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Novas políticas sociais novas: entre belas e senãos (I acto)

Do título desta sumária reflexão, pode desde logo descortinar-se dois dilemas sobre o tema. Primeiro: foi difícil escolher onde colocar o designativo de "novo" por relação às políticas sociais na actualidade, isto é, se (só) começam por se afirmar novas ou se conseguem ser novas nos resultados finais. Segundo: suspeitou-se que às suas belas virtudes (públicas) se associam senãos que podem mesmo ser vícios (mais ou menos privados?).
É difícil definir um quadro consensual de traços definidores das políticas sociais tal como se têm vindo a reconfigurar neste ciclo posterior ao modelo de orientação universalista e sob responsabilidade pública. Várias são as razões que justificam a dificuldade para delinear esse eventual corpo identitário, razões essas que vão desde a história diversa de cada um dos sistemas de bem-estar até à panóplia de caminhos (mais do que soluções) encontrados para reagir à designada crise dos sistemas anteriores. Apesar desta constatada dificuldade, é desafiante elencar alguns dos eixos do denominador comum onde se abrigam estas "novas políticas sociais novas".
Em primeiro lugar o seu estatuto reivindicado de políticas amigas da equidade. Este "novo" estatuto perfila-se como o garante de uma "nova" orientação que escolhe "nov@s" destinatári@s: de entre tod@s escolhem-se @s que não podem dispensar os apoios (também chamados de benefícios) administrados. A prioridade sustenta-se? na sustentabilidade que se agenda como questão central. Olhando para o lado dos senão, é inevitável perguntar por onde passa a linha que separa @s que são arredad@s dos apoios, daqueles/as que se tomam com o estatuto de suficiência? Como se avalia/mede a (in)suficiência? Que clareza acompanha estes critérios? Como são apropriados nas diversas áreas, instituições e profissionais de que depende o complexo composto do bem-estar?
Uma outra "nova" característica reside na "nova" territorialização destas novas políticas, isto é, as políticas mudam de lugar ficando tensionadas entre "novos" locais ? o subnacional e o supranacional. A inscrição dos países em ou sob a égide de espaços supranacionais não é mais uma escolha, mas é uma "nova" regra de regulação mundial. Nesta "nova" pertença, os antecedentes de relação com as questões sociais e de administração da justiça social têm notórias repercussões. O modelo social europeu é um exemplo e teste sobre as belas e os senãos desta "nova" fonte de influência sobre as questões sociais ? influência que vai desde a forma como são vistas essas questões até às guidelines que se exemplificam através de "novas" (e/ou boas) práticas. E vale interrogar, qual a fonte destas "novas" aprendizagens? Que papel tem/pode ser desempenhado pelos países de contido historial no campo do bem-estar?
Pensando, por lado, no espaço local, constata-se que muitas são as virtudes que lhe são atribuídas, desde logo pela "nova" proximidade face aos problemas e aos/às cidadãos/cidadãs e, por isso, até se esperar que ocorram "novas" dinâmicas vai só um passo. Mas como contra-agir face ao eventualmente mais feroz controle social, cultural e de modos de vida e de viver proporcionado por esta proximidade? Como se conjugam os verbos participar e reconhecer (nas diferenças) a nível local?
O experimentalismo social das "novas políticas sociais novas" é uma sua face enfatizada e enaltecida, designadamente para contrariar os efeitos de outras medidas que teimaram em não mudar, mesmo quando as circunstâncias o estavam a evidenciar. O carácter imobilista e fracamente adaptativo dos sistemas de bem estar são, hoje, desafiados por um ambiente de experiência, de que o trabalho por projectos é um dos campos de expressão. Vários senãos se perfilam em forma de pergunta, a saber: Como combinar experimentalismo e garantia de acesso aos bens básicos? Como se forma/prepara para o experimentalismo social, isto é, quais são as condições de desenvolvimento e sustentação de um ambiente que em permanência acolhe a vantagem de fazer e pensar "novo"?
Um outro eixo das "novas políticas sociais novas" refere-se ao interesse expresso (e feito acto) nos procedimentos de avaliação e monitorização. Buscar a garantia de que se está a desenvolver o adequado, com os recursos adequados e chegando aos/às cidadãos/cidadãs adequad@s são apenas algumas das questões que se mantêm sob observação. Todavia, importa lembrar que foi sob o governo Thatcher que o uso recorrente de avaliações se veio a desenvolver tendo como interesse central o muito desejado corte de despesas e dos direitos sociais em vigor. Para combater alguns senãos, importará saber como avaliar a avaliação e como fazê-la amigável da palavra dos cidadãos (que é como quem diz, tirar as avaliações do lugar tecnicista e longínquo em que, nalgumas vezes e nalguns lugares, se têm colocado). 

Mal fora que com estas duas linhas se alinhassem as BELAS e os SENÃOS das "novas políticas sociais novas"?e por isso voltaremos ao tema (no Acto II).

Fernanda Rodrigues


  
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Edição:

N.º 175
Ano 17, Fevereiro 2008

Autoria:

Fernanda Rodrigues
Univ. do Porto, FPCE
Fernanda Rodrigues
Univ. do Porto, FPCE

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