Banco Mundial tenta impor a privatização das
escolas
Um professor não pode ser neutro - ele tem de escolher
parcerias
... É que nem todos os alunos são brancos e de olhos azuis
Regina Leite Garcia iniciou-se na profissão docente
como professora primária, tarefa que desempenhou ao longo de quinze anos.
Mais tarde, torna-se orientadora educacional. É nessa altura que sente
um compromisso político mais forte e chega a presidente da Federação
Nacional de Orientadores Educacionais. Começa a escrever e a publicar
e torna-se conhecida dentro e fora do Brasil, participando em congressos na
França, no Canadá, Estados Unidos e outros países. Em 1985
faz concurso de ingresso para a Universidade Federal Fluminense, no estado do
Rio de Janeiro, onde se doutora em Educação e na qual trabalha
até hoje. Nesta universidade torna-se pesquisadora, escritora e participa
em movimentos sociais mais amplos, como o Movimento de Trabalhadores Sem Terra,
e a outros mais direccionados para as questões da escola (onde faz questão
de afirmar que sempre participou) e da universidade. É pós-doutorada
pela Universidade de Londres, tendo trabalhado com Michael Young e Gunther Kress
no Institute of Education ao longo de um ano, e na Universidade de Wisconsin-Madison,
onde trabalhou com Michael Apple por seis meses. Voltou para o Brasil para entrar
num concurso para professora titular em alfabetização e coordena,
desde 1998, um projecto de pesquisa sobre alfabetização dos alunos
das classes populares.
Como descreveria o actual estado da educação no Brasil?
No Brasil, à semelhança do que vem acontecendo
um pouco por todo o mundo - e ao que parece também aqui em Portugal,
pelo que constatei num encontro do qual participei - estão a ser aplicadas
recomendações do Banco Mundial no sentido de se uniformizar a
avaliação e o currículo nacionais. No meu país,
o ministério da educação adoptou inclusivamente a designação
de Parâmetros Curriculares Nacionais para esta reorganização,
afirmando que eles não têm carácter obrigatório e
que servem apenas de referência para os professores. Mas no final do ano
lectivo, e apesar de a sociedade brasileira constituir uma imensa pluralidade
de culturas, de proveniências e de regionalismos, a avaliação
é comum, ou seja, o professor acaba sempre por cumprir aqueles parâmetros.
Dir-se-ia quase uma estratégia a nível mundial
para estabelecer parâmetros únicos e comparar resultados directamente,
sem atender às especificidades de cada país...
Cujo objectivo último é a privatização
da escola... Este é um processo que está a ter uma forte reacção
por parte das universidades e dos sindicatos brasileiros, embora, na minha opinião,
não tão incisiva quanto deveria. No Equador, por exemplo, eles
recusaram-se a cumprir esta determinação, e subverteram-na, iniciando
um movimento da base para o topo, que partiu das escolas, passou pelas províncias,
e terminou numa ronda onde se gizou um plano nacional de educação.
Isto não é o que acontece no Brasil e, segundo sei, não
é o que está a acontecer em Portugal.
Por outro lado, há também que contar com a cooptação
crescente de intelectuais, académicos e professores, que foram tomando
uma espécie de "entrelugar" em relação a esta questão.
Não aderiram de imediato à iniciativa, mas encontram-se em processo
de adesão, construindo aos poucos um discurso justificador da sua opção.
É uma situação que me lembra a última cena do filme
"Mephisto", de Alfred Hitchcok, quando o actor principal se pergunta a ele próprio
quando foi altura em terá vendida a alma. Eu acho que também eles
se irão perguntar um dia quando venderam a alma...
A educação é uma tutela centralizada
a nível nacional ou os estados que compõem a federação
têm autonomia nesse campo?
O Ministério da Educação define as grandes
directrizes e financia, directa ou indirectamente - neste caso através
das secretarias estaduais de educação - o sistema de ensino; As
secretarias estaduais de educação, por sua vez, são mais
ou menos autonómas conforme são ou não governadas por partidos
progressistas, porque estes vão remando contra a maré...
