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Resposta em tempo útil é fundamental na prevenção do acto suicida

Consultas de intervenção em situações de crise têm aumentado oferta

A Página entrevistou para este dossier o psiquiatra Bessa Peixoto, coordenador da consulta de prevenção do suicídio do Departamento de Psiquiatria do Hospital de S. Marcos, em Braga, e presidente da Sociedade Portuguesa de Suicidologia.
Em declarações ao nosso jornal, este especialista mostra-se cauteloso na análise dos dados que mostram uma aparente diminuição das taxas de suicídio em Portugal e afirma que têm sido dados passos significativos na criação de mecanismos de prevenção.

Quando foi fundada a Sociedade Portuguesa de Suicidologia e que objectivos estiveram na sua origem?

A Sociedade Portuguesa de Suicidologia (SPS) foi constituída em 2000 e partiu da iniciativa de um grupo de pessoas que vinha trabalhando nesta área de uma forma dispersa e sentia a necessidade de conglomerar interesses, ideias e motivações de forma a fazerem emergir a investigação relativa aos comportamentos suicidários de uma forma mais metódica. Neste sentido, a SPS realiza anualmente um congresso onde são apresentadas e debatidas reflexões sobre diferentes temáticas ligadas ao suicídio.

A SPS lançou recentemente a obra "Comportamentos Suicidários em Portugal". O que é abordado mais especificamente neste livro?

Este livro aborda os comportamentos suicidários num sentido lato e transversal, focando desde os aspectos históricos, filosóficos e conceptuais do suicídio, até aspectos sociais e culturais ? nomeadamente no que se refere à abordagem do suicídio nos meios de comunicação social ?, passando ainda pela análise da situação clínica ligada aos comportamentos suicidários, as situações de risco, o contexto familiar e as metodologias de investigação dos comportamentos suicidários nos jovens e nos adultos.
Em poucas palavras, pode dizer-se que se trata de uma obra didáctica, abrangente, escrita por 27 autores que trabalham nesta área desde há vários anos e que nela fazem uma análise dos dados epidemiológicos registados em Portugal.

De acordo com números da Organização Mundial de Saúde, Portugal tem assistido a uma diminuição das taxas de suicídio ao longo dos últimos anos ? ela é praticamente metade da registada em meados dos anos oitenta. A que se deve esta evolução?

Não creio ser seguro afirmar-se que existe uma diminuição tão pronunciada. É verdade que as variações anuais têm sofrido algumas flutuações, mas fazendo uma análise global das últimas duas décadas verificar-se-á que não existem grandes oscilações, tanto a nível nacional como entre o norte e o sul do país.
O que sabemos, de facto, é que Portugal tem baixas taxas de suicídio, tal como acontece com os outros países da faixa mediterrânica, sobretudo se tivermos como termo de comparação os países do norte, centro e leste europeu.
Sabemos também que nos últimos anos existe uma tendência para a estabilização das taxas de suicídio no país, com uma taxa média que rondou os 5,9 suicídios por cada cem mil habitantes entre 1992 e 2000.

Como se explica a diferença registada entre o norte e o sul de Portugal?

Apesar de não pretender constituir uma explicação científica, alguns especialistas consideram que os fenómenos associados ao isolamento social e à desertificação podem ter algum contributo na explicação essa diferença. Por outro lado, a crença religiosa, mais presente no norte do país, é muitas vezes considerada como um factor atenuador do suicídio.

Qual tem sido a evolução das taxas de suicídio em Portugal desde 2000?

A SPS está a avaliar os dados disponíveis relativamente aos últimos seis anos, pelo que dentro em breve teremos algumas respostas. Existe uma análise fidedigna do período compreendido entre 1992 e 2000, mas para termos uma imagem igualmente fiável do período mais recente é necessário proceder a uma análise atempada.

Considera que o actual contexto de crise social e económica poderá, de alguma forma, contribuir para o aumento dos casos de suicídio?

Quando falamos de comportamentos suicidários não podemos considerar na sequência lógica de análise apenas um factor, porque eles são resultantes de uma série de condições que devem igualmente ter em conta a sua evolução temporal. É o conjunto desses factores ? desde os pessoais aos biológicos, de personalidade e até de doença, os chamados factores predisponentes e factores precipitantes ? que podem despoletar uma crise.

Referiu recentemente que a grande aposta neste domínio deverá passar por ?estimular a investigação numa perspectiva de prevenção?. O que tem sido feito para concretizar esse objectivo?

Um dos pontos positivos a realçar é o facto de se ter assistido a um aumento da oferta de consultas de intervenção na área dos comportamentos suicidários, através de unidades sem listas de espera que atendem as pessoas numa crise de suicídio ou após um gesto suicidário.
Esta resposta em tempo útil é um aspecto fundamental na prevenção, porque está comprovado existir um grande risco de se verificar uma segunda crise de suicídio nas 48 ou 72 horas seguintes à primeira tentativa.
Se as estruturas de saúde pública tiverem um olhar mais direccionado para estes casos estará a dar-se o primeiro grande passo no que diz respeito a uma maior prevenção do suicídio. Neste aspecto a evolução tem sido positiva, já que tem existido iniciativa no sentido de aumentar a oferta deste tipo de serviço.

Entrevista conduzida por Ricardo Jorge Costa


  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 157
Ano 15, Junho 2006

Autoria:

Bessa Peixoto
Coordenador da consulta de prevenção do suicídio do Departamento de Psiquiatria do Hospital de S. Marcos, em Braga, e presidente da Sociedade Portuguesa de Suicidologia.
Ricardo Jorge Costa
Jornalista do Jornal A Página da Educação
Bessa Peixoto
Coordenador da consulta de prevenção do suicídio do Departamento de Psiquiatria do Hospital de S. Marcos, em Braga, e presidente da Sociedade Portuguesa de Suicidologia.
Ricardo Jorge Costa
Jornalista do Jornal A Página da Educação

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