Para situar a extinção do INAFOP
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Para situar a extinção do Instituto Nacional de Acreditação da Formação de
Professores (INAFOP) (...) será oportuno enquadrar politicamente a metodologia
da acreditação que, para o efeito, aquela entidade já começara a implementar...
- Quando foi criado o INAFOP (Instituto Nacional de Acreditação da Formação
de Professores), um conhecido sindicalista declarou ao "Diário de Notícias"
que a formação de professores não estava a dar resultados positivos e que
todas as tentativas feitas, até então, para regular os cursos de formação
de professores "falharam porque há muitos lobbies"; prognosticou, ainda,
desde logo, que o sistema de acreditação iria "enfrentar sempre muitos problemas".
Para situar a extinção do Instituto Nacional de Acreditação da Formação de
Professores (INAFOP), cuja missão era garantir à sociedade a adequação dos
cursos de formação de professores às exigências do desempenho docente nas
escolas, será oportuno enquadrar politicamente a metodologia da acreditação
que, para o efeito, aquela entidade já começara a implementar, estando em
curso a apreciação das candidaturas à acreditação requeridas por 66 licenciaturas
que preparam educadores de infância e professores do 1º ciclo, processo também
cancelado.
- Uma questão política com que qualquer Ministério da Educação se confronta
é a da identificação de quem está devidamente preparado para ensinar, de modo
a poder ser admitido para o exercício da docência. Cabe-lhe esta responsabilidade
porque tutela a política de educação básica e de ensino secundário e, além
disso, no nosso país, é o empregador dos professores de cerca de 90% das crianças
e jovens que frequentam a educação pré-escolar e os ensinos básico e secundário.
Esta questão é, em geral, resolvida por um de dois sistemas externos às instituições
de formação, sem prejuízo de haver quem utilize os dois em complementaridade:
(i) reconhecimento ou certificação da preparação de cada diplomado;
(ii) reconhecimento dos cursos que habilitam os respectivos
diplomados para a docência, confiando na certificação de cada um, efectuada
pela instituição de formação.
- Entre nós, o primeiro sistema vigorou antes de 25 de Abril, com o exame
de Estado. Depois, optou-se pelo reconhecimento de cursos. Mas, neste caso,
as metodologias escolhidas foram variando.
Até há pouco tempo, na prática, este processo tem estado implícito na via
conducente ao reconhecimento de um curso como conferindo um grau académico,
sem que, no entanto, a sua adequação à preparação para a docência seja objecto
de análise específica pelo Ministério da Educação.
Em 1995, foi introduzido um aperfeiçoamento neste sistema pela então ministra
Ferreira Leite: foram definidas as disciplinas e respectivas cargas horárias
que os cursos deviam integrar para serem reconhecidos. A vigência deste diploma
legal do Governo social-democrata foi suspensa, poucos meses depois, pelo
Governo socialista, que elaborou um novo projecto, mantendo, no entanto, o
mesmo sistema de reconhecimento.
Foi no parecer sobre este projecto que o Conselho Nacional de Educação criticou
a metodologia do sistema de reconhecimento de cursos, inclusive a delineada
pela ministra Ferreira Leite. A principal crítica foi a de que uma metodologia
baseada nas designações das disciplinas não permitia ajuizar, efectivamente,
sobre a substância da formação proporcionada e, portanto, sobre a sua adequação
às exigências do futuro desempenho docente. É, de facto, uma metodologia nominalista.
Em alternativa, o CNE aconselhou a metodologia da acreditação profissional
de cursos, enunciando as principais características desta. Foi o ministro
Marçal Grilo que teve a coragem política de impulsionar, com o acordo do CRUP
e do CCISP, a criação desta metodologia, mais exigente e adequada do que as
anteriores, tendo o Governo confiado o seu desenvolvimento a uma entidade
independente, socialmente participada, o Inafop, agora em vias de extinção.
- Ao longo do desenvolvimento desta metodologia, houve quem invocasse que
era incompatível com a autonomia do ensino superior e também uma duplicação
do respectivo sistema de avaliação; diga-se de passagem, que nunca foi explicado
como é que, sendo uma a duplicação do outro, apenas a acreditação era incompatível
com a autonomia...
É sabido que a autonomia do ensino superior se refere às suas competências
e que, entre elas, não se encontra, em qualquer parte do mundo, a de regular
o acesso ao exercício de uma actividade profissional, quer se trate de engenheiros,
de arquitectos ou de professores. Quanto ao nosso sistema de avaliação do
ensino superior, é conhecido que não tem as características consideradas,
internacionalmente, indispensáveis para dar garantias à sociedade da adequação
dos cursos às exigências do desempenho docente; tem sim outras funções não
menos relevantes socialmente.
De facto, a acreditação profissional pode constituir uma ameaça a interesses
corporativos, laborais ou económicos de alguns que, pretextando a defesa de
valores de interesse público, obscurecem desta forma o reconhecimento dessa
ameaça. Mas é também verdade que é ao Estado que compete defender o interesse
público.
- Quanto ao futuro ( pois o problema a resolver não desapareceu ( caso se
continue a optar pelo sistema de reconhecimento de cursos, não se justifica,
nem é necessário, recorrer novamente a uma metodologia nominalista, que, aliás,
seria muito bem aceite, porque é irrelevante. Também é possível que a acreditação
de cursos venha a ser substituída pelo regresso ao primeiro dos sistemas
acima referidos: a já anunciada certificação externa da qualificação docente
de cada diplomado através de exames ou de outros métodos, sendo certo
que não é fácil construir metodologias credíveis para tal...Há que aguardar.
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Ficha do Artigo
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Edição:
Ano 11, Junho 2002
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Autoria:
Univ. do Porto; Presidente do Instituto Nacional de Acreditação da Formação de Professores (INAFOP)
Univ. do Porto; Presidente do Instituto Nacional de Acreditação da Formação de Professores (INAFOP)
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