Presumo que quando fala de partidos progressistas se refere,
nomeadamente, ao Partido dos Trabalhadores?
Sim, entre outros, situados no centro esquerda. Os restantes
estados aderem à política do governo central e limitam-se a reproduzir
as directivas do ministério da educação. O mesmo se passa
com os municípios, que podem ou não cumprir o mesmo papel. É
o caso de Angra dos Reis, uma cidade próxima do Rio de Janeiro, que desde
1992 tem uma prefeitura PT, que entendeu a necessidade de apostar no aperfeiçoamento
profissional das professoras primárias. Quando tomou posse, este executivo
procurou a Universidade Federal Fluminense e propôs-nos uma parceria para
a criação de um curso de pedagogia inovador. Foi uma das experiências
mais ricas que eu já vivi.
Vê então vantagens nessa autonomia, apesar
de limitada?
Sim, porque ela dá margem para a inovação.
A prefeitura de Porto Alegre, por exemplo, que desde há alguns anos tem
também uma presidência "PeTista", vai melhorando a cada ano porque
foi acumulando experiência, faz auto-crítica e repensa continuamente
o seu projecto educativo. Pode até dizer-se que já existe um movimento
da sociedade civil que intervém na gestão das questões
educativas, e reflexo disso foi a criação do Orçamento
Participativo. Quando existe este movimento de co-responsabilização,
e ele não fica apenas nas mãos dos gestores, o trabalho avança.
Qual considera ser o estado mais avançado em termos
educativos?
O Rio Grande do Sul, cuja principal cidade é justamente
Porto Alegre, governado recentemente pelo Partido dos Trabalhadores. E isto
é bom, porque desta maneira vai ampliar-se esta influência. Têm
acontecido lá experiências muito interessantes, e inclusivamente
vêm visitantes estrangeiros, nomeadamente da Europa e dos Estados Unidos,
para observar essas experiências.
Num artigo seu refere uma dessas experiências - os
Faróis do Saber - que decorre em Curitiba. Essa cidade também
pertence ao Rio Grande do Sul?
Não, essa cidade fica no estado do Paraná. E
apesar de não ser uma prefeitura que eu chamaria progressista, é
verdade que desenvolveu um projecto interessante e criativo. Não seria
justo eu dizer que apenas uma prefeitura PeTista sabe fazer coisas interessantes.
Lá, eles criaram a muito baixo custo - e isso também
é importante - umas estruturas metálicas em forma de farol, onde
no topo se encontra um polícia municipal que pode vigiar a área
circundante, e nos dois pisos inferiores estão instalados uma biblioteca,
computadores, mesas e cadeiras, onde não só professores e alunos,
mas também a comunidade, podem ler, consultar a internet, fazer pesquisa,
etc...
Segundo números divulgados por agências internacionais,
na última década tem-se apostado mais na educação
dos brasileiros. Isso tem trazido resultados visíveis?
Sim, em alguns aspectos. Agora existe até uma verba
destinada exclusivamente ao aperfeiçoamento dos professores, que não
pode ser desviada para outras áreas educativas, como algumas prefeituras
tentaram fazer. Em contrapartida, existe uma disposição legal
absurda através da qual as prefeituras não têm acesso directo
a verbas destinadas à educação pré-escolar, recebendo-as
de uma forma muito condicionada. Ou seja, aquele que seria um momento educativo
da maior importância, no qual se instala toda a relação
futura com o conhecimento, não é apoiado devidamente. O mesmo
se passa com a educação de jovens e adultos. Seriam duas pontas
da maior importância, porque apesar de haver uma lei que obriga a escolaridade
dos sete aos catorze anos, de facto nem todas as crianças e jovens frequentam
o ensino.
Mas tem-se conseguido diminuir o fosso entre o interior
e o litoral?
As estatísticas oficiais dizem que sim, mas eu diria
mais ou menos, e em alguns lugares não. Porque a estatística serve
para provar o que quisermos. Os próprios economistas dizem isso. É
uma forma preversa de melhorar, por exemplo, os índices de analfabetismo,
numa sociedade em que esse problema continua a ser recorrente.
