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O papel da oposição no Parlamento não é fácil?

O trabalho que se realiza no Parlamento é mal conhecido pelos cidadãos. Geralmente, apenas chegam ao conhecimento público  alguns debates parlamentares mais acesos e o resultado da produção legislativa. Mas a vida parlamentar é muito mais do que isso e, no caso da educação, o papel da oposição não é fácil?
Aos deputados cabe  fiscalizar a actividade do Governo e  os deputados da oposição procuram por todos os meios exercer esse papel. Só que os deputados da maioria PSD/PP  não têm permitido que tal aconteça nos últimos meses.
Como é possível que, procurando esclarecimentos sobre a acção do Governo relativamente à colocação de professores, desde Maio e das primeiras confusões com as listas, os deputados da maioria PSD/CDS-PP rejeitem  sistemática e liminarmente todas as propostas da oposição?
Para que os leitores possam avaliar por si próprios a natureza do trabalho parlamentar que é feito no âmbito da fiscalização da acção do Governo e que encontra sistematicamente um ?NÃO? redondo da maioria,  seleccionei dois pequenos mas significativos exemplos que retractam como o papel da oposição no Parlamento não é fácil?
Durante o mês de Agosto, anunciando-se uma situação de caos para o início do ano lectivo, os deputados do Partido Socialista propuseram um projecto de Resolução com o simples propósito da Assembleia da República ser atempada e devidamente informada da dimensão real dos problemas no desenvolvimento do processo de colocação de professores.
Extracto do Projecto de Resolução 274/IX/2 ? REJEITADO a 2 de Setembro
?Considerando que o País continua a assistir, estupefacto, aos resultados práticos de medidas,  que já no ano passado provocaram erros no processo de colocação de docentes, mas que agora comprometem definitivamente a abertura do ano lectivo de 2004/2005, impedindo uma adequada preparação do ano escolar, prejudicando gravemente a  estabilidade de alunos, professores e de encarregados de educação e fazendo retroceder a situação das escolas a décadas passadas;
Considerando que, em uníssono, os sindicatos de professores e as associações de pais denunciam o desrespeito, a irresponsabilidade e a incompetência do ME em todo este processo;
Considerando que as listas definitivas de colocação de professores nos quadros de escola e nos quadros de zona pedagógica foram finalmente publicadas mas com um atraso na ordem dos 3 meses e que hoje, dia 2 de Setembro de 2004, o processo de concursos para o ano lectivo 2004/2005 ainda está longe de ficar concluído;
Considerando que este grave problema ? que, pelas suas dimensões e pelo clima de insegurança e de ansiedade que tem criado na comunidade educativa ? não pode nem deve ser entendido, como pretende o Governo e a maioria parlamentar que o sustenta, como o resultado de um mero erro informático, mas sim de um sério problema político, que resulta da postura governamental e do Ministério da Educação em particular, que tem assumido, nos dois anos e meio que leva de exercício de funções, uma total incapacidade de execução das suas próprias políticas e uma enorme irresponsabilidade quando desmonta e interrompe, sem uma avaliação credível dos resultados, a maior parte dos programas e modelos de gestão educativa em vigor;
Nestes termos, a Assembleia da República delibera emitir as seguintes recomendações no âmbito das suas competências de acompanhamento e controlo da acção do Governo:
Deve o Governo enviar à Assembleia da República, até 30 de Outubro de 2004, um relatório em que se analise de forma rigorosa e exaustiva todo o processo de selecção e colocação de docentes para o ano lectivo de 2004/2005, identificando as deficiências que motivaram todo o atraso verificado no referido processo, promovendo uma avaliação do impacto da legislação aprovada, designadamente do Decreto-Lei n.º 35/2003, de 27 de Fevereiro, com alterações do Decreto-Lei n.º 18/2004, de 17 de Janeiro e os eventuais responsáveis.
 Deve o Governo enviar à Assembleia da República, até 30 de Outubro de 2004, uma tabela de que constem o número de reclamações apresentadas, o número de reclamações deferidas e indeferidas, o número de providências cautelares interpostas de que o Ministério da Educação foi notificado e o número de recursos hierárquicos apresentados à Administração Educativa por parte dos opositores ao concurso;
Deve o Governo enviar à Assembleia da República, até 10 de Setembro de 2004, uma calendarização rigorosa de todo o processo de colocação de docentes ainda por concluir;
Que se promova uma auditoria externa a todo processo de colocação de docentes para o ano lectivo de 2004/2005, realizada nas suas diversas vertentes, política, legislativa, administrativa e financeira.?
Já no dia 22 de Setembro, ultrapassada que estava a data definida pelo Governo para o início do ano lectivo, os deputados do Partido Socialista propuseram um Voto de Protesto para sublinhar a preocupação de todos os Deputados com a situação vivida e manifestarmos a nossa solidariedade às  escolas e famílias, ao país, em suma.
Extracto do Voto de Protesto n.º 202/IX/3 ? REJEITADO a 23 de Setembro
?O arranque do ano lectivo de 2004-2005 em todo o ensino básico e secundário encontra-se irremediavelmente comprometido. O processo anual de colocação de professores e início das aulas era uma rotina consolidada no nosso sistema há vários anos, rotina essa que foi seriamente abalada neste ano lectivo.
Por causa de uma decisão do Governo, anunciada como uma melhoria para o sistema educativo, vivemos, afinal, o caos absoluto, com efeitos negativos imediatos para alunos, pais e professores. (?)
O novo modelo de colocação de professores decidido pelo Governo não se mostrou capaz de cumprir nenhum objectivo para o qual foi anunciado. Pelo contrário, veio impedir o normal funcionamento do sistema educativo e isto é intolerável.
São situações como esta que não garantem o direito ao ensino para todos e que não cumprem os objectivos de um sistema educativo fiável e estável, tão necessário à qualificação dos portugueses. (?)
Nestes termos, os Deputados do Partido Socialista abaixo assinados, apresentam, (?) o presente protesto contra a não abertura do ano lectivo nas datas definidas pelo Governo, com uma séria e inaceitável penalização dos alunos, pais, professores e escolas na preparação dos trabalhos educativos.?
Penso que a rejeição destas iniciativas retracta como está comprometido o normal exercício da função parlamentar de fiscalização da acção do Governo por parte da Assembleia da República . Como podem os Deputados fiscalizar o Governo se tudo é rejeitado? O exercício déspota do poder parlamentar por parte dos deputados da maioria fere seriamente os princípios da sã convivência democrática entre as forças políticas presentes na Assembleia. Não nos é possível discutir o cerne das questões prementes que assolam o país porque a rejeição sistemática das iniciativas da oposição o não permite. Quem sofre somos todos nós, quem sofre é a educação, quem sofre é a escola pública, quem sofre é o país.


  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 138
Ano 13, Outubro 2004

Autoria:

Ana Benavente
Deputada do Partido Socialista. Professora.
Ana Benavente
Deputada do Partido Socialista. Professora.

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