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Perspectivas teóricas nos estudos sobre memória e formação

Aproveitar alguns estudos de autores que pesquisam e refletem a respeito da memória possibilita leituras significativas sobre essa temática na área da formação de professores, especialmente daqueles que se perguntam: O que é memória (Smolka, 2000); O esquecimento faz parte da memória (Ricoeur, 1995); O que é dizível? (Queiroz, 1988); A memória é privilégio de velhos (Bosi, E, 2004); A memória constitui a memória-formação de professores (Josso, Nóvoa, 1995; Vieira, 1999). É preciso lembrar também que dialogam com os clássicos (Bergson, 1990; Lejeune, 1975, 1991); os modernos e alguns contemporâneos (Nóvoa, 2000; Josso, 2004; Pack, 2000) e os participantes no Congresso Internacional sobre Pesquisa (auto)Biográfica (CIPA I-II, 2004, 2006), e que contribuem para novas compreensões da questão.
Existe certo consenso com relação a idéia de que o campo da formação de formadores não pode limitar-se apenas às dimensões técnicas e tecnológicas (Nóvoa, A, In: Josso, 2004; Vieira, 1999). A proposta de educação e formação ao longo da vida e as histórias de vida são importantes para entender as questões epistemológicas e pedagógicas que foram-se construindo a partir da emergência de uma nova agenda educacional, que entende que o professor, e já não só o aluno, aprende em outros locais além da escola (Faure, 1972; Delors, 1999).
No âmbito europeu, começa-se a dar ouvidos às historias de vida dos formadores (Nóvoa in Josso, 2004), na Universidade de Genebra. A equipe de Dominicé (1990) aproveitou as contribuições de John Dewey e Donald Schön para articular questões da experiência, da reflexão e da formação. O próprio Nóvoa publicou com Mathias Finger a coletânea de textos O método (auto) biográfico e a formação, que reunia autores do continente americano e europeu. Segundo Nóvoa, a formação permanente estava impregnada de cultura humanista e de utopia, o que incomodava à formulação epistemológica que estava emergindo. A ideologia, a vontade política e o vigor induziam a estudos ao longo da vida, abrindo um mercado de formação. A lifelong learning foi o paradigma que se desenvolveu desde meados dos anos 90 quando a legislação do trabalho e a flexibilização se impunham, e novas leis de educação começaram a ser aprovadas com eixo nas competências e no trabalho, pois havia preocupação com a empregabilidade.
Voltar o olhar não só para a própria práxis na sala de aula, mas também para o sujeito em relação fez a diferença nas perspectivas autobiográficas, já que conjugava, na reflexão, o ato de formar e formar-se num processo dialético que devolve, num primeiro momento, a imagem de si, com certo desconforto e angústia: Professor por vocação? Por falta de opção? Por comodidade? A insustentável leveza da memória e da formação mobiliza, causa angustia, novas buscas e aprendizagens.
As nove musas cantam e versejam; o espírito pensa as imagens e agentes personis e outras imagens; a retórica persuade; a forca espiritual promove; o trabalho psíquico motiva; o testemunho, o relato, o trabalho e a narrativa são memórias. A linguagem socializadora da memória tanto presentifica (Alethéa) como encobre (Lethé).
As pesquisas levantam questões epistemológicas para compreender a experiência contada, compartilhada e significada pelo professor. Algumas categorias analíticas contribuem nas novas compreensões: a memória parte do presente, de uma situação vivida, pois a lembrança como experiência se acumula no inconsciente, o que exige trabalhar com os conceitos de memória pura e memória hábito (Bérgson, 1990); a voz do passado está impregnada de presente e é um estatuto da memória. A história oral "pode devolver, às pessoas que fizeram e vivenciaram a história, um lugar fundamental, mediante suas próprias palavras"(Thompson, 2002, p. 22); o caráter social da memória e o processo de lembrar e esquecer socialmente construído questiona a memória como produto de mentes. A lembrança e o esquecimento da comunidade é uma ação social que, no processo coletivo, se criam, transformam e organizam (Middleton & Edwards, 1992); há quadros sociais que compõem a memória e as lembranças, por sua vez, alimentam-se das memórias dos grupos sociais, o que facilita retornar à comunidade afetiva, pois confere sentimento de pertença a um grupo de passado comum. O grupo que compartilha memórias vai tecendo a sua história com elementos à mão e por eles experiênciados (Halbwachs, 1990). A experiência, impregnada de emoções, comporta a dimensão estética por ter continuidade e significado (Dewey, J., 1974). Esse processo pode conferir ao docente sentimento de identidade, na memória compartilhada em certo contexto histórico real e simbólico.

Margarita Victoria Gómez


  
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Edição:

N.º 177
Ano 17, Abril 2008

Autoria:

Margarita Victoria Gómez
Universidade Vale Rio Verde Minas Gerais
Margarita Victoria Gómez
Universidade Vale Rio Verde Minas Gerais

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