Qual é a taxa de analfabetismo?
A oficial é da ordem dos 27%. Mas na minha acepção
de analfabetismo eu diria que ela atinge uns 40%. Uma das questões que
o grupo de pesquisa está actualmente mais empenhado em debater é
precisamente a definição do que é alfabetização
e a qualidade da alfabetização que é proporcionada. Este
governo tem um projecto chamado "Alfabetização Solidária",
coordenado pela mulher do presidente Fernando Henrique Cardoso, que se propõe
a alfabetizar em seis meses. Ora isto não é possível, criando-se
a falsa ideia de que alguém que saiba rabiscar o nome ou soletrar uma
frase possa ser considerado um cidadão alfabetizado.
Que principais dificuldades enfrentam hoje os professores
brasileiros no exercício da sua profissão?
A principal dificuldade prende-se com o salário, que
é muito baixo.
Há inclusivamente zonas do Brasil onde os professores
alfabetizadores chegam a ganhar 15% do salário mínimo...
Sim, em algumas regiões rurais e do nordeste. Mas não
só. Ontem mesmo contei a história de uma professora que trabalha
numa favela do Rio de Janeiro, e que certo dia ia subindo a ladeira sob uma
chuva forte. Quando estava a chegar à escola um aluno indagou-a porque
razão ela não tinha vindo de carro. A professora respondeu-lhe
que não ganhava o suficiente para comprar um e o miúdo, surpreendido
com a quantia que ela lhe mencionou, exclamou: "Tu é trouxa; eu ganho
mais do que isso só para avisar os caras (traficantes) quando vem a polícia".
Qual será o sentimento de auto-estima de uma professora
ao ouvir uma coisa destas? É uma situação que revela bem
a desvalorização social dos professores no Brasil. A professora
primária, que até há uns anos era reconhecida e valorizada
na comunidade,e tinha um salário que lhe permitia ter uma vida decente,
hoje é alvo de um sentimento de pena por parte da sociedade.
No entanto, há que reconhecer que o governo federal
tem feito algum esforço no sentido de melhorar esta siuação,
tendo dispendido algumas verbas para o plano de carreira do magistério.
Embora continue muito baixo, tem melhorado. Mas não posso afirmar que
o meu país tenha como prioridade a educação, porque de
contrário faria como Cuba: primeiro alfabetizou toda a população,
estendendo depois a escolaridade até ao ensino básico e secundário.
Recentemente, estive numa conferência no México onde o representante
de Cuba anunciou que é desejo do seu governo fazer com que este país
seja o primeiro a estender a toda a população uma instrução
de nível superior. E para isto só é necessário vontade
política...
Claro que não vou ter a ingenuidade de querer comparar
o esforço financeiro que é necessário para levar a cabo
esta tarefa numa ilha com dez milhões de habitantes e num país
que é praticamente um continente. Mas devo reconhecer que a prioridade
do meu país é atender aos bancos quando eles estão na bancarrota,
não atendendo às necessidades educativas da população.
O pedagogo Paulo Freire tem uma presença forte na
sua obra. Que importância teve ele na sua formação e no
seu desempenho?
Muita. Eu conheci-o pessoalmente e tive a honra de ter um livro
prefaciado por ele. Eu costumo defender que algumas sociedades produziram, em
alguma altura, um grande estadista da educação, isto é,
alguém que pensou a educação no seu sentido mais amplo
e profundo. O Brasil produziu Paulo Freire.
Um dos meus actuais projectos passa por organizar um livro,
juntamente com outra brasileira e uma mexicana, sobre as matrizes do pensamento
educativo latino-americano, justamente através da recuperação
de grandes pensadores como Jose Martí, Maríategue e Paulo Freire.
Todos eles tinham essa perspectiva emancipatória, liberatória,
de construção de uma sociedade mais justa e igualitária,
e mais democrática, portanto.
Que herança legou ele no Brasil?
