMAÇÃO.

A actividade de docente é magnânima  porém, talvez a maior riqueza, é a responsabilidade inerente àquele que a exerce, na passagem dos vários tipos de saberes e fazeres.
Ao professor do 3º milénio exige-se muito mais que noutras épocas. É que as marcas do tempo, da informação e do saber tecnológico a tal ?oblige?.
Vocação, competência e aptidão profissionais e pedagógicas, deve o docente possuir, bem como, equilíbrio emocional, habilidade e consciência pessoal e relacional para possibilitar o desenvolvimento cognitivo dos seus alunos. Todavia, este deve ser aliado ao desenvolvimento humano e ao respeito pelas diferenças, sejam estas expressas pela cor, credo político - religioso, odor, maneira de ser dos alunos.
Defendo que se o professor souber transmitir, praticar e actuar tendo por base estas preocupações (que deveriam ser hábitos), é meio caminho para que a aprendizagem se concretize de um modo não meramente superficial mas, enraizado na pessoa humana do  discente. Aprendizagem não apenas dos saberes ditos convencionais e académicos mas a maior sabedoria que se pode ensinar: SABER CONDUZIR O OUTRO À MEDITAÇÃO DO SABER (1).
Como parte da Sociedade da informação, do Conhecimento e da Cultura Tecnológica encontrei, deambulando pela Net, um texto de Vicente Martins (2) que vem ao encontro desta reflexão.
O autor apresenta dez princípios que os professores, deste século, devem colocar em prática, a fim de se dimensionarem para uma ?pedagogia do desenvolvimento humano.?
Tendo-o como referência, vou realçar os princípios que julgo estarem mais dirigidos aos docentes e alunos do ensino superior (pois parece-me que V. Martins se refere mais particularmente aos professores dos níveis anteriores).
O 1º dos princípios defende que o professor deve ?aprimorar o educando como pessoa humana?, i.e., a grande função ?não é a de instruir, mas a de educar?  os alunos como pessoas humanas que mesmo numa sociedade em que impera a infotecnologia, os sentimentos, a dor, as incertezas... não deixaram nem deixarão de existir, antes pelo contrário. Cada vez mais, os indivíduos se sentem isolados e sós no meio da teia de redes (reais e virtuais) que pelos humanos são criadas.
Aliás, como afirma V. Martins, ?de nada adianta o conhecimento bem ministrado (...), se fora da escola, o aluno se torna um homem brutalizado, desumano e patrocinador da barbárie.? Por conseguinte, há que reforçar a necessidade de efectivar o desempenho da cidadania (3).
Aliado ao exercício da cidadania (que deverá iniciar-se em casa com a família e não apenas na escola (4)), o professor pode e deve ser chamado a participar, na tão proclamada gestão participativa da instituição escolar. Não com funções de chefia ou direcção mas, como pessoa que estando mais próximo dos alunos melhor deverá percepcionar os seus anseios e dificuldades e (como se vive em democracia), colaborar na procura da resolução dos problemas que a administração da ?escola democrática (5)? tentar executar.
Se a vida é o encadeamento de constantes transformações, também, ser e saber ser professor é fazer parte de um processo global e holístico, não se devendo ficar pela rotina da preparação e da leccionação de aulas.
É que possuir um ?canudo? não basta. Nos dias de hoje, há que estar preparado para tudo e todas as eventuais funções de gestão e organização que a sociedade exigir.
Com a prática de tais requisitos  o professor estará, em princípio, um pouco mais apto para ?qualificar o educando para progredir no mundo do trabalho? (6), apesar de não lhe fornecer todas as ferramentas, pelo menos, prepara-o para enfrentar as múltiplas demandas e vicissitudes sociais. É que ?por mais que a escola qualifique (os) seus recursos humanos, por mais que adquira o melhor do mundo tecnológico, (...), sempre estará marcando passo frente às novas transformações cibernéticas (...)?.
De que serve dominar o conhecimento, possuir a capacidade de o transmitir se não se for capaz de fazer aprender? Sim, porque após aprendido e apreendido, seja qual for o saber transmitido, o aluno estará em melhores condições para, de um modo independente e crítico, empregar e gerir a informação e o conhecimento obtidos.
Vicente Martins afirma que o conhecimento ?não se faz apenas com metalinguagem, com conceitos a, b ou c, e sim, com didáctica, com pedagogia do desenvolvimento do ser humano, sua mediação fundamental?.
O que todo o professor deve saber ensinar, demonstrar, fazer e fortalecer é a ?solidariedade humana (7)? e a ?tolerância recíproca (8)?. Com estas práticas torna-se muito mais facilitada a tarefa de ?zelar pela aprendizagem dos alunos (9)? e, a mais importante e premente de todas as funções, (10) o ?RESPEITO PELAS DIFERENÇAS (11)?.
É da sabedoria popular afirmar que «se não nos soubermos dar ao respeito, como poderemos querer ser respeitados»? O mesmo será declarar: ?se não souber respeitar os outros, como quero que me respeitem?? A função do educador não deve ser vista só na perspectiva de fornecer ao outro, mas também, na de olhar para si mesmo e a si próprio educar. Não se está sempre a aprender? Então não se exija ao aluno aquilo que não se é capaz de efectuar na primeira pessoa.
Afinal, antes de se ser professor foi-se aluno e, como tal se deve continuar a ser: um eterno ?aprendente? do mester da pedagogia do desenvolvimento humano. A vida é devir e saber aprender a dialogar com a vida, quer profissional, quer pessoalmente é saber educar ?dialogicamente?.
Se alguns destes princípios fossem praticados, nem que fosse, por metade, não só dos docentes, mas de todos os colaboradores de todas as organizações existentes nas sociedades actuais, as notícias que têm vindo a ser veiculadas pelos órgãos da sócio - cultura da informação talvez diminuiriam.

Texto publicado no Newsletter do Clube de Psicologia do ISLA ? INFOPSI, nº 1, Março/Abril de 2003.
Notas:
1- Quiçá, a real pedagogia do desenvolvimento das emoções humanas.
2 - http://members.tripod.com/pedagogia/decalogo.htm
3 - É o 2º princípio.
4 -  O que, em parte, o autor apresenta como 8º princípio ?colaborar com a articulação da escola com a família? que, no ensino superior não se justifica, ou seja, o professor não tem que conhecer os pais para melhor lidar com os alunos, entenda-se.
5 - ?Construir uma escola democrática? é o 3º princípio apresentado que interligo com o 9º ?participar activamente da proposta pedagógica da escola?.
6 - É o 4º princípio.
7 - Princípio n.º 5.
8 - Princípio n.º 6.
9 - Princípio n.º 7.
10 - Que não deveria ser apenas do professor mas de TODO O SER HUMANO.
11 - É o princípio n.º 10.

  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 125
Ano 12, Julho 2003

Autoria:

Alzira Simões
Socióloga e Antropóloga, ISLA, Leiria
Alzira Simões
Socióloga e Antropóloga, ISLA, Leiria

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