Página  >  Edições  >  -  >  Minorias: Esquerdas alternativas

Minorias: Esquerdas alternativas

O PARTIDO (DA) OVELHA NEGRA

Se existe aspecto que distingue o Partido Socialista Revolucionário das outras forças políticas é a imaginação. Seja ao serviço da campanha política ou na forma como abordam as questões, ela está sempre presente. E inconformismo, quante baste, que alia a um combate político persistente. Um partido, afinal, que assume a utopia e não tem medo de a concretizar.

A sua história liga-se intimamente ao percurso da Liga Comunista Internacional. Formado a partir de um congresso realizado em 1973, este movimento congregava pessoas dos mais variados quadrantes sócio-profissionais, cedo se destacando por uma forte intervenção de carácter social junto das camadas mais desfavorecidas da população e pelo apoio às comissões e associações de cidadãos.

Alda Macedo, actualmente professora de Inglês numa escola do Porto, estudava em Coimbra naquela altura. Lembra-se do combate político naquela cidade ser diferente dos restantes, assumido por uma base essencialmente estudantil e próxima do pensamento Trotskista, mas contando igualmente nas suas fileiras com todas as pessoas dispostas a cumprir os mesmos objectivos, desde operários a camponeses, passando por pessoas que simplesmente clamavam por uma mudança na maneira de se fazer política.

"Não era um movimento fechado em si mesmo", refere, "porque estávamos profundamente envolvidos com a população, lutando ao seu lado". A ocupação de casas, por exemplo, como a que ocorreu em Verride, aldeia situada nos arredores daquela cidade, em 1975, é um exemplo dessa cooperação.

Alda conta como as pessoas dessa localidade queriam apropriar-se de uma casa desabitada, para aí instalar um posto de saúde e uma escola, tendo solicitado a ajuda dos seus elementos para participar na sua reconversão. Era uma casa enorme, para o qual foi necessário efectuar uma longa listagem, contendo elementos acerca do recheio contido no seu interior, antes de o retirar". Com algum esforço e boa vontade, ambos os equipamentos puderam entrar em funcionamento e os lugares foram preenchidos por médicos e professores voluntários.

O posterior desenvolvimento político e ideológico dos núcleos da LCI, principalmente enraízados em Coimbra, Porto e Lisboa, levou a que, em 1978, após um congresso conjunto com o Partido Revolucionário dos Trabalhadores, as duas organizações se decidissem pela fusão num único movimento e formassem o Partido Socialista Revolucionário, onde o trotskismo evoluiria como ponto de referência fundamental.

Desde essa altura, os congressos realizam-se cada dois anos e trazem para discussão todos os temas que se considera terem importância para o campo de acção do partido, tentando estabelecer um consenso e definir possíveis estratégias de actuação. Um espaço de debate, considerado por Alda Macedo como "uma forma de reequacionar o sistema e o interior da própria estrutura, bem como uma reinvenção indispensável ao combate das velhas fórmulas propostas pelas maiorias e à degradação das condições sociais e laborais".

"A tradição de combate pela democracia é uma das batalhas mais caras ao PSR", afirma, porque não se pode construir uma alternativa sem uma participação democrática no interior do próprio partido". O direito de tendência é, por isso, uma norma consagrada nos estatutos, permitindo aos participantes agrupar-se por tendências de opinião e defender as teses que considerem mais válidas.

"É exactamente através desse direito em estabelecer diferenças, que conseguimos garantir a nossa coesão", explica. A mascote utilizada na última campanha eleitoral, uma ovelha negra associada a mensagens 'desviantes' em relação aos estereótipos partidários e apelando a uma nova atitude face às situações impostas, é disso mesmo um exemplo.

"Ninguém é imprescindível para a construção do socialismo..."

A estratégia para as eleições autárquicas ainda não se encontra definida. Apenas uma coisa é praticamente certa: o PSR concorrerá coligado com a Política XXI em todos os círculos em que se apresente. Mais uma vez Lisboa é a grande aposta mas, após uma experiência em que integraram a coligação Por Lisboa, com PS, PCP e Verdes, os elementos do partido decidiram-se por uma nova alternativa.

"O lado mais positivo dessa tomada de posição foi permitir que pudessemos voltar a ter um espaço de intervenção diferente. Constituir uma esquerda que não se revê nas tendências evidenciadas tanto por PS como por PCP, e em que a participação conjunta com outra força se revele como uma união de pessoas e de vontades, em defesa de ideias que consideram certas, sem assinar acordos de ratoeira para ganhar mais um voto aqui ou ali...".

"Principalmente", afirma ainda, "não pretendemos ser uma esquerda tipo "Grilo de Pinóquio", seduzidos pelo aparelho de Estado e submissos à sua organização e forma de representação. Não concordamos com a perspectiva burguesa e pomposa dos órgãos de poder, nomeadamente a Assembleia da República, onde se procede à identificação e se penaliza criminalmente quem protesta". Neste sentido, não pretendem mais do utilizar os meios que o Estado concede a partir das suas instituições, e colocá-los ao serviço dos direitos dos homens e mulheres que trabalham".

Assim, o papel que o PSR pretende desempenhar, e que considera ser dever de toda a esquerda assumir, passa por demonstrar que a atitude mais sensata está em exigir 'para ontem' o que as maiorias dizem ser impossível: travar o percurso suicida da sociedade de consumo e todas as implicações que o sistema exerce sobre as minorias, os excluídos, o ambiente e os recursos do planeta.

"A actual escalada demonstra que é preciso tomar uma atitude diferente, impôr a redução do consumo, optar por energias alternativas e alterar os modos de produção. As pessoas cada vez mais se dão conta disso e começam a aperceber-se que a sua viabilidade é política. mas tal não se compadece com esta teoria neoliberal e capitalista de organização social e económica.

"É a este nível que queremos agir, mas consciencializando as pessoas, fazendo-as pensar que é a nossa própria sobrevivência que começa a estar em risco, levando-as a actuar". É por estas estas razões que a esquerda não pode constituir apenas uma voz da consciência e partir do princípio que ninguém é imprescindível para a construção do socialismo. Tem de ser activa, para executar essas tarefas e representar um exercício de poder diferente, que seja realmente alternativo.

Ricardo Jorge Costa


  
Ficha do Artigo
Imprimir Abrir como PDF

Autoria:

Ricardo Jorge Costa
Jornalista do Jornal A Página da Educação
Ricardo Jorge Costa
Jornalista do Jornal A Página da Educação

Partilhar nas redes sociais:

|


Publicidade


Voltar ao Topo