Existem aqueles, como eu, que o admiram e respeitam e se valem
do seu pensamento para melhor entender a educação no Brasil, e
existem aqueles que são muito críticos do Paulo Freire. Pessoalmente
- e posso correr o risco de ser injusta - acho que isso se deve a uma competição
muito forte entre os académicos, entre quem publica mais, quem recebe
mais convites, quem tem mais prestígio dentro e fora do Brasil. O ser
humano é invejoso; cada um traz dentro de si o melhor e o pior. E no
que se refere ao Paulo Freire esse sentimento é muito forte.
A educação popular baseia-se muito no pensamento
de Paulo Freire. Mas na universidade não são muitos os professores
que introduzem o autor na bibliografia que utilizam. Isto, porque existe habitualmente
uma leitura equivocada da sua obra, nomeadamente pela corrente conteúdista,
que supervaloriza o conteúdo e não percebe que tudo o que se faz
na escola está ligado à leitura do mundo. Na perspectiva de Paulo
Freire, a leitura do mundo vai-se aprofundando e ampliando a partir do que a
escola vai oferecendo ao aluno e que possibilitem um melhor conhecimento da
história, da geografia, da ciência, da arte ou da língua.
Ou seja, a leitura do mundo não é mais do que a capacitação
para melhor o compreender. Não há aqui nada contra a escola conteúdista.
A questão é como trabalhar o conteúdo e com que finalidade.
Isso é o que Paulo Freire discute.
Tem uma perspectiva política do trabalho docente
e afirma mesmo que "um professor não pode ser neutro". Essa posição
nunca lhe trouxe dissabores num Brasil que teve uma ditadura política
até meados dos anos oitenta?
Muitas vezes. E continuo a sentir. Mas o professor não
pode ser neutro, ele tem de fazer parcerias, aprender a identificar quais são
os seus companheiros nessa luta, porque sozinho ele fica muito vulnerável.
Eu sempre procurei estabelecer parecerias, exactamente por saber que o nosso
pensamento e a nossa prática nunca será hegemónica, pelo
menos na universidade.
Hoje no Brasil existe uma esquerda que é tão
ortodoxamente marxista e faz uma leitura tão sectária do Marx,
que se mostra incapaz de questionar o que Marx diria hoje se fosse vivo. Alguns
companheiros ficaram demasiado "presos" a uma leitura dogmática do autor
e aproximam-se, sem saberem, dessa face terrível do neo-liberalismo que
é o pensamento único. Nesse sentido, eu diria que eles são
a direita da esquerda. E dessa maneira vai-se criando no meio universitário
um conflito fora do lugar, porque em princípio eles não seriam
meus inimigos, mas frequentemente me encaram como tal por eu defender ideias
que não concidem com as deles.
Qual é o objectivo do grupo de pesquisa de alfabetização
das classes populares que ajudou a criar e organizar?
Esse grupo iniciou-se com a minha entrada na Universidade Federal
Fluminense. Até lá, fui professora primária, orientadora
educacional, tendo trabalhado nos diferentes níveis educacionais das
escolas do Rio de Janeiro. Nessa altura levava comigo não só um
forte compromisso com a escola primária, mas uma vivência política
que me fazia compreender que tudo o que se faz na escola tem um carácter
político, nada é neutro. Trazia também uma longa história
de acção e reflexão sobre a escola destinada às
crianças das classes populares, e aquele que é o grande "nó",
digamos assim, que é a alfabetização dos alunos das classes
populares. A minha tese de doutoramento foi dedicada a este tema, que eu considerava
"ainda um desafio". Quando entrei na universidade transformei a minha tese de
doutoramento num projecto de pesquisa, para o qual convidei três alunas
minhas. Esse grupo foi-se entretanto ampliando e já trabalhamos juntas
há mais de dez anos.
Entre nós existe uma preocupação e um
comprometimento comum pela alfabetização dos alunos das classes
populares, tanto mais se pensarmos que nos cursos de formação
as futuras professoras não são preparadas para lidar com este
tipo de alunos, mas com o aluno idealizado de classe média.
Branco e de origem urbana, possivelmente...
Branco, louro, de olhos azuis, que traz os mesmos valores e
o mesmo capital cultural que a escola ensina, que tem pais que o ajudam na aprendizagem...
