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Que lugar, hoje, para a escrita e leitura?

Desde há muito tempo que muita gente se tem preocupado, e bem, com os problemas da leitura e da escrita, do contar números e do calcular aritmético básico. Uma preocupação no sentido de que estas funções deverão ser instrumentos que todos estejam prontos a utilizar com eficácia. Não estando para tal preparadas, as pessoas encontravam-se necessariamente limitadas no exercício dos seus direitos de cidadania e diminuídas enquanto trabalhadores. Para resolver este problema, aí estava aí a luta contra o analfabetismo, no âmbito da qual, para além do ensino obrigatório, foram lançadas, sempre que a "agudeza" da situação o exigia, campanhas dedicadas a adultos. No nosso País, esta é uma luta ainda não completamente encerrada, nomeadamente junto dos adultos menos jovens.
Uma faceta mais avançada das preocupações existentes com a iliteracia popular, tem sido manifestada pela constatação de falta de hábitos de leitura por parte da população e, para resolvê-la, pelos consequentes apelos à leitura de livros, apelos estes secundados tanto por incentivos económicos que têm permitido o abaixamento do preço dos livros (uma taxa de IVA mais baixa do que para a maioria dos outros produtos, apoios financeiros à produção de livros) como pela existência de bibliotecas públicas.
Acresce ter a emergência da televisão e o seu dominador espraiamento enquanto meio de comunicação "preferido" das massas no panorama comunicacional das nossas sociedades, a partir do terceiro quartel do século passado, contribuído muito para o escurecer da situação ligada com a escrita e a leitura. Para muitos - incondicionais do lado das letras -, a guerra estava definitivamente perdida. E, para tantos outros, a aceitação total do audiovisual mostrava que aquele era justamente "o caminho".
E também foram tantos outros os que se deixaram transportar entusiasticamente atrás até de justificações profundamente absurdas, e não só menos pensadas. "Que a natureza da televisão, um meio de comunicação audiovisual, estava de acordo com o papel do sentido da visão na espécie humana enquanto canal predominante de entrada em nós da informação". Como se na escrita não fosse a visão o sentido utilizado e como se, por outro lado, no audiovisual não recorrêssemos à acção combinada da visão e da audição!
É claro que, para países tão atrasados no processo de alfabetização como era o nosso, tal situação da preponderância do audiovisual significava o ter passado a possibilidade da literacia integral para o nosso povo e de a leitura, em particular a relativa à grande literatura, como veículo de cultura para a generalidade das pessoas se ter tornado numa miragem.
Eis senão quando... vieram as comunicações mediadas por computador e a Internet com todo o seu uso intensivo da leitura e da escrita. Pouco tempo depois, foi a vez dos telemóveis e do sucesso esmagador do seu serviço de mensagens curtas, o SMS (Short Message Service).
Com efeito, o caso dos telemóveis, a sua rápida adopção pelas massas, ainda tornou este componente do fenómeno mais impressivo do que o caso da Internet tal como o conhecemos, quer dizer, via computador pessoal - em Portugal, para referir o nosso caso, em finais do segundo semestre de 2001 existiam cerca de 8 milhões de subscrições de telemóvel, isto é, para cima de cinco vezes mais do que as existências de acessos à Internet. E, sobretudo entre os jovens, a comunicação escrita via telemóvel passou a ocupar um lugar muito relevante (sei, uma explicação para tal estará no facto de esta ser menos cara do que a comunicação oral).
Também, é certo, ser uma escrita, a utilizada nos meios de comunicação interpessoal, diferente da escrita usual em papel, como já a tinha sido a dos telegramas. Mas, uma escrita, e que é lida.
No caso da informação disponibilizada via Internet, nomeadamente ao navegar-se na imensidade das páginas da Web, damo-nos também facilmente conta da persistência da preponderância do escrito sobre a imagem. Isto, enquanto os agentes económicos do mercado preferiam uma maior utilização do multimédia que, estão convencidos, lhes será mais lucrativa.
O certo é nunca se ter visto tantas livrarias e livros a serem publicados como nos últimos tempos. Será só uma consequência da extensão do ensino obrigatório no último quarto de século ou terá também algo a ver com a existência dos novos meios de comunicação electrónicos, nos quais a forma de comunicação escrita é tão importante?


  
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Edição:

N.º 110
Ano 11, Março 2002

Autoria:

Francisco Silva
Engenheiro, Portugal Telecom
Francisco Silva
Engenheiro, Portugal Telecom

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