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Um currículo diferenciado, em percursos equivalentes

O futuro sistema escolar não pode continuar a repousar no currículo unificado(1). A sua base deve assentar num currículo comparável(2). Este currículo deve dispor de um núcleo comum a ser estudado por todos os alunos. Deste núcleo faz parte o conhecimento e o uso da língua mãe, o estudo da organização política e da história do país e do mundo, bem como uma língua estrangeira à escolha do aluno. É em torno deste núcleo que o aluno, com apoio de pais e professores, estruturará o seu currículo para o sucesso.
Não é permitido que um aluno transite de ano sem obter sucesso na aquisição dos conteúdos de todas as disciplinas que escolheu. É permitido que mude de disciplinas. E é considerado normal que em relação a uma ou outra disciplina, cujo conteúdo não adquiriu com sucesso ao longo do ano, possa tentar resolver o problema em cursos de Verão para isso organizados. 
Este é um modelo que, em parte, está já em prática no ensino secundário, onde os alunos, ao escolherem um determinado número de disciplinas, não ficam numa situação de vantagem ou desvantagem em relação àqueles que escolhem um conjunto de disciplinas diferentes.
Para compreender o alcance desta proposta, é preciso aceitar, acima de tudo, que os alunos não são todos iguais e que não têm os mesmos interesses. O que a realidade nos mostra é que quando colocados sob a obrigatoriedade de aprenderem rigorosamente as mesmas matérias, há um pequeno grupo que irá corresponder a esse modelo, um grupo pouco maior que o primeiro que irá responder medianamente e uma maioria que não vai conseguir responder porque não se identifica com essas exigências e, por isso, acaba por abandonar o sistema escolar.
O currículo unificado é, em grande parte, o responsável pelas elevadas taxas de insucesso dos alunos portugueses. Acresce que o actual currículo está desactualizado. A sua estrutura continua fiel ao velho Iluminismo dos séculos XVIII e XIX. A ciência e a tecnologia, o saber, é hoje muito diferente. O lugar dos diversos saberes na nova sociedade já não é o mesmo. Surgiram novos conhecimentos. O conhecimento cresce a uma velocidade sem paralelo ao tempo da fundação do velho sistema educativo. A configuração do currículo e o acesso ao conhecimento por parte das novas gerações tem de ser diferente.
Importa, pois, repensar o currículo. E é fundamental ter em conta a diversidade dos alunos que hoje chegam à escola. Já não chegam só alguns, chegam todos. Já não se pretende seleccionar e eliminar, o que se quer é dar a cada um a oportunidade de desenvolver ao máximo as suas potencialidades. E tanto importa que as potencialidades de um aluno sejam maiores no campo da matemática, da música, da física ou da filosofia. Importa é que, por causa do dogma do currículo unificado, os alunos sejam condenados a percursos escolares de insucesso.
Que valor tem para a matemática, para o aluno e para a sociedade, que um aluno adquira o certificado do 9º ano de escolaridade sem ter tido, ao longo do seu percurso escolar, uma só classificação positiva a matemática? Não seria mais racional tê-lo deixado trocar matemática por biologia ou por música? Não teria sido melhor para todos uma história escolar de sucesso? E permitir a um aluno que não tem sucesso numa disciplina trocá-la por outra não permitirá que os que ficam nas disciplinas desejadas aprendam com mais eficiência?

(1) Aqui tido como um currículo em que todos os alunos têm obrigatoriamente de estudar rigorosamente as mesmas disciplinas e ser submetidos rigorosamente às mesmas formas de avaliação.

(2) Currículo comparável é aquele em que o aluno, tendo o mesmo número de disciplinas e a mesma carga horária, escolhe as disciplinas, a partir de um amplo leque de oferta, em função dos seus interesses. As disciplinas têm todas o mesmo valor educativo. Os métodos de avaliação e a certificação são semelhantes para todos os alunos.

Recolha: Ricardo Jorge Costa

Organização do texto: Ricardo Jorge Costa e José Paulo Serralheiro


  
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Edição:

N.º 142
Ano 14, Fevereiro 2005

Autoria:

Redacção

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