- Que questões o preocupam mais neste início de século?
- Que propostas lhe parecem mais adequadas para resolver as questões
que referiu acima?
- Num recente inquérito à escala mundial, promovido pela
Gallup Internacional, dois terços dos inquiridos refere que o seu
país “não é governado de acordo com a vontade
do povo” e mostra-se de modo geral insatisfeita com a qualidade
das democracias. Neste contexto, considera importante reforçar
o papel da sociedade civil e dos movimentos sociais na construção
de novos caminhos para o mundo?
1 e 2 - Várias questões se colocam no
momento presente à escala mundial. No início dos anos 90, foi-me
colocada a questão das perspectivas para aquela década. Na minha
condição de membro de uma organização não
governamental de ambiente, e face àquilo que me pareciam ser os grandes
desafios queassentavam nos paradigmas a reconverter, achei que, não obstante
estar-se perante situações de resolução premente,
o maior investimento seria a Educação Ambiental.
Trata-se fundamentalmente da produção de um novo paradigma, em
que não se verifiquem situações como as actuais em que
se assiste à exploração de recursos por sociedades, de
sociedades por sociedades, e de indivíduos por indivíduos.
É para mim urgente que se verifique uma autêntica revolução
do saber, que levará certamente à conclusão de que a pilhagem
de bens e de populações acabará por penalizar todos, quaisquer
que sejam os respectivos estatutos sociais.
Porquê? Vejamos:
- A população vai crescer a um ritmo superior à capacidade
de carga do Planeta: não haverá alimento que satisfaça
cerca de 9 mil milhões de habitantes, mesmo atendendo a que, como
dizem os tecnocratas, a ciência terá soluções
para todas as disfunções que viermos a ter no futuro;
- A emergência de Refugiados Ambientais obrigará os países
ditos desenvolvidos a terem de os aceitar, como moeda de troca relativamente
à situação que lhes produziram;
- A exaustão de matérias-primas nas quais tem assentado o
crescimento desses países, obrigará à investigação
de formas alternativas, especialmente de acesso às novas energias,
para que os níveis de vida se mantenham nos padrões actuais;
- A enorme diferença de acesso a tecnologias tais como as comunicações
informáticas, torna mais diferentes os povos do auto proclamado mundo
ocidental, rico, avançado, e aqueles para os quais não se
faz sequer qualquer esforço no sentido de se minorar os efeitos do
SIDA, por exemplo;
- No tempo da repressão denominada com propriedade fascista, discutiam-se
ideais, em que se usavam termos como "exploradores e explorados".
Hoje, com a emergência dessa situação de iniquidade,
passámos a poder dizer que no mundo temos "globalizadores e
globalizados" o que é apenas uma variação de terminogia.
- A distribuição da água, essencial à vida
humana, tem resultado em guerras sem sentido. Novas guerras não se
compreendem, e os países que partilham esse recurso vão obrigatoriamente
ter de se entender, partilhando equitativamente esse recurso vital;
- Os níveis de poluição que trazem consigo a ameaça
de problemas em grande escala, por exemplo aqueles que derivam do excesso
de libertação de gases tóxicos para a atmosfera, têm
nos Estados Unidos o ónus da produção de 25% do total.
Escandalosamente, esse país recusou a ratificação do
acordo de Kioto, com a alegação de que isso traria o colapso
da indústria americana; vá-se lá saber se sim ou não
o presidente desse grande país não será a face visível
dos interesses mais repugnantes da sociedade norte-americana.
Que não só assenta a sua economia na exploração
da mão-de-obra de países em situação económica
desfavorável, como também na poderosa máquina de armamento,
que justifica, aliás, a psicose da guerra do "Bem contra o Mal".
3 - O termo "O Povo é quem mais
ordena" apenas teve eco durante os (poucos) anos que sucederam à
mudança de regime. A partir de então, acentuou-se desmesuradamente
a aproximação das ideologias (se é que as houve) e hoje
verificamos aberrações como:
- O jogo de quem fez mais obras públicas e gastou mais dinheiro
do erário público nos jogos de inaugurações;
- A Democracia Representativa cada vez mais deixa de representar quem vota
com a assunção de que vai ver os seus interesses entendidos
e, quiçá, resolvidos;
Os jogos de interesses estão muito mais voltados para
a divisão de poderes do que para os reais problemas do País. É
minha convicção de que não é o poder que corrompe,
mas sim o medo de o perder;
As sociedades entendidas como "O Povão" podem não estar
satisfeitas. Mas tendo como tem a memória curta, depressa se deixa enredar
por populismos desmedidos, bem aproveitados pela classe política. À
outra classe, a dos apenas votantes, apenas cabe o "digno" papel se
servir de desculpa para os jogos de interesses, em nome da defesa daqueles que
dizem representar.
Como disse inicialmente, tenho actividade numa Associação não-governamental,
no caso de defesa do Ambiente. Trata-se de uma forma de dar corpo ao cidadão
que, não tendo poder para mudar o sentido do poder (é esse o significado
da expressão) pode intervir no sentido de o condicionar.
Uma associação mais não é que um grupo de pessoas
inquietas sobre os mesmos problemas e com a consciência de que a agregação
constitui uma potenciação das suas capacidades.
Tal como quem defende o Ambiente, coisa de interesse inquestionável -
e eu tentei demonstrá-lo nas linhas anteriores - é de extrema
importância que se criem movimentos que emergem de novas situações,
se calhar não novas mas agora manifestadas, tais como a luta conta xenofobia
e o racismo; o apoio a emigrantes, as mais das vezes explorados pelos passadores
de fronteira, e seguidamente, pelas mafias que vivem à sua custa; a luta
pelos direitos humanos, e, especialmente, pelos das crianças; a luta
pela interacção entre empregadores e empregados no objectivo comum
que deve ser o da produção competitiva pela qualidade;
Enfim, a luta pelo direito à felicidade. De todos. Em igualdade.
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