Não é o menino que vem com o nariz escorrendo, que não
é bem cheiroso, que às vezes tem piolhos, que tem a pele marcada
pela pobreza. Mas esse aluno traz uma outra cultura, outra lógica, outro
capital cultural que a escola não consegue identificar...
Nem valorizar...
Exactamente... nem valorizar. O nosso trabalho pretende demonstrar
que esse menino também tem muitos conhecimentos que precisam de ser valorizados
- só para sobreviver na miséria é preciso ser-se muito
criativo e inteligente - tentando, na formação de novas professoras,
refazer as aprendizagens através de um planeamento, realização
e avaliação comum, e procurando introduzir na discussão
essa multiplicidade cultural cada vez mais presente na escola pública.
Outro dos pressupostos do seu grupo de trabalho é
que a escola pode funcionar como veículo de transformação,
nomeadamente através do que designa por "pedagogia ecológica multicultural".
Pode explicar-nos o que significa?
Eu não utilizaria o termo multicultural, porque ele
está impregnado de uma certa postura norte-americana associada às
escolas multiculturais, perpassando a ideia de que somos todos iguais. Não
é isso que eu defendo. Eu defendo que a escola deveria ser um espaço
de expressão e de respeito das diferenças. E se assim for ela
é um espaço de pluralidade cultural, sendo, portanto, um espaço
de confronto dos diversos olhares para a sociedade. É portanto um espaço
de riqueza e de pluricultura, e não de monocultura.
E como sou crítica em relação à
divisão disciplinar, defendo que o conhecimento no quotidiano nunca é
disciplinar, nem tão pouco o conhecimento de "ponta" é disciplinar,
ele é sempre transdisciplinar. E defendo que a escola deveria ser assim
também, porque partindo do que me foi dado a observar na minha pesquisa
e da minha própria prática de professora primária, na sala
de aula não se divide a aprendizagem em disciplinas, antes transversaliza-se
as disciplinas.
Aliás, esse é outro dos pressupostos do seu
grupo de trabalho: cursos de alfabetização não compartimentados
em disciplinas...
Exactamente. E quando trabalho com professoras alfabetizadoras,
ou futuras alfabetizadoras, tento sempre fazê-lo na perspectiva de que
o acto de alfabetizar deve ter um sentido muito mais amplo - que é afinal
o sentido freiriano. Assim, na minha opinião, não faz sentido
alfabetizar recorrendo a palavras e frases soltas, sem sentido para a criança,
mas sim a partir dos conteúdos de vida que ela traz, os seus conteúdos
alfabetizadores. Ela precisa entender que os conteúdos orais - aquilo
que ela traz falando - podem ser transformados em escrita. E que os transformando
em escrita, a possibilidade de ela comunicar é mais ampla; ela pode então
comunicar à distância e isso potencializa-a, sobretudo se ela é
originária das classes populares.
O que nós pretendemos é que as professoras se
apercebam que as pessoas não vão querer aprender o a,e,i,o,u se
isso não lhes disser nada. Pelo contrário, toda a gente vai ter
vontade de ver a história da sua vida escrita no quadro. E a partir daí
ir contando outras histórias e ensinando outras coisas. Um eclipse do
sol ou um acto eleitoral, por exemplo, podem constituir excelentes conteúdos
de alfabetização.
É o caso, por exemplo, de uma colega minha que trabalhava
numa favela do Rio de Janeiro, que sabendo do interesse dos meninos daquela
comunidade pelas actividades da escola de samba local lhes pediu para trazerem
os instrumentos de percussão para a aula. À medida que eles tocavam,
ela ia reproduzindo os sons no quadro negro e isso cativou-os. A professora
tem de ser criativa e ter sensibilidade para saber quais os interesses dos meninos,
tentando transformá-los em conteúdos de alfabetização
numa perspectiva de potencialização, para que eles queiram saber
mais. E, dessa forma, conseguirem uma melhor integração na comunidade
e sentirem-se mais capazes de terem uma actuação política
na sua comunidade e na própria sociedade.
Entrevista conduzida por Ricardo Jorge Costa
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