Uma fábrica que inicia a produção de bustos do presidente russo, alunos de
São Petersburgo que lêem um livro sobre a sua vida e escrevem composições sobre
a sua devoção ao presidente: o culto a Vladimir Putin é reforçado diariamente
na Rússia e há quem comece a desconfiar que se retorna ao culto do líder da era
Stalin. "Sinto uma certa inquietação perante tais iniciativas que se arriscam a
tornar um culto à personalidade de Putin", afirma Viktor Rezounkov, director da
delegação de São Petersburgo da Radio Svoboda, a antena russa da rádio Free
Europe.
Alguns milhares de adolescentes de São Petersburgo, a cidade natal do
presidente russo e de toda a região noroeste da Rússia, participaram
recentemente num concurso de composições sobre Vladimir Putin. As seis melhores
composições foram reunidas num livro intitulado "Diálogo com o Presidente".
"O nosso destino está nas suas mãos, Vladimir Vladimirovitch!", "Tudo depende
de si!", "Apenas Deus está acima de si no nosso país" - escrevem os estudantes,
que agradecem ao presidente russo o facto de se ter "encarregue da gestão do
nosso grande país" e se congratulam pela sua "juventude, inteligência e
desportivismo...".
E as manifestações de apreço pelo líder não se ficam por aqui. O jornal
regional do partido pró-Kremlin "Unidade" distribuiu no ano passado um livro
sobre os direitos das crianças que continha fotos do presidente Putin, em jovem
e em adulto, com excertos sobre a sua vida. Os estudantes de São Petersburgo
souberam através desta publicação que o seu presidente "não tem medo de nada",
"voa num avião de combate, desliza montanha abaixo de ski e vai onde há guerra
(Tchetchénia) para detê-la".
O livro lembra que Vladimir Putin trabalhou nos serviços secretos, mas recorda
igualmente que regressava a casa todos os dias, porque "gostava da família e
dos amigos". "E ele tem muitos amigos - toda a Rússia - que o elegeu
presidente", podia ler-se naquela publicação
"Estas iniciativas desmascaram a mentalidade soviética dos funcionários do
Estado em agradar ao presidente, mas não compreendem que se tornam ridículas",
afirma Leonid Kesselman, do Centro de Pesquisas Sociológicos de São
Petersburgo. "O culto da personalidade, tal como se verificava na época de
Stalin, é felizmente impossível nos tempos de hoje, mas os elogios de todas as
partes e a ausência de crítica ao presidente são enervantes", reforça
Kesselman.
Apesar disso, os jovens parecem ter embarcado na moda. O grupo musical "Bely
Orel" esteve semanas consecutivas nos tops de venda nacionais com uma música
que associa o actual presidente àquele que é considerado o maior feito russo na
II Guerra Mundial: o cerco a Stalingrado. "Soldados, fogo!... Nós amamos Putin
e Stalingrado", diz o refrão.
"Claro que não podemos afirmar que o presidente inspira pessoalmente este tipo
de iniciativas, mas elas refletem a linha geral da política de Putin, que se
apresenta como uma pessoa ideal e isenta de críticas", conclui aquele
sociólogo.
Curiosamente, a maioria dos russos considera que o seu país não é democrático,
de acordo com uma sondagem realizada recentemente pelo Instituto Romir. Assim,
mais de 56% dos russos dizem que a Rússia não é um Estado democrático, sendo
que apenas 30% das 2000 pessoas consultadas pensam o contrário, grupo onde
incluem sobretudo pessoas de média idade, entre os 30 e os 49 anos, de educação
superior, considerando que as mudanças de poder na Rússia são fruto de eleições
livres e honestas, enquanto 70% acham o contrário.
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