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O Charme Indiscreto de Jeanne Moreau

Escreveu-se mais de Jeanne Moreau do que qualquer outra actriz francesa, talvez com excepção de Brigitte Bardot. Celebrada como "La Grande Dame" do cinema francês, ela também encarna a ideia sedutora da feminilidade francesa particularmente poderosa fora de França. Moreau está associada à sexualidade, mas também, à inteligência, profundidade e maturidade. Ao contrário de Martine Carol ou Bardot, essencialmente "Stars", ou Catherine Deneuve e Simone Signoret, que juntaram arte com cinema popular, Moreau apareceu no início de carreira em filmes de autor - com realizadores franceses como Louis Malle e François Truffaut e personalidades internacionais como Luis Buñuel, Michelangelo Antonioni, Joseph Losey, Orson Wells e Rainer Werner Fassbinder.
A carreira cosmopolita de Jeanne Moreau foi ajudada, sem dúvida, pelo seu inglês fluente, legado pela sua ascendência franco-britânica. Desde 1949 fez mais de 100 filmes, e desempenhou um papel importante na indústria cinematográfica. Envolveu-se em muitos festivais (incluindo Cannes, a cujo júri presidiu em 1975), liderou a poderosa comissão de avanços sobre receitas em 1993, e trabalha regularmente com a Equinox, uma organização que ajuda jovens argumentistas. Gravou algumas canções e dirigiu dois filmes - assim como um documentário sobre Lilian Gish (1984) e um vídeo sobre o cantor Khadja Nin (1998).
Tudo isto são demonstrações da energia e empenho de uma mulher cujo talento e profissionalismo foram reconhecidos - ganhou o prémio para melhor actriz em Cannes em 1960, recebeu um César para actriz principal em França e o Leão de Ouro em Veneza pela carreira em 1992, é doutora "honoris causa" pela Universidade de Lancaster e recebeu o "Life Tribute" da Academia Americana. Mas Moreau fascina principalmente como imagem de feminilidade, ainda rodeada por uma aura sexual, apesar dos seus 70 anos. Esta imagem foi criada pelos seus filmes dos anos 50 e 60 - apesar de ter sido considerada pouco fotogénica em comparação com Deneuve - e o seu apelo cresceu numa indústria conhecida pela sua pouca consideração pelo envelhecimento das mulheres.
Moreau estudou no Conservatório de Paris, e depois foi para a Comédie Française e para o Théatre National Populaire, onde contracenou e se destacou ao lado de Gérard Philipe, este treino deu ao seu considerável talento uma experiência profissional que faltava às actrizes do seu tempo (p.ex. Bardot veio da dança e Karina era modelo). Antes de ser protagonista nos filmes de Louis Malle "Ascenseur pour L'échafaud" e "Les Amants", ambos de 1958, já tinha aparecido em mais de 20 filmes em pequenos papéis.
O cinema da Nouvelle Vague, de que os dois filmes referidos são prenúncio, requeria um novo modelo de actriz que o diferenciasse de tudo o que tinha sido feito até aí. A Nouvelle Vague era autenticidade, juventude e modernidade, e exigia qualidades similares aos seus actores. Moreau protagonizava a "anti-star", e ela e Malle "mataram" a sua anterior carreira enfatizando a ideia do seu "renascimento". Moreau começou a trabalhar numa base mais informal com a equipa, como se fossem uma família empenhada num trabalho artesanal. Como ela disse aos "Cahiers du Cinéma" em Janeiro de 1965: "fazer cinema já não é uma forma de representar, é uma forma de vida".
O seu conhecido romance com Malle - e subsequentes relações com outros realizadores - prefiguraram outros casais do cinema como Jean Luc Godard - Anna Karina. Durante a sua carreira manteve relações de amizade com os seus realizadores favoritos: Truffaut, Duras, Wells.
Moreau trouxe para o cinema um tipo físico mais autêntico, menos abertamente sexy que Bardot, Carol ou Monroe. Ela era mais morena do que aquelas deuses louras, e quando apareceu com o cabelo platinado no filme de Jacques Demy "Baie des Anges" (1962) foi para fazer deliberadamente o contraponto.
O "New Look" de Moreau trazia novos valores: maturidade e uma nova sexualidade, tão diferente das das suas predecessores como das de Bardot ou das de Karina. Ela era sensual, mas séria e cerebral - o ideal de mulher da moderna intelectualidade burguesa de onde saíram os espectadores da Nouvelle Vague, e a companhia natural de artistas, escritores e editores, com em "Jules et Jim", "Les Amants" e no filme de Antonioni "La Notte" (1960). Ao contrário das personagens suas contemporâneas de Hollywood, as mulheres de Jeanne Moreau eram diferentes pela sua forte base cultural.
Essa diferença espelha-se ainda hoje, querem ver: em "Nikita" (1990), filme de Luc Besson, Moreau interpreta o papel de professora de uma jovem delinquente (Anne Parillaud) dando-lhe lições de feminilidade, ou seja sedução. Por contraste, Anne Bancroft no "remake" de Hollywood "The Assassin" ensina a Bridget Fonda regras de etiqueta e a trabalhar com computador. Fiel à sua imagem de "Les Amants" e "Jules e Jim", Moreau instrói a jovem Nikita que só há duas coisas boas na vida: "feminilidade e as maneiras de abusarmos dela".

Paulo Teixeira de Sousa
Escola Secundária Especializada de Ensino Artístico Soares dos Reis / Porto


  
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Edição:

N.º 75
Ano 7, Dezembro 1998

Autoria:

Paulo Teixeira de Sousa
Escola Secundária Especializada de Ensino Artístico de Soares dos Reis, Porto
Paulo Teixeira de Sousa
Escola Secundária Especializada de Ensino Artístico de Soares dos Reis, Porto

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